O PGR criticou o comportamento do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, considerando-o como um "mero lobby de interesses pessoais que pretende actuar como um pequeno partido político". E concluiu que "é imperioso que se diga que modelo se deseja para o País: se um sistema em que o sindicato quer substituir as instituições ou um Ministério Público responsável". Esta crítica ao sindicato é injusta e agrava a crise profunda em que vegeta o Ministério Público.
É injusta a crítica do PGR ao Sindicato dos Magistrados do Ministério Público. O Sindicato tem-se distinguido pela promoção da dignidade profissional e mesmo pela defesa da liberdade de decisão dos magistrados do Ministério Público. E tem-no feito com a devida contenção linguística e respeito institucional. O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público constitui, por isso, um garante da qualidade do funcionamento do Ministério Público e dessa forma do próprio Estado de direito.
Bem vistas as coisas, as declarações desta semana reflectem o estado do Ministério Público. O Ministério Público vive a mais profunda crise da democracia. O PGR tem amplos poderes hierárquicos e processuais que lhe permitiriam cumprir a sua função constitucional. Aliás, esses poderes foram até recentemente reforçados na última reforma do Ministério Público. É, pois, surpreendente o desafio feito pelo PGR ao poder político a decidir se prefere um MP autónomo, mas com uma hierarquia a funcionar, ou "o actual simulacro de hierarquia em que o PGR tem os poderes da Rainha de Inglaterra".
Na actual configuração constitucional e legal do PGR, é errado comparar o PGR a uma figura como a Rainha de Inglaterra. Os poderes do PGR não são simbólicos. Longe disso. Sucede é que muitos desses poderes não são exercidos ou são exercidos de forma insuficiente. Exemplo cabal disso mesmo é o poder do PGR de concretização da política criminal. Portugal continua sem uma política criminal, que imponha coerência interna na actuação do MP e desse modo respeite o princípio da igualdade de uma justiça igual para ricos e para pobres, para os notáveis e para o cidadão comum. A Lei n.º 51/2007 prevê o dever funcional de o MP "privilegiar" a aplicação de certas "medidas" no inquérito e de "promover" na audiência de julgamento determinadas sanções não privativas da liberdade. Ora, falta ainda hoje uma concretização objectiva e detalhada da política criminal no tocante ao arquivamento em caso de dispensa de pena, à suspensão provisória do processo, à mediação penal, ao processo sumaríssimo e ao processo abreviado. Como falta uma política racional de promoção de sanções não privativas da liberdade, sendo manifestamente insuficiente a Directiva n.º 1/2008.
É certo que o estatuto do Ministério Público e até a Constituição poderiam sofrer benfeitorias várias no que respeita à estrutura e funcionamento do Ministério Público e, designadamente, à sua relação com os órgãos de polícia criminal e à execução da política criminal. Mas o estatuto vigente não pode ser invocado para justificar as intervenções legalmente questionáveis do Ministério Público em certos casos e muito menos a grave crise institucional instalada no seio do Ministério Público. Como o mostra à saciedade a performance de anteriores procuradores-gerais.
PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE
É injusta a crítica do PGR ao Sindicato dos Magistrados do Ministério Público. O Sindicato tem-se distinguido pela promoção da dignidade profissional e mesmo pela defesa da liberdade de decisão dos magistrados do Ministério Público. E tem-no feito com a devida contenção linguística e respeito institucional. O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público constitui, por isso, um garante da qualidade do funcionamento do Ministério Público e dessa forma do próprio Estado de direito.
Bem vistas as coisas, as declarações desta semana reflectem o estado do Ministério Público. O Ministério Público vive a mais profunda crise da democracia. O PGR tem amplos poderes hierárquicos e processuais que lhe permitiriam cumprir a sua função constitucional. Aliás, esses poderes foram até recentemente reforçados na última reforma do Ministério Público. É, pois, surpreendente o desafio feito pelo PGR ao poder político a decidir se prefere um MP autónomo, mas com uma hierarquia a funcionar, ou "o actual simulacro de hierarquia em que o PGR tem os poderes da Rainha de Inglaterra".
Na actual configuração constitucional e legal do PGR, é errado comparar o PGR a uma figura como a Rainha de Inglaterra. Os poderes do PGR não são simbólicos. Longe disso. Sucede é que muitos desses poderes não são exercidos ou são exercidos de forma insuficiente. Exemplo cabal disso mesmo é o poder do PGR de concretização da política criminal. Portugal continua sem uma política criminal, que imponha coerência interna na actuação do MP e desse modo respeite o princípio da igualdade de uma justiça igual para ricos e para pobres, para os notáveis e para o cidadão comum. A Lei n.º 51/2007 prevê o dever funcional de o MP "privilegiar" a aplicação de certas "medidas" no inquérito e de "promover" na audiência de julgamento determinadas sanções não privativas da liberdade. Ora, falta ainda hoje uma concretização objectiva e detalhada da política criminal no tocante ao arquivamento em caso de dispensa de pena, à suspensão provisória do processo, à mediação penal, ao processo sumaríssimo e ao processo abreviado. Como falta uma política racional de promoção de sanções não privativas da liberdade, sendo manifestamente insuficiente a Directiva n.º 1/2008.
É certo que o estatuto do Ministério Público e até a Constituição poderiam sofrer benfeitorias várias no que respeita à estrutura e funcionamento do Ministério Público e, designadamente, à sua relação com os órgãos de polícia criminal e à execução da política criminal. Mas o estatuto vigente não pode ser invocado para justificar as intervenções legalmente questionáveis do Ministério Público em certos casos e muito menos a grave crise institucional instalada no seio do Ministério Público. Como o mostra à saciedade a performance de anteriores procuradores-gerais.
PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE
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