segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

O 'DIÁLOGO' IMPOSSÍVEL

1. A Plataforma Sindical dos professores exagera quando não aprecia devidamente o recuo e a humildade com que a ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, soube emendar a falta de tacto político que a certa altura lhe guiou os passos na introdução da avaliação aos professores. Uma coisa é simplificar processos, reconhecer a existência de problemas na relação avaliador-avaliado, mostrar abertura para dialogar; outra coisa, diferente, seria abdicar completamente de um projecto importante para a melhoria do ensino em Portugal e consequente requalificação do ambiente escolar.

Por muitos erros que tenha cometido - e cometeu alguns - a ministra tem razão no essencial, e a verdade é que começa a ser evidente para a opinião pública que há uma parte significativa dos professores que não quer qualquer avaliação. Essa parte da classe protesta o contrário mas, no fundo, claramente pretende o regresso ao passado de uma escola onde os professores bons e maus conviviam como se fossem frutos da mesma árvore.

Não são.

E, pelo meio, os sindicatos, com a Fenprof à cabeça, mais do que a paz nas escolas, para descanso dos pais e devida classificação dos alunos, apostam num braço-de-ferro político com o Governo.

Há um limite para tudo. Nesta questão, depois dos desenvolvimentos das últimas semanas, nomeadamente após a confissão de humildade da ministra, chegou o momento de dizer que o Governo não pode nem deve recuar mais. Os sindicatos e as corporações já governaram Portugal durante décadas. O resultado está à vista - e obviamente não apenas nas escolas. Desse "diálogo" já houve que chegue.

2. Um governo democrático, legítimo, ainda para mais com maioria absoluta, deve lutar pelas suas convicções, ver para além das dificuldades do presente.

É certo que, num primeiro momento, o ministério avaliou mal a carga de trabalho que estava a colocar sobre os docentes nesta fase. Um processo destes deve ser implementado por fases e sobretudo analisando bem a qualidade média da população a que se destina. Essa avaliação falhou.

Agora, em sentido inverso, falha a percepção que os professores têm do seu lugar na sociedade.

Uma escola não se faz para os professores, como um tribunal não existe para os juízes e advogados ou um jornal para os jornalistas. Uma escola funciona para servir uma comunidade e, sobretudo, para formar gente melhor e mais qualificada. É neste âmbito que os professores devem ver a sua acção e perceber a missão do Estado.

A proposta da auto-avaliação, assente na assiduidade, feita agora pelos sindicatos para "fechar" este ano, é obviamente inaceitável. Quem está de fora e de boa-fé entende que a solução a encontrar não pode ferir a face de qualquer das duas partes. A dos professores, fruto da sua indignação e protesto, acabou por ser garantida. Mas esta obstinação dos sindicatos fere a legitimidade do Governo e a convicção da ministra. Mário Nogueira trai-se quando diz que Sócrates "se quer guerra, vai tê- -la". Para o professor sindicalista da CGTP o objectivo é fazer capitular o Governo. No dia em que os professores, de uma maneira geral, assumirem este objectivo perderão a simpatia que a determinada altura ganharam com a seu indignação. Vamos a ver se o compreendem a tempo.

O PSD ainda não sabe o que fazer na questão do Estatuto dos Açores (vota com Sócrates ou por Cavaco?...) mas já sabe como reparar a mais recente e notória "balda" dos seus deputados: vai apresentar um projecto de lei a propor a suspensão da avaliação aos professores ("defendendo naturalmente sempre a avaliação", no dizer de Paulo Rangel)! Uma vergonha tapa-se com a demagogia mais básica. E assim vai a política à portuguesa.


'João Marcelino'

O HOMEM QUE DECRETOU O FIM DA CÓLERA

Robert Mugabe disse esta semana: "Estou feliz por ter acabado com a cólera." Ao mesmo tempo, a ONU fez outro balanço: a cólera continua, já fez quase 800 mortos e 16 mil pessoas estão na lista de espera. As duas declarações são produto de duas concepções filosóficas diferentes. Há os homens de pouca fé, demasiado agarrados à ditadura dos factos - infelizmente a mais alta instância internacional está cheia desses cínicos. E, depois, há os visionários que acreditam que o fim da cólera é quando o homem quiser. Mugabe é um desses.

A direcção de um país dá a certos políticos o exercício de um poder que os aparenta a deuses: o decreto. Nos anos 60, Salazar aboliu a prostituição. Os homens de pouca fé de então também sorriram, a pretexto da suposta ineficácia da medida. Mas, na verdade, Salazar acabou com a prostituição: tendo decretado que as prostitutas acabaram, elas acabaram. Talvez tenha continuado a haver mulheres nas esquinas do Martim Moniz, que subiam aos quartos das pensões manhosas com homens desconhecidos, talvez tivessem relações sexuais a troco de uma nota de 50 escudos, talvez, mas o facto era inquestionável: as prostitutas tinham deixado de existir. Como prova, havia o tal decreto.

Mais próximo de Mugabe, outro homem de vontade incomensurável: o Imperador Jean- -Bedel Bokassa, da República Centro Africana, também adepto do decreto como arma de construção massiva de ilusões. Um dia, em 1976, ele decretou: "Está abolida a burguesia." E a verdade é que da burguesia centro-africana nunca mais ninguém ouviu falar. Essa é que é essa. O mesmo acontecerá provavelmente com a cólera zimbabwiana. Um decreto é uma medida de fundo. Deixem o Mugabe continuar a decretar e poderemos estar certos de que acabará com a cólera zimbabwiana. E também com os zimbabwianos, aliás.

Como estão lembrados, na Cimeira Euro-Africana de Lisboa, há um ano, a maioria dos países africanos opuseram-se a sanções a Mugabe. Ele fazia mal aos seus, é certo, mas aquilo era um problema interno. A questão actual é que o jeito tão dele de tratar os seus conterrâneos exporta o problema. As regiões fronteiras na África do Sul e em Moçambique foram declaradas zonas de calamidade.

E a cólera na África do Sul e em Moçambique é um problema muito mais grave do que no Zimbabwe: os decretos de Mugabe não têm efeito além-fronteiras. Ele bem pode decretar: "A partir desta data fica abolida a cólera na região de Manica", mas isso não surte efeito naquela região moçambicana. A poção mágica dos visionários geralmente só vai onde chega o bastão dos seus polícias.

A solução não está em combater Mugabe mas em adoptar-lhe a táctica: o que os dirigentes africanos deviam fazer era decretar. O fim de Mugabe, claro.


'Ferreira Fernandes'

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

O Nobel da literatura que os soviéticos tentaram evitar

Há 50 anos, em plena Guerra-fria, a Academia Sueca atribuía o Nobel da Literatura a Boris Pasternak por causa de um livro, uma história de amor entre um médico poeta e uma filha da aristocracia com a Revolução de Outubro como triste pano de fundo. Dr. Jivago tornou-se um dos romances mais populares do séc. XX mas a União Soviética deixou o autor morrer sem colher os louros.

Era uma vez outro tempo. Há meio século, numa era em que o mundo se dividia em dois e a literatura tinha tanta importância que os governos se sentiam ameaçados pelos escritores. Num gesto que, sem deixar de ser político, tinha a sua justificação literária, a Academia Sueca entregava o Nobel da Literatura a Boris Leonodovich Pasternak, poeta popularíssimo entre os russos que, em 1957, tinha conseguido contrabandear para o Ocidente um fresco desencantado sobre a União Soviética, com a Revolução de Outubro como pano de fundo.

O livro vinha impregnado da aura romântica das obras que conseguem ver a luz do dia apesar de todas as vicissitudes. Escrito na Rússia ao longo de quase quatro décadas é, ao mesmo tempo, um manifesto de amor à arte como fim em si mesmo, uma história de amor grandiosa, um épico histórico sobre a União Soviética que se ergue sobre os escombros dourados da Rússia dos czares e uma obra súmula das preocupações do seu autor.

Pasternak, a quem a política e os grandes movimentos sociais interessavam menos do que a arte em si, o mundo não se moldava pelo homem e as suas acções; influenciado essencialmente por correntes de amor, fé e destino, o mundo tinha pouco de construção e mais de consequência das vidas de cada indivíduo. Como o amor entre o Dr. Jivago e Lara, belo e trágico, quase sempre adiado, ao sabor dos destinos que se entrechocam e cujo idealismo sucumbe diante dos horrores que vão cometendo os exércitos Vermelho e Branco.

A existência do Dr. Jivago tem muito a ver com o destino escolhido pelo escritor. Nascido numa família de artistas judeus da cosmopolita Moscovo do final do século XX, filho do pintor Leonid Pasternak e da pianista Raitza Kaufman, Boris Pasternak pertencia a uma estirpe desprezada pela Revolução de Outubro.

Tendo crescido entre alguns dos maiores vultos da cultura da viragem do século - como Rainer Maria Rilke, visita lá de casa, de quem depois se tornaria grande admirador e tradutor - e apesar da maior parte dos seus familiares ter optado pelo exílio depois do triunfo Vermelho em 1917, o escritor preferiu ficar.

Por ter tomado essa decisão, por essa curiosidade intelectual em relação à experiência bolchevique primeiro e depois por temer que nunca mais o deixassem regressar, viu os seus pais pela última vez em 1922, quando recebeu autorização para os visitar em Berlim.|

Contrabandeado desde Moscovo por um jovem italiano desencantado com a sua experiência soviética, Sergio D'Angelo; editado em Itália pela primeira vez numa pequena editora de um playboy comunista a que os acontecimentos na Hungria tinham abalado a fé na União Soviética, Giangiacomo Feltrinell; o Dr. Jivago só viu a luz do dia e teve este impacto e de forma tão rápida pela capacidade do editor em resistir às pressões e visão de marketing.

Ao saber da notícia do Nobel, Pasternak enviou um telegrama para Estocolmo: "Extremamente agradecido, comovido, orgulhoso, surpreendido, atónito". Quatro dias depois, pressionado pelas autoridades soviéticas, recusaria o prémio: "Considerando o significado atribuído a este prémio na sociedade a que pertenço, tenho de o recusar. Por favor, não se ofendam com a minha rejeição voluntária".


'António Rodrigues'

O que se segue no processo da avaliação

A ministra da Educação cometeu vários erros na imposição de um sistema de avaliação aos professores. Entre eles, a má comunicação do processo, associada às críticas constantes e destrutivas para a classe e ainda a complicação e burocratização do modelo que, tendo em conta o que entretanto Maria de Lurdes Rodrigues já admitiu e modificou, não tinha sido testado. Se somarmos a tudo isto o facto de as divergências já virem de trás, face às alterações impostas pela reforma da educação (aulas de substituição, inglês obrigatório no primeiro ciclo, escolas abertas até mais tarde, etc.), percebe-se que houve alguma falta de bom senso a lidar com o problema e que o Governo parece não ter aprendido a lição com as polémicas que levaram à saída de Correia de Campos da pasta da Saúde e que a actual ministra entretanto soube calar.

Mas todos estes factos não retiram a razão à ministra e à sua política (prioritária para o País) e muito menos validam a actuação dos professores e dos sindicatos que os representam nas recentes formas de contestação. Ainda que tarde de mais, o Ministério da Educação cedeu às principais críticas: simplificou o modelo, adiou os efeitos da sua aplicação, alterou muitas das suas permissas e sentou-se à mesa para negociar. Ontem mesmo, em dia de uma greve que prejudicou pais e alunos, abriu mais uma porta, com o anúncio de que admitia prorrogar o prazo do processo de transição, aplicando-o só no próximo ano lectivo.

Mas sindicatos e professores insistiram numa posição de irredutibilidade inadmissível. Rogando-se o direito de impor condições ao Governo para negociar e resumindo tudo a uma única exigência: a suspensão da avaliação, afinal aquilo que os professores rejeitam em absoluto e não o seu modelo. Perante tamanha intransigência, ao Governo resta aplicar as consequências, responsabilizando os professores pelos seus actos, o que impedirá milhares de progredir na carreira. Porque com radicais, mesmo muitos, é impossível negociar.


'Editorial do DN de 04-12-2008'

O fantasma cavaquista

De cada vez que se abate um escândalo sobre algumas empresas parece que assistimos àqueles programas televisivos em que se procuram antigas vedetas desaparecidas. Levantamos as pedras de um banco nacional e saem de lá, como lacraus atarantados, dezenas de ex-ministros e ex-secretários de Estado. O PSD trata mais a banca e o PS prefere a construção civil. Mas a regra não é linear.
O pedregulho mais interessante está a ser o do BPN. Foi ali que repousou a nata do cavaquismo na sua travessia por desertos marroquinos e escapadelas a Porto Rico, passando por "off-shores" com nomes pomposos.

O cavaquismo foi o tempo de todas as oportunidades. O dinheiro entrava no país e evaporava-se em obras públicas, é verdade, mas também em cursos de formação-fantasma, em universidades privadas manhosas e numa casta de novíssimos ricos. Foi assim que o cavaquismo morreu. Submerso em escândalos pequenos e grandes, de que o jornal de Paulo Portas dava conta, com pontualidade semanal. Depois da experiência o PSD nunca mais foi o mesmo. O país, esse, perdeu a sua última oportunidade histórica. Aquele dinheiro nunca mais volta e estamos hoje na cauda da cauda da Europa. Acabou a festa e vivemos a ressaca.

O tempo passou e não há nada que o tempo não cure. A "entourage" de Cavaco mandou limpar os fatos um pouco enlameados. Transformaram-se em respeitáveis empresários e excelentíssimos senadores da nação. Mas se é verdade que tempo cura tudo, não é menos verdade que com ele tudo volta. E os cavaquistas voltaram para ensombrar a beatificação do seu austero patrono.

Ao ouvir os relatos do que se passava no BPN, contados na primeira pessoa por Dias Loureiro, tivemos o privilégio de olhar pelo buraco da fechadura. Loureiro era administrador na Sociedade Lusa de Negócios (adoro este nome) e diz que sabia do que se passava no seu grupo pelos "bruaás" que lia nos jornais e ouvia nos salões. Ouvia os "bruaás" mas continuava a assinar as contas, porque estava rodeado de pessoas em quem "confiava cegamente". Fazia queixas ao Banco de Portugal em conversas informais - diz ele, que o vice da entidade reguladora diz exactamente o contrário - e continuava, na sua infinita ingenuidade, a assinar tudo por baixo. Fazia negócios e não sabia onde estava o dinheiro dos negócios. Despachava sozinho com Oliveira Costa, porque por lá não havia reuniões. E, mesmo não achando nada disto normal, deixava andar.

Cada um acreditará ou não nas interessantes histórias de Dias Loureiro. Mas uma coisa é certa: o seu nome está no meio deste furacão. O seu e o de muitas figuras centrais da constelação cavaquista. O Presidente sabe disso e, muito legitimamente, enviou insistentes sinais de fumo a Loureiro. Ao nada discreto incómodo do Presidente, Loureiro respondeu com uma visita sem convite a Belém, colando ainda mais Cavaco Silva ao seu infortúnio. Nada a fazer: o Presidente, que se preparava para um fim de carreira sem sobressaltos, enfrenta agora os fantasmas do passado. Para desespero de Cavaco e do PSD, o cavaquismo voltou para o ensombrar. É a criatura a tentar regressar ao regaço do criador.


'Daniel Oliveira'

A direita de Novembro

A cena repete-se todos os anos: no dia 25 de Novembro, a direita portuguesa celebra a derrota do comunismo. O 25 de Novembro (25/11) é a oportunidade para os direitistas elaborarem uma inconsequente birra ideológica. Se deixasse de lado esta teatralidade, a direita talvez percebesse que o 25/11 é a causa principal da ilegitimidade das ideias liberais e conservadoras em Portugal. A inferioridade moral imposta à direita portuguesa não advém do 25 de Abril, mas sim do 25/11.

Nos anos do PREC, uma estranha forma de pluralismo circulava de boca em boca: o 'pluralismo socialista'. Aqueles que lutavam contra o 'socialismo autoritário' do PCP defendiam, em alternativa, um 'pluralismo socialista'. Na prática, isto significava o quê? Bom, significava que Portugal deveria ter vários partidos políticos, mas todos esses partidos tinham de ser socialistas. Mas que pluralismo poderia existir quando toda a gente era obrigada a ser socialista? Ora, o 25/11 consagrou este estranho pluralismo. Isto porque o PCP conseguiu impor um acordo que marcou a vida do regime até aos nossos dias. Os comunistas desistiram da ditadura comunista de partido único e aceitaram a democracia pluralista, mas, em troca, exigiram que todos os partidos tinham de respeitar a via socialista.

Foi este acordo que transformou este regime na coisa monocórdica que conhecemos. Foi este pacto entre o 'socialismo autoritário' e o 'socialismo pluralista' que deu o carácter apolítico e antipluralista à nossa democracia. Em 2008, ainda não existe um real pluralismo ideológico. Trinta e três anos depois, o nosso leque de escolhas continua a resumir-se ao 'socialismo pluralista' (PS, CDS e PSD) e ao socialismo demagógico (PCP e BE), a versão suave do velho 'socialismo autoritário'. O 25/11 matou a política em Portugal. Ficou tudo decidido ali. Vários partidos, mas uma só ideologia: o estado socialista.

Desde cedo, o estado socialista começou a seduzir a direita para o harém do regime: o Orçamento Geral do Estado. Lugares almofadados na administração pública para tecnocratas, pareceres faustosos para escritórios de advogados e negócios faraónicos para empresários, eis o que o harém tem oferecido à direita desde 1975. E a direita vive numa condição de inferioridade moral e ideológica porque aceitou ser comprada. Várias colecções de advogados e empresários gostam de dizer que são de direita em tertúlias pós-laborais, mas, entre as 9 e as 5, adoram espreguiçar-se à sombra do estado socialista imposto pelo 25/11. A promiscuidade entre negócios e política - a marca do regime - tem a sua raiz profunda em Novembro de 1975.


Henrique Raposo

Obama e o contraste entre culturas políticas

A sucessiva nomeação de moderados, inclusive republicanos, para a equipa do Presidente-eleito, Barack Obama, confirma o que aqui tenho escrito sobre o tema - na verdade ultrapassa as minhas melhores expectativas. E assinala o início do desapontamento de certa esquerda europeia com Obama.

Estas nomeações não decorrem de meras considerações de circunstância. De certa forma, exprimem as profundas diferenças entre a cultura política anglo-americana e a continental. Reafirmo que estas diferenças são mais importantes do que as diferenças entre esquerda e direita, ou entre socialismo, liberalismo e conservadorismo.

Três conceitos políticos-chave, e as respectivas diferenças de percepção nas duas culturas políticas, ilustram bem o que está em causa.

Em primeiro lugar, o conceito de revolução. Na cultura política de língua inglesa, o conceito de 'revolução' não goza de grande prestígio. Prefere-se o conceito de mudanças graduais e descentralizadas, muitas vezes em direcções totalmente opostas, e não centralmente comandadas.

Edmund Burke terá dado o maior contributo para desacreditar a mitologia das revoluções. Tendo sido o líder parlamentar liberal do seu tempo, ele atacou severamente a Revolução Francesa de 1789. No continente, Burke é descrito como um reaccionário. Na tradição anglo-americana, é venerado pela direita e pela esquerda. Woodrow Wilson e John Maynard Keynes, nenhum deles de direita, falavam de Burke como o seu mestre.

A preferência pelas mudanças descentralizadas liga-se, em segundo lugar, ao conceito de ordem social descentralizada. No continente, a ideia de ordem social está em regra associada a uma organização minuciosamente comandada por uma entidade central. Na tradição anglo-americana, a ordem social é percebida como emergindo da interacção pluralista de pessoas, famílias e instituições - que tomam decisões e assumem responsabilidades por elas, sob a comum protecção da lei.

A recusa da revolução e a preferência por uma ordem livre sob a lei geram, na tradição anglo-americana, um terceiro fenómeno, altamente intrigante aos olhos continentais: o apego quase religioso a regras gerais de conduta, e a hostilidade a comandos particulares. Esta obediência espontânea a regras gerais de conduta, associada a uma rebeldia contra directrizes específicas e a uma surpreendente variedade de opiniões, hábitos e costumes, sempre captou a atenção dos melhores observadores continentais.

Acredito que reside em boa parte neste terceiro fenómeno a chave da estabilidade política - e da prosperidade - dos países de língua inglesa. A ela voltaremos na próxima semana.


João Carlos Espada

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

O AMOR, A MORTE E O SEXO

“Entre trampa de vaca e palácios mirabolantes, a Índia é uma intensa viagem pelos ciclos da vida. Ora poéticos, ora crus. Um país onde, pelas fantasias, passeiam moscas...”

Vou a Jaipur por causa de um dos meus livros favoritos. Esse livro, chamado ‘Prova do Observatório’ foi escrito pelo argentino Julio Cortazar e estabelece um curioso paralelismo entre o observatório astronômico construído pelo marajá Jai Singh, em Jaipur, em 1728, e a viagem empreendida pelas enguias para desovarem, assim dando início a um novo ciclo. Trata-se de uma das mais belas alegorias que conheço para a vida, mas no meio das famílias indianas não consigo transportar-me para dentro do livro. Limito-me, por isso, a apreciar estranhas construções que me lembram pinturas de Mauritius Escher.
Depois dos sumptuosos palácios de Udaipur e de Jodhpur. Jaipur é desinteressante. Nada que se compare a Agra, no vizinho estado do Uttar Pradesh, onde chego num final de tarde que nunca mais esquecerei. Nunca mais. O exacto momento em que, ultrapassado o caos citadino, subo as escadas do hotel e os meus olhos poisam no Taj Mahal. Apaixono-me pelo templo do amor, fantasma na bruma do anoitecer. É indescritível a harmonia das formas, ângulos e arestas, o branco puro do mármore, o trabalho de ‘pietra dura’. Recortado contra o céu parece diáfano, inatingível.
“A materialização de todas as coisas puras”, escreveu o inglês Rudyard Kipling. Descrição com a qual concordo incondicionalmente ao visitar o mausoléu, deslumbrada com a sensação irreal de me passear pela história de amor entre Shah Jahan, imperador do povo Mughal no século XVII, e a sua segunda mulher, Muntaz Mahal. Desesperado com a morte de Mumtaz, ao dar à luz o 14º filho do casal, o imperador mandou construir um templo perfeito que a acolhesse pela eternidade. Vinte mil artifícios trabalharam no mármore translúcido, nos embutidos de flores traçados com pedras semipreciosas, nos minaretes e cúpulas, nos jardins erguendo o mais belo monumento construído pelo Homem que já vi.
É assim, com a sensibilidade à flor da pele, que apanho o comboio para aquela que considero uma importante etapa pessoal desta viagem. Sempre tive medo de tudo o que se relacione com morte. Não gosto de cravos por causa do cheiro que ficava nas ruas de Sarzedas depois dos cortejos fúnebres e nunca vi um morto. Até hoje. Ainda estou com as mochilas às costas, tentando evitar nas ruelas estreitas de varanasi, o lixo e as bostas de vaca, quando sou obrigada a subir um portal para deixar passar quatro homens que, em passo de corrida, transportam uma padiola com um morto. Respiro fundo. A cena é perfeitamente normal na cidade do deus Shiva e do rio da salvação. Aqui bate o coração do universo hindu e no Ganges lavam-se os pecados de toda a vida, purificam-se os mortos para a passagem do mundo físico ao espiritual.
Nada mais auspicioso para um hindu do que morrer e ser cremado no ghat (nome dado às escadarias de acesso ao rio) de Manikarnica, perto do qual me instalo, decidida a enfrentar os meus medos. Espessas colunas de fumo desprendem-se das piras fúnebres e as ruas por detrás do crematório são um amontoado labiríntico de lenha, de lojas e de templos hindus. Todos os dias ardem nas fogueiras do crematório principal da Índia mais de 250 corpos, cuja alma já partiu para outro karma, segundo a crença hindu. Assisto de longe às cerimônias. Impressionantes, mas não tanto. Talvez porque as pessoas estão embrulhadas em panos coloridos e não há choros e gritos, apenas rituais de transição.
No dia seguinte passeio de barco pela ‘mãe Ganga’. São seis da manhã, hora de um espectáculo colorido e único em que milhares de pessoas se acumulam nas escadarias praticado a Puja, cerimônia de homenagem ao nascer do Sol. Que me perdoem os hindus, mas o Ganges tem as águas mais sujas de que tenho memória. Dejectos sagrados de vaca, cinzas de mortos, carcaças de animais, resíduos industriais e, claro, um ou outro cadáver (homens santos, grávidas, pessoas mordidas por cobras, leprosos e crianças não são cremados, sendo atirados ao rio presos a pedras). Ora, é nessas águas, com mais bactérias por metro quadrado de que qualquer esgoto, que os hindus se lavam. Vejo-os a gargarejarem e sinto náuseas. Difíceis de conter, quando o barco se cruza com um cadáver azul em decomposição. Intenso.
Demasiado intenso, penso ainda a recompor-me no comboio vagaroso para Khajuraho. Nesta cidade tranqüila do Madyah Pradesh o que há para ver é o principio de um novo ciclo da vida. templos do século X, famosos pelas suas esculturas representando posições do Kama Sutra. E não só. Não reconheço do livro do amor e do sexo, a prática em que um guerreiro se compraz com o seu próprio cavalo.


‘Patricia Brito’

PRECISO DE UM HOMEM EM CASA

Eu não sou bem um homem. Homem que é homem sabe agarrar num ‘Black & Decker’ e fazer um furinho numa parede. Eu da última vez que mexi num ‘Black & Decker’ ia descobrindo petróleo. Homem que é homem sabe pegar num busca-polos e resolver um problema eléctrico. Eu cá estou para a electricidade como as cegonhas para os cabos de alta tensão. Homem que é homem vê uma torneira a pingar e vai imediatamente munir-se de uma chave inglesa. Eu vou imediatamente munir-me de umas ‘Páginas Amrelas’. Sou uma desgraça, eu sei. Estou sempre a dizer à minha mulher. “Fazia-nos muita falta um homem cá em casa”.

Esta triste incompetência para as tarefas manuais é um rude golpe na minha virilidade. O cúmulo da humilhação foi quando há três anos chamei um técnico para me vir arranjar o esquentador inteligente. Eu abria a torneira da água quente mas o esquentador não disparava. O técnico chegou, olhou e (isto custa a admitir)... mudou-lhe as pilhas. Paguei sessenta euros. Sessenta euros por trocar duas pilhas. Felizmente, arranjei um verdadeiro profissional: em vez de se rir na minha cara esperou até chegar ao carro. Desde esse dia estou firmemente convencido de que o meu esquentador é mais inteligente do que eu.

Ainda por cima, tenho um cunhado que só não construiu sozinho a casa onde vive porque os homens das obras chegaram primeiro. Ele não só consegue pendurar quadros na parede – actividade que me parece mais complexa do que escrever ‘Os Lusiadas’ numa gruta – como se entretém a pintar divisões, calafetar janelas, desentupir canos, montar candeeiros e todos esses desportos domésticos que definem – como dizê-lo de outra forma? – o bom macho lusitano. Para minha suprema vergonha, ele até fabricou, com as suas próprias mãos, todo o mobiliário do quarto dos filhos. Já os meus filhos, quando vêm ter comigo a queixarem-se de uma lâmpada fundida, eu digo-lhes para chamarem a mãe.

A chatice no meio disto é que fico com problemas de consciência – não há forma de eu não me sentir menosprezado por esta incompatibilidade estrutural entre a minha pessoa e as Chávez de fendas. Eu queria muito ter um canalizador dentro de mim e não me sentir obrigado a renovar o meu seguro de vida cada vez que tenho de trocar uma lâmpada. Hoje em dia, sempre que é preciso fazer alguma coisa no quintal, tipo cortar os ramos da figueira ou pôr de pé uma vedação, a minha mulher já nem me diz nada: chama gente (homens, portanto) ou espera pela próxima visita do meu sogro. Imagino o que eles devem pensar de mim. “Olha, olha, o intelectual de óculos de massa, só porque escreve umas coisas no jornal acha que é muito fino para pegar num machado”. Mas eu não acho. Juro que não acho. Eu queria saber manejar o machado com a habilidade dos índios que despacharam o general Custer. Eu sou com o dia em que tenha com um serrote a intimidade que tenho com um livro. Eu quero sentir a mesma alegria a podar uma oliveira que sinto a ver westerns do John Ford. Ó vil destino. Eu tenho 35 anos e não há meio de ser um homem. Nem à martelada.


‘João Miguel Tavares’

FELGUEIRAS VS. BLEARS

O uso dos dinheiros públicos para beneficio próprio de políticos em cargos para os quais foram eleitos só não será um crime na republica das bananas. Por cá, apesar de todas as demoras, Fátima Felgueiras foi condenada a três anos e três meses de prisão, com pena suspensa durante esse período, por causa de uma falha de acerto de contas relacionadas com uma viagem à Irlanda e por uso indevido de um carro da autarquia numa deslocação ao congresso do PS. Em Inglaterra, Hazel Blears, secretária de Estado para as Comunidades e o Governo Local, é acusada de usar o dinheiro dos contribuintes para aprender castelhano. O ataque dos tories ao caso e o destaque dos media ingleses quanto a esta questão levam-me a pensar que:
1) os ingleses, apesar de corruptos, sempre aplicam as libras alheias na sua formação;
2) nós não damos assim tanto valor ao dinheiro. A senhora entretanto defende-se afirmando que tudo não passou de uma explicação de três horas da língua estrangeira para poder participar numa reunião. Não deixar passar nem um “me llamo Hazel” aprendido à custa dos contribuintes é uma forma de valorizar um recurso limitado e de proteger de quem paga.


‘Carla Hilário Quevedo’

MUITO TARDE

Poucas coisas no mundo chegam ao ponto da infâmia e da boçalidade como a violência sobre outros. Sobretudo a violência entre indivíduos. É possível justificar uma guerra ou mesmo uma tentativa de libertação de um país oprimido para as maravilhas da democracia ocidental. Mas absolutamente nada justifica a violência sobre crianças, idosos, homens e mulheres. As tentativas de perceber o outro acabam mal se ouve falar da excisão feminina a UE terão sido sujeitas entre 100 a 140 milhões de mulheres, segundo dados revelados pela ONU. A violência sobre as mulheres tem sido depreciada pelos governos um pouco por todo o mundo. Mas perante as 43 mulheres assassinadas até ao momento este ano em Portugal, na sequência de casos classificados por ignorância como “passionais” e cuja terminologia condeno por incentivar à desculpa do agressor; o Governo português adoptou um conjunto de medidas ainda mais tímidas que visam proteger a vitima. Falta também educação cívica, respeito pelo próximo e alento por parte das mulheres para rejeitar situações intoleráveis sem pensar duas vezes. A paixão e o amor não se misturam com a violência nem com a morte.

‘Carla Hilário Quevedo’

INCOMPREENSÍVEL

Não percebo nada de Economia. Nem da macro nem da micro. Afirmo isto sem orgulho nem segundas intenções. Mas não é para mim um consolo quando me deparo com economistas que, resignados, explicam que a Economia não é nem pouco mais ou menos uma ciência. Como a maioria das pessoas encaro com impotência e alguma (pouca) resignação os vaivens dos preços e dos impostos. Como todos adapto-me e mudo os meus hábitos de acordo com o ritmo incontrolável impingindo pelos universos inatingíveis da crise mundial, do défice orçamental, das fiscalizações ou da falta delas, dos bancos e de outros palavrões que não me atrevo sequer a soletrar. Apesar de tudo, há factos que entendo: em Espanha, a gasolina é mais barata. Mas neste mundo enigmático ainda há coisas que me animam. Neste mini-apocalipse financeiro, a taxa Euribor continua a baixar. O preço da gasolina também. É mais fácil arranjar mesa nos restaurantes. Os vendedores nas lojas são mais simpáticos e deixar uma gorjeta mínima (ou não deixar nenhuma) já não é motivo de desprezo. A crise tem as suas vantagens. Só não me peçam para as explicar.

‘Carla Hilário Quevedo’

SINAIS EXTERIORES DE POBREZA

Ficou famoso o indicador econômico de Antonio Guterres, que uma vez disse no Parlamento que não era possível que a crise fosse assim tão grave, pois as vendas de telemoveis não paravam de subir. Pois até para esse sofisticadíssimo índice se prevê recessão. I isso não tem graça nenhuma.
De todos as previsões recessivas que vão surgindo, em catadupa, a mais impressionante é esta: mãos oito milhões de desempregados nos países da OCDE nos próximos dois anos. Oito milhões. É o equivalente a quase todos os portugueses com mais de 15 anos que, em 42 países, vão deixar de ter emprego. É o saldo liquido (diferença entre postos de trabalho criados e destruídos). É um aumento de 24% em dois anos, para um total de 42 milhões. É o custo dramático da destruição da aparência de prosperidade econômica em que vivíamos. É o fim do mito do homem-heroi do século XX: despedir oito milhões de pessoas não é um ajustamento econômico, é o fracasso da sociedade ocidental.
As previsões da OCDE são medonhas e incluem Portugal no fumo negro, prevendo para nós a mais alta taxa de desemprego desde a adesão à comunidade européia. Mas não é preciso fazer muita futurologia para ver como a crise econômica já chegou em força: as vendas de automóveis e casas caem a pique, os centros comerciais vão perdendo logistas, o malparado está a aumentar, os orçamentos das empresas cortam custos para o próximo ano, o consumo está em perda, os principais países nossos clientes estão com previsões ainda piores que as nossas.
Só depois do Natal, o período forte do consumo do ano, se medirá a extensão da crise que já existe, pois muitas empresas estão à espera deste balão de oxigênio para respirar fundo antes de arrancar o ano. A julgar pelas promoções avançadas que se vêem nas montras, este não será o pior Natal dos últimos anos, mas o melhor Natal dos próximos.
Com esta crise, não é apenas o nosso modo de vida que está ameaçado, é o nosso emprego. E nesta ameaça pode-se começar a conjugar o verbo “perder” seis vezes: eu, tu, ele, nós, vós, eles.


‘Pedro Santos Guerreiro’

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

JACK NICHOLSON

“Um dos mais aclamados e carismáticos actores da história do cinema. Um dos poucos actores consagrados que aceita fazer papeis secundários em filmes”

Nasceu em Manhattan, Nova Iorque. Abandonado pelo pai, cresceu junto dos avós, que acreditava serem os seus pais. Soube, depois da morte destes, que a sua irmã mais velha era, na verdade, a sua mãe.
Começou a sua carreira como actor trabalhando para e com Roger Corman. Estréia-se no cinema em “The Cry Baby Killer”, de 1958. Desde então foi nomeado 12 vezespara os Óscares. Já conta com três no seu currículo: dois Óscares na categoria de melhor actor, por “Voando Sobre um Ninho de Cucos” (1976) e “Melhor é Impossível” (1998) e uma estatueta dourada na categoria de melhor actor secundário pelo seu trabalho na película “Laços de Ternura” (1984).

PLANO PARA ACABAR DE VEZ COM A CULTURA

“Sem marquetingue não há idéia que vingue”

“Lutar com palavras; é luta mais vã;
Entanto lutamos; mal rompe a manhã”

‘Carlos Drummond de Andrade’


Para começar, lança-se a idéia de que é preciso ser-se culto para se ser “alguém”. Ser-se “culto” significa estar-se apto a responder aos inquéritos da “Caras” ou da “Lux”: qual foi a última exposição/peça de teatro que viu? E o último espectaculo? Que livro levaria para a ilha deserta? Qual é o seu restaurante favorito? E viagem? E filme? Mas não é só isto: também é preciso ser-se doutor. Nenhuma pessoa pode ser considerada culta sem uma licenciatura, qualquer que seja. Fernando Pessoa, por exemplo, não era uma pessoa culta: não só não tinha um curso superior, como, do ponto de vista dos “consumos culturais”, era penas um literato, coisa que no inicio do século já parecia uma limitação, e que agora é, de facto, um atestado de menoridade cultural. Porque hoje a cultura é movimento, festa, agitação. E tem de ser “sinestésica”. Uma pessoa culta tem de saber vestir, e estar, e rir, e conversar sobre a moda e a política e o ambiente e a musica e o design. Sobretudo o design, porque sem o design apropriado ninguém é entendido como culto.
Para lançar esta idéia, contacta-se uma agencia de comunicação. E desenha-se uma estratégia de marquetingue, porque sem marquetingue não há idéia que vingue – isso até o literato Pessoa já tinha descoberto. Sim, a cultura exige uma estratégia e um plano. De preferência vindos de fora; a globalização é muito bonita para tema de conversa mas, na hora da verdade, um grupo de consultores estrangeiros, que já tenha vendido festas culturais nos países que dominam o império da cultura (e do dinheiro; as duas dimensões são inseparáveis) impressiona melhor. A alternativa, mais econômica mas muito prestigiante, é encomendar um “estudo” a uma universidade, estrangeira ou, neste caso, de preferência, nacional. Dá um ar de seriedade e independência, com a vantagem, em se tratando de uma universidade portuguesa, de se captarem de imediato para a causa aquilo a que em bom português se chama “opinion makers”.
O plano, a estratégia e o estudo devem ser anunciados, explanados e demonstrados pelo menos uma vez por mês e em “Power point” – ou seja, num écran, com muitas cores e gráficos, porque a cultura contemporânea não existe sem luzes, cores, coisas a mexer. Um bom plano cultural é aquele que pretende sacudir tudo ao mesmo tempo – a palavra-chave é “interdisciplinaridade” (ou será “transdisciplinaridade”?). juntar a dança com as artes plásticas e a fotografia e o cinema e a musica e, enfim, a palavra. Um evento impactante tem de ter uma palavra. Um evento impactante tem de ter uma palavra de ordem, ou várias, mas curtas, e de preferência em inglês – porque essa é uma língua abençoadamente sintética e que facilita a exportação. E a cultura é para exportação.
A juventude é outra das características essenciais da cultura. Porque há necessidade de criar “novos públicos”, de “inovar”. De onde vem essa necessidade? Do nada – isso é que é maravilhoso: seremos capazes de, como diria Seinfeld, criar todo um programa a partir do “nada”, apenas movidos pela urgência de criar animação, vitalidade, acontecimentos, enfim, cultura. Uma cultura jovem mas de “inclusão”, democrática, que contemple aquilo a que se chama “multiplicidade dos olhares”. E que funcione como um eterno recomeço, a festa pela festa, o evento pelo evento. Que saiba misturar o gato e o sapato, o museu e a rua, a sardinha assada e o sushi. Uma cultura assim garante a tranqüilidade do povo e o orgulho pátrio: no futebol como em qualquer outra área (e o futebol também é cultura não esqueçamos), Portugal também sabe fzer grandes festivais.
Outra coisa seria presunção e perigo. Que outra coisa? Por exemplo, criar estruturas escolares sólidas para que as pessoas possam aprender a pensar e a imaginar livremente, de modo a fazerem as suas escolhas ou desenvolverem as suas capacidades. Investir em bibliotecas e arquivos. Apoiar os criadores e os seus projectos, os investigadores, a edição e divulgação de textos e autores essenciais para a formação de um pensamento critico. Manuel Maria Carrilho lembrava a semana passada (Diário de Noticias – 27-11-2008) que “uma política da língua só pode ser uma política dos matérias em que ela se concretiza”. Mas claro que as palavras deste filósofo não interessam nada – sobretudo porque ele já provou, enquanto ministro da Cultura, que não há nada mais prático do que uma boa teoria. Fez demasiado, exigiu demasiado, conseguiu demasiada visibilidade exterior para o cinema e a literatura portugueses – por isso acabou por ser enviado para Paris. O povo quer-se anestesiado – e o dinheiro que se gasta em estudos e festas não se gasta a dar-lhe lenha para atear o lume da imaginação ou do pensamento.


‘Inês Pedrosa’

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

PORTUGAL EM 2100

“Estudo adverte que o Sul da Península Ibérica irá perder turismo com o aquecimento global no planeta”

Muito do litoral português, como a Costa da Caparica ou a Ria Formosa, irá ficar alagado até 2100. Com temperaturas demasiado quentes no Verão, o Algarve irá perder turismo a favor de destinos no Norte, ficando mais exposto a insectos e pragas infestantes que originam as chamadas doenças dos viajantes. Um estudo sobre os efeitos das alterações climáticas nos destinos ibéricos no final do século XXI, da Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril (ESHTE), traça um cenário, no mínimo preocupante. “O estudo serve para alertar que se não se fizer nada para evitar o futuro que está anunciado, há grandes probabilidades deste cenário catastrófico acontecer”, frisa Eunice Gonçalves, presidente do conselho directivo da ESHTE e co-autora do estudo.
As preocupações partem de aumentos de seis graus centigrados até ao final do século, um cenário já referenciado em estudos anteriores. “As temperaturas subirão, e de forma significativa. Os fluxos turísticos do Sul da Península Ibérica irão deslocar-se para o Norte, á procura de temperaturas mais amenas”, adianta Eunice Gonçalves, referindo que o Inverno tende a ser a estação alta do Algarve e Sul de Espanha. “Há um limite para o sol e mar a partir de determinada temperatura, sobretudo com o turismo sênior a ganhar importância”.
Não será a morte do Algarve, “mas o destino tenderá a perder peso no conjunto do país para outros crescerem”. É o caso do Norte, Madeira e Açores. “No Norte da Europa, por exemplo, hoje não há turismo balnear, e com o aumento das temperaturas poderá vir a existir”.
O efeito mais crítico é o da subida média da água do mar. Muitas áreas da costa portuguesa deverão ficar alagadas. Globalmente, o mar subiu 10 a 20 centímetros no século XX, também como conseqüência do degelo dos glaciares. “Em todo o território nacional vai haver um recuo da linha de costa”, avisa a investigadora.

Serra da Estrela emerge para o turismo náutico

Com o aquecimento global, também os destinos de neve da Península Ibérica irão desaparecer enquanto tal, com excepção dos Pirineus. “Esses locais terão de evoluir para outro tipo de produto. Chega a um ponto que é tão caro manter a neve que a própria estância deixa de ser viável”, salienta Eunice Gonçalves. “E já hoje se nota cada vez mais necessidade de recorrer a meios mecânicos, como canhões de neve”. O caso emblemático em Portugal é a serra da Estrela, colocando-se as alternativas ao nível do turismo de natureza e de montanha. “Se a neve derrete, vão criar-se imensos lagos e bolsas de água, que podem ser agradáveis para actividades náuticas”.
Eunice Gonçalves sublinha que há margem de intervenção no sentido de controlar os efeitos anunciados das alterações climáticas. “Este é um exercício que parte da situação actual, projectando-a até o final do século”, explica. A verdade é que o estudo já considera como situação de partida, em 2008, fenômenos como “erosão litoral, cheias, secas, ondas de calor, fogos florestais e desertificação”.

Em 2100

Com o aumento de 6º C até ao fim do século, fluxos turísticos do Sul da Península Ibérica irão deslocar-se para Norte.
O inverno passa a ser a estação alta do Algarve. O Alentejo interior sobe dos actuais 20 a 90 dias de temperaturas máximas de 35º C.
Riscos para a saúde, com o aumento de insectos e espécies infectantes, como as alforrecas.
Norte, Açores e Madeira irão ganhar pelos climas amenos.
Com a neve a derreter, a serra da Estrela irá ganhar bolsas de água, para turismo de natureza.
Recuo da linha de costa em todo o território nacional. Costa da Caparica e Ria Formosa, no Algarve, são algumas áreas que tendem a ficar alagadas.
No enoturismo, a adequação de castas será um imperativo.


‘Conceição Antunes’

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

DE ABRAHAM LINCOLN A BARAK OBAMA

Houve dois magricelas de Illinois que mudaram a história do país. Lincoln e Obama, diz John Hetfield, um afro-americano que não esmorece na esperança numa nova era liderada pelo senador do Illinois. Esta associação encerra parte da história da luta pela igualdade de direitos entre pretos e brancos. Datas marcantes do trajecto:

1863
Abraham Lincoln ordena a libertação de todos os escravos nos estados da confederação.

1865
A guerra civil termina e a 13ª emenda que proíbe a escravatura, é aprovada.

1868
A 14ª emenda torna os afro-americnos cidadãos de pleno direito.

1877
Os Estados do Sul recuperam o poder depois da reconstrução e instituem políticas segregacionistas.

1890
Campanha de terror do Klu Klux Klan.

1965
O “Voting Rights Act” torna-se lei e proíbe qualquer imposto ou teste de literacia que impeçam os pretos de votar.

1966
Edward Brook é eleito o primeiro senador afro-americano.

1992
Carol Brown ganha a corrida para o Senado. É a primeira negra a consegui-lo

2008
Barak Obama torna-se o primeiro negro a ser eleito Presidente dos Estados Unidos.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

A RECENTE DISPUTA ELEITORAL NA GUINÉ-BISSAU REPRESENTA UM NOVO GOLPE NA DEMOCRACIA

A eleição de 16 de Novembro na Guiné-Bissau representa uma nova ameaça para os valores democráticos e põe em causa a situação política que já é uma preocupação. Isto porque não houve mudança na configuração interna da sociedade, nos discursos das lideranças dos partidos políticos para ultrapassar as sucessivas crises.

Os partidos políticos não sabem o que fazer. Todos apresentaram candidatos ou coligações para assumir o governo, mas não conseguiram demonstrar para o eleitorado e a sociedade como um todo como pretendem ultrapassar a crise. Não parece que as lideranças políticas estão interessadas em desenvolver mudanças estruturais no país, mas sim interessados a conquistar apenas o poder a todo custo aproveitando-se de espaços na comunicação social para iludir o povo, criar instabilidades e adiar o processo da institucionalização da esfera pública. As denúncias do narcotráfico de Estado dominaram totalmente o debate político-eleitoral, no entanto, até ao momento, não existe nenhuma queixa-crime na Procuradoria-Geral da Republica ou no Supremo Tribunal de Justiça contra as figuras civis e militares envolvidas no crime organizado. Não faltaram indícios.

A recente disputa eleitoral não parece que vai ultrapassar a crise de governabilidade e a ausência da ética na política e na formação de um novo governo. São interesses pessoais, de grupos políticos e partidários que estão em jogo. Uns buscam controlar o aparelho de Estado; já outros são apenas coadjuvantes que reivindicam espaços no governo. Reclamam o direito de voz e vez para definir as políticas e o poder político. Cada um quer a sua parte. Não existe um projeto de Nação, nem negociação e acordos políticos. Quando afirmados são constantemente desrespeitados e negligenciados. O anterior governo de base alargada, todos se recordam, é um bom exemplo da dificuldade que os líderes de partidos políticos têm de incorporar as regras e os valores básicos do pluralismo democrático, tanto dentro dos seus próprios partidos como na suas relações com as organizações da sociedade civil. Os sucessivos governos, mesmos os interinos, não foram capazes de redefinir suas práticas governativas, pondo em risco a governabilidade e a democracia, bem como a adoção de novas alternativas viáveis e consensuais que pudessem facilitar o desenvolvimento sustentável.

À semelhança do que acontece na sociedade política, nas organizações da sociedade civil, cuja visão política é, hoje, na Guiné-Bissau, de uma classe média situada entre uma maioria da população excluída e uma minoria lançando mão dos privilégios que o sistema partidário proporciona, comprometendo a sua automatização na sua relação com o Estado. Não quer dizer que não houve avanços das organizações da sociedade civil nas denúncias da corrupção e do narcotráfico de Estado. É sempre importante denunciar atos de corrupção, no entanto, é preciso ações mais efetivas e concretas por parte dos líderes das organizações da sociedade civil, inclusive nesse momento político pós-eleitoral, já que o sistema partidário mostrou-se incapaz de representar a opinião pública por utilizar a política como moeda de troca.

Outra questão que se coloca é a relação entre civis e militares. A transição guineense para a democracia, por exemplo, ficou conhecido mundialmente pelos sucessivos golpes de Estado. Ela foi incapaz de evitar que o aparato de poder autoritário prosseguisse. Conseqüentemente, os partidos políticos continuam a incentivar intervenções militares em situações de crises, algo quase impossível numa democracia forte em que os generais têm parca capacidade de solapar instituições políticas da República. Nem os quatro Presidentes da República pós-período militar, João Bernardo Vieira, Kumba Yala, Malam Bacai Sanhá e Henrique Rosa conseguiram alterar significativamente a intervenção do poder militar nas questões de competência civil.

Admitindo-se que a recente disputa eleitoral não parece representar uma alternativa viável e rumo a uma democracia consolidada ou em via de consolidação, resta-nos indagar qual será a perspectiva governativa do novo governo saído destas eleições? Não dá, por enquanto, para fazer qualquer pré-visão sobre as recentes eleições. O que podemos dizer é que estamos perante uma situação difícil de estabelecer acordos políticos entre diferentes forças políticas de forma a garantir a governabilidade. Vejamos:

PAIGC

O Partido para a Independência da Guiné e Cabo Verde, que poderia representar uma alternativa governativa, não parece capaz de estabelecer uma aliança política para o enfrentamento de questões urgentes que pudesse refletir na melhoria das condições de vida da população. O PAIGC deixou de representar a vontade coletiva da sociedade guineense há mais de 30 anos. Deixou de ser um partido orgânico. As disputas de poder e interesses difusos fora de controle dos seus líderes acabaram por desviar a atenção do partido na sua relação com a sociedade.

O partido não soube aproveitar o ambiente político favorável proporcionado pela reeleição de Carlos Gomes no VII Congresso. Ao invés de deixar para trás a sua política de “camaradagem” e os erros cometidos no passado, Carlos Gomes preferiu simpatizar-se com o Presidente Vieira cujo passado guerreiro não parece deixar boas lembranças aos guineenses e amigos da Guiné-Bissau. Vieira reclama cada vez mais voz ativa no PAIGC e no governo, e quando não consegue, tenta desarticular a liderança de Carlos Gomes e da classe política, dissolvendo o Parlamento ou mantendo uma parte dele em função como forma de atingir seus objetivos de permanecer no poder.

PRS

O Partido da Renovação Social, a segunda maior força política do país, também não parece representar alternativa por não ter conseguido renovar o seu discurso. O PRS é um partido com alto grau de tendências internas e inclinações étnicas e regionais sem um projeto político claro. Parece mais interessado em desenvolver uma política de intimidação e ameaças, prática típica do seu líder. Não parece interessado em estabelecer uma política de aliança ou coligação governativa sustentável com o governo que sairá das eleições.

PRID

O Partido Republicano para a Independência e Desenvolvimento, recentemente criado, ao comprar a consciência do eleitorado com recursos oriundos do narcotráfico e crime organizado importa apenas garantir o poder da cúpula no governo e interesses pessoais do presidente João Bernardo Vieira. O presidente investiu financeira e politicamente e incentivou a criação do PRID, o que garantiu ao partido um número significativo de eleitorado e votos, se considerarmos a data da sua fundação. Com base nesse apoio, o presidente Vieira conseguiu inibir, em parte, a oposição interna dentro do PAIGC e do PRS que foi tão clara e perigosa para a manutenção do seu status quo. Se levarmos em conta que a sua relação com o atual presidente do PAIGC se assenta na disputa de espaços e poder, e considerando que a sua hegemonia no partido está minado, o presidente Vieira preferiu agir com pragmatismo, e quem sabe, mais adiante, dependendo do desempenho eleitoral do PRID, neste pleito, o presidente Viera terá uma porta aberta para sua manutenção no poder por mais quatro anos sem necessariamente precisar do apoio do PRS.

O que importa para o presidente Vieira é manter o seu status político herdado na luta de libertação nacional. Agora ele pode contar com apoio e confiança do PRID para manter a “governabilidade” e inibir o perigo do PRS na casa legislativa. Quem mais perdeu, nesta disputa eleitoral é Carlos Gomes Júnior que terá que sentar-se à mesa com o seu grande adversário político, Aristides Gomes, líder do PRID, que sempre reclamou possuir o apoio incondicional de Vieira durante a campanha eleitora.

Ao invés de se posicionar, o presidente Vieira preferiu adotar uma política de não enfrentamento. Mas o presidente Viera terá de decidir publicamente: que interesse político ele representará, ou terá que arcar com o descontentamento do PAIGC, que não gostou do fato de não poder utilizar a sua imagem durante a campanha eleitoral. Na hora certa, Vieira irá posicionar-se para tentar recompor as forças dentro do próprio PAIGC em benefício do PRID e interesse político próprio. Em torno de tudo isso, uma constatação: a recente disputa eleitoral na Guiné-Bissau representa mais um golpe na nossa democracia devido à ausência de um projeto político claro e coeso que possa redefinir o rumo do país e garantir a governabilidade.

Ricardino J. D. Teixeira - Mestre em Sociologia Política pela Universidade Federal de Pernambuco. Professor de sociologia na Faculdade de Ipojuca - Brasil

Visionado em: www.didinho.org

domingo, 26 de outubro de 2008

A NOVA ESPÉCIE

Confidenciava-me há poucas semanas um amigo que os homens de hoje em dia também já têm dores de cabeça. Segundo ele, reina entre os casais uma preocupante ausência de desejo sexual, o qual também se manifesta nos homens.

É sabido que as mulheres são exímias em enumerar razões para não ter sexo: cansaço, sobrecarga doméstica, filhos, falta de auto-estima, medo do espelho, tensão pré-_-menstrual, depilação por fazer, resquícios de uma discussão, sono, falta de dinheiro, entre tantas outras. O dado novo é que os homens também passam pelo mesmo, ou seja, entre ter sexo aborrecido e rotineiro ou não ter, alguns preferem ficar a ver o futebol e a beber cervejas aconchegadas com uma reconfortante pratada de tremoços, o que me faz pôr em causa a clássica máxima muito popular nos anos 80, divulgada em canecas e t-shirts, que proclamava ‘sex is like pizza, when it’s good it’s very good, when it’s bad, it’s still good’.

O sexo mecânico, que eu pensava não ser bom para as mulheres mas ainda assim satisfazer os homens, afinal pode não ser considerado uma opção.

Esta INFORMAÇÃO leva-me para o território do sim e do não que pelos vistos se arruma agora de forma diferente. Aos homens sempre calhou o ónus de aguentar com a recusa das mulheres e estão habituados a encarar o cenário negativo com fair-play e descontracção. Um não é o prato do dia; o sim é muitas vezes um bónus.

Com as mulheres é ao contrário: habituadas ao luxo de dizer sim ou não conforme lhes apetece, quando são confrontadas com uma recusa, tomam-na como uma ofensa pessoal e o mundo pode desabar. Não conseguem perceber que uma recusa pontual não representa automaticamente um acto de rejeição. Como é próprio do modus operandi feminino, tendem a interpretar e reinterpretar todo e qualquer gesto, atribuindo-lhe os mais variados significados baseados mais na fantasia e na insegurança do que em qualquer dado real.



Acredito que aos homens também assiste o direito de dizer não, tal como tantas vezes as mulheres o fazem. Afinal, se andamos cá há tantos anos a lutar pela igualdade, nós, as mulheres, temos a obrigação de assumir com humildade que o outro também tem o direito a dores de cabeça, sejam elas verdadeiras ou ilusórias. A libido tem vida própria, tal como o amor e o desejo, é por isso um acto de uma enorme ingenuidade tentar forçá-la. Num mundo em que os homens se vão parecendo cada vez mais com as mulheres, é apenas natural que também eles tenham os seus dias não, mesmo sem tensão pré-menstrual ou sintomas de menopausa.

Não esqueçamos que esta nova espécie também tem outras qualidades; usa perfume e bons cremes para a pele e vai de boa vontade à faca operar o nariz para nos deixar dormir em paz sem banda sonora. Além disso, o clássico homem feio, porco e mau e a cheirar a cavalo raramente conhece as subtilezas do bom sexo e nem sequer se preocupa se a parceira atinge o nirvana ou está a pensar que precisa de mudar o verniz das unhas.

'Margarida Rebelo Pinto'

sábado, 18 de outubro de 2008

Viva a crise!

A crise é má. Todos a vamos pagar. Mas poderá ser boa. Se descongelar algumas ideias políticas que estavam há muito no frigorífico, se enterrar durante algum tempo as ideias de Milton Friedman que iluminaram a classe política nas últimas três décadas. Friedman, guru da escola de Chicago, considerava que só o dinheiro interessava. A partir daí confundiu-se a economia com os ciclos financeiros típicos da economia de mercado.

Todos os outros aspectos da economia (a agrícola, a humana, a laboral, a ambiental – todas fazem parte do eco-sistema a que se chama "economia") foram esquecidos. A ideologia hegemónica cristalizou-se, como se os fluxos financeiros fossem o coração e a alma do mundo. Não são. Esta crise pode incentivar uma nova ruptura criativa na economia, afastando as ervas daninhas que tiravam o sangue ao mercado. O Carnaval financeiro está a acabar e as máscaras estão a ser vendidas em saldo. Não é preciso citar Adam Smith para se chegar à conclusão que o saneamento do sistema bancário e o controle do défice público são medidas essenciais para garantir a saúde económica do Estado moderno. Por aqui imaginava-se que a crise financeira tirasse alguns políticos do seu estado letárgico. Não é o caso. Em Portugal tudo pode ser motivo de debates "fracturantes", menos o que interessa neste momento: a economia real dos portugueses. É nestes momentos que se vê o défice global da classe política nacional. Discute o acessório, esquece o essencial. A crise há-de bater-lhes à porta.

Fernando Sobral

TRICHET, CASINHAS DA CÂMARA, CRISE E UM MINISTRO SUICIDADO

Crise: Desvendar o mistério Trichet. A Euribor foi abaixo mas as taxas de juro subiram (e só deram sinais de descer depois das intervenções simultâneas de quase todos os governos da EU). Trichet é, portanto, o sr. “mal-entendido” que tarde e a más horas, decidiu… Resultado: ninguém o seguiu. Antes e depois, ele estava “certo”... Consumidores, famílias e empresas é que não o entendiam e estavam “errados”… Viu-se! E ainda não se demitiu...?!



Ler os jornais, nestes dias da grande crise, serve sobretudo para vermos como mais de 95 por cento dos opinion-makers não percebe nada do que se está a passar… E não consegue escondê-lo. Parece aquela estória dos cegos à volta de um elefante a tentarem adivinhar que coisa será pela impressão recolhida do sítio em que lhe tocam...

José Mateus Cavaco Silva


O caso das casinhas da Câmara mostra bem um dos mais tristes (e só aparentemente paradoxal) aspectos do Portugal pós-Abril: a “união de facto” (ainda não tanto o casamento gay...) das nomenklaturas comunistas e aparentadas locais com o “complexo salazarento e neo-corporativo”. Bem instalada nestas ricas casinhas e bem abrigada atrás de um discurso de “superioridade moral”, esta “união de facto” vai próspera, feliz e fazendo muitos meninos. Este conúbio só aparentemente é insólito porque, realmente, “o que os une (a dependência das tetas do Estado) é muito mais forte que o que os separa (as simpatias pela esquerda totalitária ou pela direita totalitária)”… E todos berram contra o liberalismo, essa coisa que, claro, seria pôr as casinhas da Câmara no mercado (de arrendamento, o tal que Salazar liquidou e ninguém quer ressuscitar), entregando-as a quem as pagasse pelo seu valor (resolvendo-se, assim e de caminho, também o défice crónico, agudo e grave da CML. Compreende-se… Tudo se compreende. Tal como se compreende que um dia (como a história do sítio bem ilustra) a coisa acaba mal... Até lá, vão vivendo à conta e bordando belos discursos com os resíduos da “superioridade moral” de comunistas e fascistas.



As Finanças andam a confundir o dispositivo militar com a Função Pública e aplicar-lhe as mesmas regras. Há outras maneiras de dizer isto: confundir o rabo com as calças ou, melhor ainda, comparar o cu com a feira de Castro... Leia-se o texto de Helena Pereira no “Sol” de 11 deste mês e fica-se esclarecido sobre a dimensão do enorme mal-entendido. Mas se as Finanças cometem o típico erro do tecnocrata pouco atento ao valor real e ao peso e densidade de certos “imateriais” (como “a soberania” ou “o moral”) e pouco entendido nos determinantes da geopolítica e suas implicações fatais, já o ministro da Defesa comete suicídio. Porque, a ser verdade o que o “Sol” relata, isto é o suicídio político de Severiano Teixeira… O ministro da Defesa foi apagado deste quadro. Assim, os militares percebem que não podem contar com ele. E a partir daí, o ministro não conta no campeonato. É claro… Se ele deixar que isto aconteça, realmente. Se a norma diz que poucos sobrevivem politicamente ao exercício do cargo de ministro da Defesa (façam a lista a dos ministros dos últimos trinta anos e vejam...), a agir assim então é “morte” certa antes ainda do fim do exercício.

Desertores

Terceira classe de Desertores, aquela que Pacheco Pereira fala, e que tentava incluir num “bolo” único. Esta classe era constituída pela parte da população que beneficiava directamente do status-quo do Estado Novo, privilegiada, rica e instruída, vivia num outro Portugal, bem "longe" do estado de indigência em que se encontrava a maioria da população.

Estes Portugueses tinham um bom nível de vida, mesmo para os padrões actuais.

Estes recusaram defender a pátria que tanto os beneficiava e preferiram partir, financiados, a maioria pelos dinheiros dos seus papás. E o seu “exílio” foi bastante dourado.

Nessa altura Paris devia ser uma cidade espectacular para quem tinha duas coisas, Dinheiro e tempo Livre. Mesmo para aqueles cuja mesada paternal não chegava para os copos do Quartier Latin e Montparnasse, podiam arranjar facilmente um empregozeco relativamente bem pago. Esta classe de desertores nunca pôs o pé nos Bidonville, onde a primeira classe de "desertores" vivia, até podemos dizer que raramente saiu dos limites da cité, dos seus cafés e livrarias.

Não quero que pensem que estou aqui a dar lições de moral a estes senhores. Não dou, porque sou de uma outra geração. Geração que nunca foi posta perante o dilema de ter que defender a sua pátria lutando. Se vivesse nesses tempos, não poderia dizer, hoje em dia, qual a opção que teria tomado.
Mas estes desertores não contentes com o que fizeram, voltaram logo a seguir ao 25 de Abril para Portugal e foram-se colocar em Alcântara a chamar de “assassinos” aos Portugueses que combateram em África. Mais tarde o acto de cobardia serviu de “medalha” para se introduzirem na classe politica dirigente, onde ainda se encontram. Aí difundiram a sua cultura de exigir direitos recusando-se a cumprir qualquer dever, cultura essa que hoje está completamente arreigada na Sociedade Portuguesa.

Mas não se ficaram por aí!

Tiveram até a desfaçatez de Auto-atribuir-se pensões por “feitos relevantes na luta Anti-fascista”.
Estes cobardolas apenas são merecedores do meu mais profundo desprezo.
Nada lhes devo.

Se houve 25 de Abril, se hoje vivemos em Democracia e se a minha geração nunca se confrontou com o dilema de combater ou não combater, são coisas que devo a todos os Portugueses que foram mobilizados para a guerra do Ultramar, sobretudo aqueles que nunca voltaram.
Esses é que são os verdadeiros Heróis.
Esses é que foram os que se sacrificaram.
Esses foram aqueles que todos os dias, durante dois anos ao acordar, não sabiam se iria ser a última vez.
Esses são aqueles que hoje estão votados ao esquecimento.
Esses são aqueles que a classe política, saída do 25 de Abril, nunca teve a honra nem a dignidade de lhes agradecer.

A todos os que foram mobilizados, o meus sinceros agradecimentos.

Aos filhinhos do Papá e da Mamã, que prestaram a sua comissão nos bares do Quartier Latin.

BADAMERDA!

Luís Bonifácio

Capitão Salgueiro Maia

O depois considerado grande herói do 25 de Abril, o então Capitão Salgueiro Maia, cerca de uma semana depois de chegar à Guiné, com a sua C.Cav.ª n.º 3420, na Instrução de Aperfeiçoamento Operacional (IAO), veria a sua companhia completamente destroçada, o que seria resolvido com um seu “salve-se quem puder”. Houve militares que apenas apareceram dois dias depois e outros que seriam apanhados e ficariam detidos nas prisões do PAIGC.

Ten-Coronel Marcelino da Mata

TGV - EM QUEM ACREDITAR...?!

Bruxelas e a ADFER dizem, no mesmo momento e sobre o mesmo assunto, coisas opostas. Mais, o presidente da ADFER, como "especialista em combóios", diz que a ligação Porto-Lisboa não deve ser feita por ser um desperdício de dinheiro (mas nada diz das centenas de milhões de contos que já se gastaram na chamada linha do norte sem ter resolvido nenhum dos seus problemas...). O problema é que o quadro de decisão do TGV Lisboa-Porto não é de "especialistas de combóios" mas sim de políticas de valorização do território e de estratégia do País. E é neste quadro que a decisão tem de ser discutida para fazer sentido. Depois, entrem em cena os especialistas de combóios para tratar os problemas de combóios que essa decisão coloque. Mas neste sítio anda tudo ao contrário e os especialistas de combóios querem decidir da estratégia e da valorização do território...

O quadro de contradição entre a ADFER e Bruxelas cria dúvidas, claro. E na dúvida o melhor mesmo é perguntar a quem sabe: Prof. António Brotas, diga-nos o que lhe parece isto e como estão realmente as coisas...

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Presidente da ADEFER fala em desperdício de dinheiro

14-10-2008 8:50



A Associação Portuguesa para o Desenvolvimento do Transporte Ferroviário considera ser desperdício de dinheiro a construção da linha de TGV entre Lisboa e Porto e defende o seu adiamento.

Esta é, apenas, uma das críticas que o presidente da ADEFER faz ao projecto do Governo para a Alta Velocidade.

Arménio Matias insiste que a ligação Lisboa-Madrid deveria passar por Alcochete e estranha o atraso da obra em Portugal em relação a Espanha que iniciou o projecto na mesma altura.

Para este responsável, Portugal está muito atrasado quanto ao TGV, lembrando que tudo começou ao mesmo tempo - em 1988 - em Portugal e Espanha.

Nestas declarações, o presidente da ADEFER, diz que não concordar com o calendário proposto pelo Governo para o TGV em Portugal e considera que o projecto contém soluções dispendiosas e esbanjadoras. Na sua opinião, o plano poderia ser mais barato e mais eficiente.

Arménio Matias diz ainda que a linha deveria ter sido alterada depois da decisão de não se fazer o novo Aeroporto na Ota e sim em Alcochete, defendendo que a ligação Lisboa-Madrid e Lisboa-Faro deveria passar sempre por Alcochete.


Já quanto ao traçado Lisboa-Porto, uma prioridade para o Governo, este especialista em caminhos de ferro diz que não se deve fazer imediatamente pois isso é um desperdício de dinheiros públicos.

Cx/Paulo Neves

Bruxelas diz que TGV Portugal-Espanha está no «bom caminho»
Relatório anual de acompanhamento do projecto
2008/10/14 15:13Redacção / MD



Custos serão mais baixos na parte portuguesa



O projecto de eixo ferroviário de alta velocidade (TGV) que ligará Portugal e Espanha «parece actualmente estar no bom caminho, tanto a nível de programação, como de custos», indica o relatório anual de acompanhamento do projecto, divulgado esta terça-feira em Bruxelas, citado pela «Lusa».

O relatório aponta que «efectivamente, de acordo com os dados disponíveis, os custos serão mais baixos na parte portuguesa» e os prazos estão a ser cumpridos.

Segundo o documento, que foi elaborado pelo coordenador europeu do eixo ferroviário de alta velocidade do sudoeste da Europa, Etienne Davignon, adianta que «no que respeita à parte portuguesa da ligação, relatórios mais pormenorizados confirmaram os progressos registados entre o Porto e Lisboa e entre Lisboa e a fronteira espanhola (Caia)».

No entanto, o coordenador europeu aponta que há «algumas questões que merecem uma avaliação mais profunda», tais como o facto de o futuro aeroporto de Lisboa, em Alcochete, não ter ligação à linha de alta velocidade, o que «obrigará a um serviço expresso a partir do Poceirão no caso dos passageiros provenientes do Leste e do Sul de Portugal.

O coordenador recomenda ainda «que seja realizada no projecto a avaliação do impacto da mudança de localização do aeroporto da Ota», no caso específico da ligação Lisboa-Porto.

José Mateus Cavaco Silva at October 14

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Roubo e saque

Há muitos anos que o Estado liquidou o mercado do arrendamento. Intervenções sucessivas culminaram no congelamento das rendas após 1974. Os resultados foram péssimos.

A desvalorização da propriedade arrendada gerou a ruína dos centros das cidades. Os jovens, mal começam a ganhar algum dinheiro, são obrigados a endividar-se para o resto das suas vidas para gáudio dos bancos e dos construtores.

As novas gerações são sacrificadas em prol dos benefícios ofertados aos que arrendaram casas antes do 25 de Abril. Nenhum Governo teve coragem e seriedade política para mudar isto. Agora, o Estado, que provocou a desgraça, quer triplicar a carga fiscal aos prédios arruinados. Era como se o incendiário multasse o dono do pinhal por este o ter deixado arder.

Carlos de Abreu Amorim

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

OS DOZE TRABALHOS DE HERCULES

A expressão “trabalhos de Hercules” designa uma tarefa difícil ou impossível de realizar. Hercules ou Heracles, herói mitológico grego dotado de força extraordinária, é fruto da união entre o pai dos deuses, Zeus’ e Alcmena, mulher do general tebano Anfitrião. A ciumenta Hera, mulher de Zeus, enviou duas grandes serpentes para o matar ainda em criança, mas Hercules estrangulou-as com as suas próprias mãos. Mais tarde, casou com a princesa tebana Megara, com quem teve três filhos.mas Hera provocou-lhe um ataque de loucura, durante o qual matou a mulher e a prole. Horrorizado, tentou suicidar-se, mas o oráculo de Delfos persuadiu-o a expiar o crime convertendo-se em servo do seu primo Euristeu, rei de Micenas. Este, compelido por Hera, impôs-lhe o desafio de vencer 12 provas. O 1º trabalho foi matar o leão de Nemeia; o 2º, a destruição da hidra de Lerna; depois, capturou vivos um feroz javali que vivia no monte Erimanto e a corça sagrada do monte Carineu. A seguir eliminou os pássaros Estinfalos. Como 6º trabalho, limpou num só dia os estábulos do rei Áugias. Depois trouxe vivos para Euristeu o touro de Creta e os cavalos devoradores de homens de Diomedes. Como 9ª e 10ª prova, foi buscar a cinta da rainha das Amazonas e o rebanho de Gerião. Por fim, trouxe a Euristeu o cão do inferno, Cérbero, e os Pomos do Ouro de Hespérides. Hercules morreu mais tarde, envenenado, mas os seus feitos valeram-lhe a ascensão ao Olimpo.

‘João Palma’

AS COISAS NÃO DERAM CERTO. O QUE FAZER?

Lembramos de que existem muitas opções no mundo dos negócios e vários caminhos a percorrer. Devemos analisar o mercado e a concorrência antes de tomar qualquer decisão.
Fazer um balanço da situação financeira e ver se esse é o melhor momento para arriscar. Sinal verde, devemos elaborar um plano de sobrevivência econômica.
Não podemos adiar as mudanças. Existindo decisão pela virada na vida profissional, o plano deve ser colocado em prática.
Outro ponto importante: As metas estabelecidas, devem ser possíveis de serem alcançadas e ano devemos nos isolar na hora de tomar decisões importantes.

‘Rocha & Coelho’

sábado, 14 de junho de 2008

NINGUÉM CHORE SOZINHO


A vida é bonita como uma flor. Viver é bonito que nem um passarinho. É do jeito dos olhos e do olhar. Colorido, preto e branco como se quer. Pedra e pau, algodão e fumaça. Cabriola e requebro, rodopio e ponto de chegada. Vai e volta. E por ser ela, nem vai nem volta. Estanca nas emoções que são os confeitos da própria vida.
A vida é o menino mijando no fundo do quintal, o caramelo na boca, a sacristia, o perdão do copo da cachaça, a mulher nua, o homem de gravata, o peito empinado, o seio de mamar, a lágrima e o véu, o coração e o pio, a pena e a asa, mesmo assim, um passo, mergulho sem fundo. A vida é vez. E toda vez é vez. Nem que seja pelo avesso. Que frente e costa têm cor. Nos arco-íris de fora e de dentro.
A vida é doce que nem lágrima salgada. É um rio no rosto que espera. Um caminho de bocas e de silêncios. Vestido rendado e calça curta. Véspera e luz. Nos arredores do tempo, os canteiros se enchem de flores e pingam espinhos, que flor e espinhos, que flor e espinho são da mesma oração. A vida é bonita como uma flor eterna em cada pétala que cai. E se debruça no chão, o orgasmo da fome.
Pois a vida é fome e pétala, é rosa e canteiro, parto e aborto, explosão e desmaio, o cisco no canto do olho, a cadeira de rodas, a espingarda, o gatilho das esperanças, a esmola e a mão cheia. O pinico e o prato, o pé, o sapato, o cabelo e a queda, o baile e o sereno, o vestido e o nu. Os dedos desencontrados que enganam a magia das mãos...
Por tudo isso me calo. Perco a voz. Esqueço o silencio. Que a voz é vôo. Canto as minhas alegrias e me deito nos meus recantos. Todos eles cheios de estradas e de mim mesmo. Canto a vida, o vai-e-volta das cavernas, a árvore e o tronco, a minha ilusão das catedrais e dos morcegos, o vôo surdo das asas noturnas, o roçar das pernas flutuantes nas beiras da noite. Por tudo isso eu não me calo. Adejo, flutuo, nos morcegos e nas andorinhas que misturam as imagens das criaturas.
Por tudo isso eu calo e não me calo. A dor do sapato se muda na dor da estrada, pois a vida é bonita que nem uma flor. Estes passos dos dedos, das unhas, das estrias, dos riachos da alma, pedaços de tudo que escorrem para dentro de mim. É vez de ver, de escutar, de sombra e luz. A luz debaixo dos meus pés, que os pés se multiplicam nas veredas, gosto dos caminhos maiores.
Por isso, a vida é maior. Pois pergunto ao tronco e à folha, a razão de cada um, pauta e escala musical, onde verdadeiramente estou, onde verdadeiramente estamos. Talvez na pétala ou no espinho, no tronco ou na folha, no tronco da moeda, no espelho de todas as imagens. De resto, que ninguém chore sozinho.

In memoriam

‘Robério Maracajá’

Nota: Foi pedida uma retificaçao ao autor desta peça, na realidade elachegou á minha mão com a indicação do autor publicado. Não querrendo menosprezar, nem um nem outro remeto os esclarecimentos devidos para os comentários, e cada um retire as suas ilações!

SOBRE A AMIZADE – 2

A tolerância, talvez seja essa a parte principal. Há de entender-se... Que nenhum ser humano vive em total estado de bom humor a vida toda. Haverá dias em que os ânimos não estarão bons, o coração de um deles não estará bem. Isso sem contar que as pessoas em geral têm os mais diversos tipos de temperamentos e, portanto de atitudes. Há de saber-se que para se ter um amigo, alguns momentos desagradáveis dele teremos de suportar, passar por cima mesmo, ignorar, sabendo inclusive que ele em algum instante fará o mesmo por nós se for amizade verdadeira o que ele sente. Há de saber-se, aceitar e entender, que a perfeição em termos de ser humano não existe, cometemos todos, diversas vezes, falhas, enormes falhas. Nenhum de nós é o rei da verdade, nenhum de nós está certo o tempo todo... em algum momento o nosso amigo é que será a parte certa e por mais que o nosso orgulho nos impeça de dizer, teremos que aceitar.
A humildade há de precisar fazer-se presente sempre. Amigos que não convivem com isso, dificilmente conseguirão levar esse relacionamento avante. Há de ter-se humildade pra dizer coisas simples: “Eu errei, você me perdoa?” “Eu me arrependi, você me desculpa?” “Eu não fui fiel a você, me dá outra chance?” “Eu disse o que não devia, você pode esquecer?” “Eu ando negligenciando nossa amizade, você me permite recuperar esse tempo perdido?”
Amigos não se orgulham de ter orgulho, eles orgulham-se é de passar por cima dele no momento que se fizer necessário.
Orgulho de amigos tem que estar em tê-los como amigos e em poder dizer a qualquer um: “Sim, ele tem um milhão de defeitos, comete mil erros, falha muitas vezes... Mas é meu amigo!”... E nessa última frase... “Mas é meu amigo” “Esta implícito,” e, portanto, apesar de tudo, é com ele que conto na hora da dor e na hora da alegria”. Ser humilde em uma amizade não significa humilhar-se, significa sim, provar ao outro o seu grau de importância em nossa vida.
Por fim, uma amizade há de ter altos e baixos sim, há de atravessar furacões, cair em abismos, há de despedaçar-se, arrastar-se, ser vulnerável... Mas se for amizade de verdade, há de voltar, envolta em ferimentos, apoiada numa bengala, sangrando até... E há de encontrar o seu companheiro com o curativo nas mãos, amor no coração e disposto a dar o perdão!

‘Brígida Brito’

O VINHO QUE VIROU ÁGUA

(Ou o tudo que virou nada)

Nos Alpes Italianos existia um pequeno vilarejo que se dedicava ao cultivo de uvas para produção de vinho. Uma vez por ano, lá ocorria uma festa para comemorar o sucesso da colheita.
A tradição exigia que nesta festa, cada morador do vilarejo trouxesse uma garrafa do seu melhor vinho, para colocar dentro de um grande barril que ficava na praça central. Entretanto, um dos moradores pensou:
“Porque deveria levar uma garrafa do meu mais puro vinho? Levarei uma d’água, pois no meio de tanto vinho o meu não fará falta”.
Assim pensou e assim fez.
No auge dos acontecimentos, como era de costume, todos se reuniram na praça, cada um com sua caneca, para pegar uma porção daquele vinho, cuja fama se estendia além das fronteiras do país.
Contudo, ao abrir a torneira do barril, um silencio tomou conta da multidão. Daquele barril apenas saiu água. Como isto aconteceu? Foi que todos pensaram como aquele morador:
“A ausência da minha parte não fará falta”.
Reflexão:
Nós somos muitas vezes conduzidos a pensar:
“Tantas pessoas existem neste mundo que se eu não fizer a minha parte isto não terá importância”.
O que aconteceria com o mundo se todos pensassem assim?

‘Brígida Brito’

DAS VIRTUDES DO FUTURO

Por que razão, quando mais compreensível se tornou o mundo, mais foi diminuída toda a espécie de solenidade? Teria sido porque o medo foi tão frequentemente o elemento fundamental dessa veneração que se apoderava de nós diante de tudo o que nos parecia desconhecido, misterioso, e nos levava a nos prosternar e pedir graça diante do incompreensível? E pelo fato de nos termos tornado menos receosos, não teria o mundo perdido para nós o seu encanto? Ao mesmo tempo nossa disposição ao temor, nossa própria dignidade, nossa solenidade, nossa própria aptidão a aterrorizar no teriam diminuído? No estimaremos talvez menos o mundo e a nós mesmos, desde que temos, a respeito dele e ao nosso, pensamentos mais corajosos? Viria talvez um momento, no futuro, em que essa coragem do pensador tivesse crescido tanto que tivesse o supremo orgulho de se sentir superior aos homens e ás coisas – em que o sábio, sendo o mais corajoso seria aquele que se visse a si mesmo e a existência completa abaixo dele? – Esse gênero de coragem que não se afasta de uma excessiva generosidade tem até agora feito falta à humanidade. Ah! Os poetas não queriam tornar-se novamente o que foram talvez outrora: visionários que nos dizem algum coisa daquilo que é possível! Hoje, que lhes retiramos das mãos e que é necessário sempre mais lhes retirar de suas mãos o real e o passado – pois já passou o tempo em que inocentemente se cunhava moeda falsa! – deveriam nos dizer alguma coisa daquilo que toca as virtudes do futuro! Ou das virtudes que não existirão nunca na terra, embora possam existir em alguma parte do mundo – as constelações purpúreas e as imensas vias lácteas do belo! Onde estão vocês, astrônomos do ideal?

‘Friedrich Nietzsche’

DA MEIA IDADE

A rapariga na casa de chá Não é tão bonita como era, O Agosto já a gastara. Já não sobe as escadas tão depressa; Sim, também ela se aproxima da meia-idade, E o brilho da juventude que ela espalhava sobre nós Quando nos trazia os bolos secos Já não se espalhará mais sobre nós. Também ela se aproxima da meia-idade.

Ezra Pound, trad. José Palla e Carmo

CIDADE

Em rumores a cidade concerta os humores com que avança e encontra desejos, a maldade explode ruídos metálicos e os motores explodem fagulhas multicoloridas sobre seres soturnos e alegres em suas ruas o traçado amordaça o sentido da liberdade em regras e retornos, viadutos sobre o nada e o todo ultrapassado na pressa da chegada, (para onde se dirige o olhar do menino, o andar apressado do atrasado: o acordar e estar perdido em razões despercebidas) a cidade aglutina e repele, multiplicadas vias decompõem trajetos de poucas praças, o concreto e o negro asfalto de ásperos contatos repetem a secura e o deslizar dos passos: a cidade se fecha.

Pedro Du Bois

BABY PICTURE

It's in the heart of the grape where that smile lies. It's in the good-bye-bow in the hair where that smile lies. It's in the clerical collar of the dress where that smile lies. What smile? The smile of my seventh year, caught here in the painted photograph. It's peeling now, age has got it, a kind of cancer of the background and also in the assorted features. It's like a rotten flag or a vegetable from the refrigerator, pocked with mold. I am aging without sound, into darkness, darkness. Anne, who are you? I open the vein and my blood rings like roller skates. I open the mouth and my teeth are an angry army. I open the eyes and they go sick like dogs with what they have seen. I open the hair and it falls apart like dust balls. I open the dress and I see a child bent on a toilet seat. I crouch there, sitting dumbly pushing the enemas out like ice cream, letting the whole brown world turn into sweets. Anne, who are you? Merely a kid keeping alive.

Anne Sexton

A MÍSTICA DO SANTO ANTÔNIO

Hoje (ontem) dia 13 foi dia de Santo Antônio, uma das divindades de maior devoção popular, até mesmo São José, pois é impossível enumerar as capelas e oratórios privados onde o santo é venerado. Conhecido como Santo António de Lisboa, lugar onde nasceu, em 1190 ou 1195, ou Santo Antônio de Pádua, localidade de sua morte, ocorrida no ano de 1231, foi muito venerado pelos escravos, no Brasil, com a denominação de Santo Antônio Preto, depois de pintado com um pigmento de cor escura.
Desde aquele tempo, seu prestigio é devido principalmente ao poder como engendrador e protetor de casamentos, padroeiro do amor, deparador, (achador) de coisas perdidas e aplacador da fúria do mar. Também foi transformado no “Guia do Exercito”, desde 1597, quando o frade português Bernardo de Brito divulgou a necessidade de se recorrer a um santo de casa que tivesse a habilidade de lutar e defender a pátria. E como no Brasil Colônia se copiava tudo de Portugal, o santo foi logo nomeado como “capitão da Fortaleza da Barra”, na Bahia, “coronel”, em São Paulo, “capitão”, em Goiás, “tenente-coronel”, no Rio de Janeiro, “tenente”, no Recife e “soldado”, na Paraíba e no Estado do Espírito Santo.
Tendo sido batizado, ao nascer, em Lisboa, com o nome de Fernando de Bulhões, por volta de 1210 o religioso ingressa no mosteiro de São Vicente de Fora, seguindo depois para Coimbra onde, ao tomar o hábito, em 1220, embarca para a África, em missão de catequese. Em 1221, fixa-se na Itália, tornando-se famoso pelos sermões que denunciam seus dotes oratórios, numa linha de critica às injustiças sociais, através de símbolos e alegorias. De tanto exaltar a caridade e clamar em favor da pobreza, recebeu o cognome de “martelo de Deus”. Após sua canonização, em 1232, foi determinada a data de 13 de junho para os seus festejos e erigida uma grande basílica em Pádua, na Itália, sobre seu túmulo.
Hoje, com a modernidade e a globalização, o desprestigio do casamento como instituição e o desencanto gerado pelo próprio materialismo em que as pessoas se enredam, as festas de Santo António estão escasseando e mesmo no interior do nordeste brasileiro não são mais tão animadas. Mas o prestigio do Santo, sua força e sua marca no imaginário popular, quem haverá de contestar?...

‘Fátima Araújo’

SOB OS VENTOS DO SUL

Não me entendo mais! Ainda ontem, eu sentia em mim a tempestade, alguma coisa de quente e de ensolarado, extremamente claro. E hoje tudo é tranqüilo, vasto, melancólico e sombrio, como a laguna de Veneza: - não quero nada e não solto um suspiro de alivio e, contudo, estou secretamente indignado com esse “não querer nada”: - assim as ondas vão e vêm aqui e acolá no lago da minha melancolia.

‘Friedrisch Nietzsche’

OS TRÊS DIAS

Mansour Hallaj foi um dos grandes místicos do Islã, e viveu grande parte de sua vida no Iraque. Ele dizia que o homem é uma manifestação de Deus, mas seus trabalhos apresentavam algumas contradições com o que era oficialmente reconhecido na sua época.
Como resultado, terminou sendo acusado de blasfemar contra a religião, e foi condenado à morte.
No dia da sua execução, um dos discípulos perguntou:
“Mestre o que é o amor?”
“Olhe com cuidado tudo que acontecer comigo hoje, amanhã, e depois de amanhã”, respondeu Hallaj. “Isso é o amor”.
Naquele mesmo dia, ele foi morto.
No dia seguinte, queimaram seu coração. No terceiro dia, espalharam suas cinzas, e nunca mais puderam recompor o coração de Hallaj.

‘Paulo Coelho’

O PIOR CAOS É O DA FÉ

O famoso filósofo Nietzsche, ao definir o conhecimento, algo sagrado para ele, transparece um sentimento de frustração. Afirmando que o homem por não conseguir conceituar com precisão as verdades aos seu redor, vive por meio de metáforas, mentindo para sobreviver. Nietzsche descobriu que ao fugir da realidade o homem, prefere a mentira e sofrer suas conseqüências, do que usar a verdade que ele não consegue definir. A meu ver, em meio a este dilema, de verdade e mentira, o homem reage de duas formas na vida. O homem racional, aceita este fato, de que sempre ele terá que dar uma resposta, pesada e qualificada; e o homem intuitivo, irá buscar em meio a este caos, a beleza construída pela aparência, que sobrevive por ver ao redor, um mundo fantasioso. Como alguém que sempre acha uma flor no deserto, um sorriso no leito da enfermidade ou a solidariedade em face da tragédia.

‘Hélder Torquato Fernandes’

O AMOR EM VISITA

Nem sempre me incendeiam o acordar das ervas e a estrela despenhada de sua órbita viva. - Porém, tu sempre me incendeias. Esqueço o arbusto impregnado de silêncio diurno, a noite imagem pungente com seu deus esmagado e ascendido. - Porém, não te esquecem meus corações de sal e de brandura. Entontece meu hálito com a sombra, tua boca penetra a minha voz como a espada se perde no arco. E quando gela a mãe em sua distância amarga, a lua estiola, a paisagem regressa ao ventre, o tempo se desfibra - invento para ti a música, a loucura e o mar. Toco o peso da tua vida: a carne que fulge, o sorriso, a inspiração. E eu sei que cercaste os pensamentos com mesa e harpa. Vou para ti com a beleza oculta, o corpo iluminado pelas luzes longas. Digo: eu sou a beleza, seu rosto e seu durar. Teus olhos transfiguram-se, tuas mãos descobrem a sombra da minha face. Agarro tua cabeça áspera e luminosa, e digo: ouves, meu amor? Eu sou aquilo que se espera para as coisas, para o tempo - eu sou a beleza. Inteira, tua vida o deseja. Para mim se erguem teus olhos de longe. Tu própria me duras em minha velada beleza.

Herberto Helder

HAVIA UMA MAGNÓLIA

Havia uma magnólia no jardim, mas isso não sabíamos ainda. Era apenas a árvore grande ao centro, com misteriosas flores brancas, é certo, por entre as folhas. Pousava, na sombra, a ideia de um esquilo (mas não havia esquilos no jardim, só nas páginas do livro aberto na mesa de pedra). Não sabíamos ainda nenhum nome, excepto, talvez, o dos pinheiros.

Graça Videira

HABITAR O TEMPO

Escutam-se nos seus cabelos as ondas do mar como se os abismos trouxessem o eco dos peixes beijando-se em camas de algas e os pescadores fossem deuses a invadir búzios reinos de silêncios quebrando o encanto da água exposta na luz dos espelhos com o sexo à flor da pele palpitando por entre os olhos da natureza a chamar sempre ao longe como se pudesse convencer um corpo a ficar eternamente abraçado a outro corpo no lugar onde é possível construir a casa habitar o tempo e sorrir aos pássaros que passam na rota do sol sim é possível escutar as ondas batendo na rocha macia dos seus cabelos soltos ao vento.

José António Gonçalves

DOS RIOS

“Eu conheço os rios.
Eu conheço rios tão antigos como o mundo, e mais velhos que o fluxo de sangue nas veias humanas.
Minha alma é tão profunda como os rios.
Eu me banhei no Eufrates, na aurora da civilização.
Eu fiz minha cabana na margem do Congo, e suas águas me cantaram uma canção de ninar.
Eu vi o Nilo, e construí as pirâmides.
Eu escutei o canto do Mississippi quando Lincoln viajou até New Orleans, e vi suas águas tornarem-se douradas ao entardecer.
Minha alma se tornou tão profunda como os rios”.

‘Langston Hughes’

DO TIJOLO

Dois sábios, que viviam na mesma ermida no deserto do Saara, conversavam um dia:
“Vamos brigar para que não nos afastemos do ser humano”, disse um deles.
“Não sei como começar uma briga”, respondeu o outro.
“Pois façamos o seguinte: eu coloco este tijolo aqui no meio, e você me diz: ‘é meu’. Eu lhe responderei: ‘não, este tijolo é meu’. Então começaremos a discutir, e terminaremos brigando”.
E assim fizeram.
Um disse que o tijolo era dele. O outro contestou, dizendo que não.
“Não vamos perder tempo com isto, fique com este tijolo”, disse o primeiro.
“Sua idéia para a briga não foi muito boa”, disse o outro, depois de alguns minutos.
“Quando percebemos que temos uma alma imortal, é impossível discutir por causa de coisas”.

‘Paulo Coelho’

terça-feira, 10 de junho de 2008

CONDICIONAMENTOS

Treinamento de pulgas

Sabe como se treina uma pulga? Feche-a dentro de um vidro e feche-o. a pulga não gosta de ficar presa e começa a pular. Ela pula, bate na tampa do vidro e volta. Ela vai fazer isso várias vezes, até que o seu cérebro chega à conclusão de que não adianta. Então, ela começa a pular mais baixo, sem bater na tampa. Depois que isso acontece, você pode tirar a tampa do vidro que a pulga nunca mais vai pular para fora. O cérebro dela ficou condicionado à existência da tampa e ela não identificará mais a sua ausência.

Elefantes

O treinador pega o elefante, quando filhote, passa uma corda no pescoço dele e o amarra a uma arvore. O elefantinho tenta sair, mas a árvore é pesada, forte, e ele no consegue. Depois de várias tentativas, ele desiste. Aí ele cresce, vai para o circo, e o palhaço, para prende-lo, só tem de amarrá-lo à perna de um tamborete. O elefante continuará sempre pensando que está amarrado em uma árvore.
Não somos pulgas nem elefantes, mas também temos uma serie de condicionamentos. Mas, geralmente, não nos damos conta disso.

Limitações

Por que será que temos tanta dificuldade pra nos comportar em nosso próprio beneficio?
O 99% do pode da mente humana está concentrado no inconsciente. Mas toda a nossa educação costuma explorar apenas o consciente. No nos ensinam a trabalhar com o inconsciente, cuja porta de acesso é o hemisfério direito do cérebro.
As limitações que vivemos decorrem da programação negativa instalada em nós durante a infância, e também do uso limitado que fazemos do nosso cérebro. Todos temos dentro de nós um “termostato” que determina o nosso valor. Aliás, todos temos escrito na testa, com tinta invisível, o quanto valemos. Quando aumenta o seu termostato, você aumenta o valor que acha que tem e, em conseqüência, aumenta o que o mundo vai entregar para você.
Quem determina o seu termostato ou o seu valor pessoal, é você. E essa temperatura interna não tem nada a ver com a temperatura externa. Se o seu termostato interno diz, por exemplo, que você vale meio milhão de dólares, isso é o que o mundo tende a entregar para você, independentemente d crise econômica, da situação do país, da conjuntura mundial, etc.
O que vale é a sua estrutura interna. O mundo é um reflexo do seu interior.
Para acompanhar a evolução do mundo, você precisa usar o seu cérebro de modo diferente do habitual. Se você tiver sucesso dentro do seu cérebro, o sucesso virá. Se você tiver amor, vai receber amor.
No momento em que você muda as suas crenças e os seus valores, o mundo muda para você num estalar de dedos.
William James, um dos grandes filósofos e psicólogos americanos, disse:
“Até agora, pensava-se que, para agir, era preciso sentir. Hoje, sabe-se que, se começarmos a agir, o sentimento aparece”.
E conclui:
“O passarinho não canta porque está feliz, ele está feliz porque canta”.
Ainda que esteja deprimido, se você começar a agir de um jeito feliz, você passará a se sentir feliz e, então, será feliz. O comportamento muda o sentimento e este muda o pensamento.
Seguindo esse relacionamento, você pode não estar recodificando diretamente as crenças negativas instaladas no seu cérebro. Mas estará diminuindo o peso delas na sua vida e, ainda, estará exercitando a forma correta de instalar positivas no seu cérebro.

‘Lair Ribeiro’

COMO POSSO SER EU?

Como posso ser eu, se o meu eu não me vê?
Como posso ser eu, se o meu eu me esqueceu?
Como posso ser eu, se o meu eu se perdeu,
se o meu eu se perdeu procurando você?

Se o meu eu de meu eu hoje em dia descrê
e a você se prendeu, como posso ser eu?
Como posso ser eu, se o meu eu entendeu
com você ir embora, sem quê nem porquê?

Como posso ser eu, se você foi embora,
se o meu eu resolveu não ser mais eu agora
e em você se escondeu para ser eu também?

Se o meu eu, que é só seu, em meu eu já não mora,
como posso ser eu, se você se demora,
como posso ser eu, sendo apenas ninguém?

‘Ronaldo Cunha Lima’

COMO PEDIR AUMENTO

O mundo corporativo coloca em pólos opostos o empregado, acreditando-se injustiçado porque ganha menos do que julga merecer, e o empregador, convencido de que paga mais do que deveria pela produção gerada.
Para vencer a batalha de conseguir um aumento salarial, informação e astúcia são os ingredientes básicos, aplicados conforme as dicas a seguir.

1 – Faça uma auto-avaliação criteriosa. Aumentos devem ser obtidos por mérito antes mesmo de serem desejados. Por isso, pondere sobre a sua performance. Acompanhe os seus relatórios de avaliação de desempenho e competência e o feedback do seu supervisor e colegas de trabalho.

2 – Pesquise o mercado. Analise a média salarial do seu cargo no mercado comparando-a com a média paga por sua empresa. Lembre-se de considerar o porte da companhia. Não se pode esperar de uma pequena corporação a mesma capacidade de remuneração de uma multinacional.

3 – Conheça a política salarial da sua empresa. Uma companhia com plano de cargos, e, salários, bem estruturada; apresenta regras para promoção, premiação e remuneração. Assim, pode haver critérios que considerem não apenas questões qualitativas, vinculadas a resultados, mas também ciclos cronológicos relacionados às faixas salariais. As normas podem até mesmo limitar a autonomia do gestor na concessão de aumentos, impedindo-o de atender à sua desmanda.

4 – Estude o ambiente. Observe o desenvolvimento de seus colegas de trabalhos. Procure identificar um padrão de comportamento que possa ter conduzido alguns profissionais a uma posição superior. Examine o mercado e a posição relativa da sua empresa para descobrir como anda a sua saúde financeira no momento. Faça uma leitura do perfil e das reações de seu gestor a fim de notar a melhor ocasião para abordá-lo.

5 – Prepare o terreno. Faça um levantamento das suas atividades buscando mensurar os resultados alcançados. Elabore uma relação dos benefícios que você traz para a corporação e como pode potencializá-los. Prepare uma proposta de solicitação de elevação salarial atrelada às metas da empresa, com um planejamento detalhado para um horizonte de 12 meses, por exemplo, com gatilhos de incremento em seus proventos a cada fase concluída do projeto.

6 – Dê o bote. O melhor local na própria empresa em uma reunião a portas fechadas para minimizar o risco de interrupções. O momento certo: logo após a realização de um projeto bem sucedido e num dia em que o gestor esteja de bom humor. A abordagem recomendada: clareza e objetividade na exposição, porém sem denotar agressividade. Iniciar enaltecendo com autenticidade a companhia, o cargo exercido, a liderança e a equipe. Explicitar o trabalho realizado, os pontos positivos e as perspectivas futuras, conforme o planejamento traçado anteriormente.

7 – Quando negociar. Não há uma regra para isso. Primeiro, porque depende da política da empresa. Os dissídios coletivos anuais são da ordem de 5%. Já os aumentos vinculados ao tempo de serviço ou mudança de função dentro do plano de cargos e salários giram em torno de 10%. Os maiores índices podem ser obtidos quando acoplados ao resultado da companhia.

8 – Esqueça os apelos emocionais. A Companhia não está preocupada com o fato da; sua família aguardar a chegada de trigêmeos, o filho mais velho ter ingressado numa universidade privada ou o seu avô exigir um caríssimo tratamento médico. Separe a pessoa do problema. Justificativas de cunho emocional podem até funcionar uma primeira vez, mas o risco maior é causar constrangimento e denunciar que você é um mau administrador das suas finanças pessoais – e, por conseguinte, um péssimo exemplo de gerenciamento para a própria companhia. O foco deve estar em seu desempenho e o nome do jogo é meritocracia.

9 – Esteja pronto para negociar. Evidentemente, sua proposta pode ser total ou parcialmente recusada. Neste caso, negocie benefícios, objetivando ganhar mais no longo prazo com base em seu desenvolvimento pessoal. Assim, um curso de idiomas ou um MBA podem representar uma transferência de despesa pessoal que você teria e que será assumida pela empresa.

10 – Mantenha a confiança e a auto-estima. Uma postura determinada e segura compõe uma imagem adequada ao seu marketing pessoal. Além disso, calcule os riscos da sua iniciativa. Cuidado também com a adoção de flertar com ofertas de trabalho de outra empresa. Poderá receber um “até logo” quando imaginava que a proposta seria coberta.

Você avaliou o seu desempenho, estudou o mercado e a sua companhia, planejou uma argumentação sólida e coerente para respaldar o seu pedido de aumento salarial e negociou. Se mesmo assim a empresa tem sucessivamente negado um reconhecimento afetivo pelo trabalho, é hora de considerar a possibilidade de mudar de emprego. Afinal, tapinha nas costas não paga contas.

‘Rocha & Coelho’