quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Ave, réptil ou mamífero?

Agência FAPESP – Não há nada igual. Quando exemplares do ornitorrinco (Ornithorhynchus anatinus) foram enviados da Austrália para a Inglaterra, em 1798, causaram tamanho espanto que os cientistas britânicos consideraram se tratar de uma farsa.
Não é para menos, pois o estranho animal desfila uma lista de características inusitadas. Para começar, é um mamífero que põe ovos. Em seguida, combina um couro espesso que permite a permanência em águas geladas com um bico semelhante ao de um pato – bico que tem um sistema sensorial usado para buscar alimentos na água. O macho conta ainda com esporão capaz de disparar poderoso veneno para afugentar predadores ou competidores.
Tudo isso tem aguçado, desde o século 18, o interesse da ciência pelo representante da ordem dos monotrematas. Agora, um grupo internacional acaba de dar a mais valiosa contribuição ao conhecimento do ornitorrinco, com o seqüenciamento de seu genoma.
Publicada na edição de 8 de maio da revista Nature, a análise revela que as características únicas do animal não se resumem ao seu exterior, mas são também destacadas geneticamente. A seqüência foi comparada com as do homem, camundongo, cão, gambá, frango e lagarto.
Os pesquisadores descobriram que o genoma do ornitorrinco tem aproximadamente o mesmo número de genes que codificam proteínas que o genoma dos demais mamíferos – cerca de 18,5 mil. Ele também compartilha mais de 80% de seus genes com outros mamíferos cujos genomas foram seqüenciados.
Bico de pato à parte, os cientistas verificaram no genoma do animal, além de detalhes de mamíferos, características comuns aos répteis. A principal foi a presença de genes associados à fertilização de ovos. Outra é a presença de poucos receptores olfativos, diferente dos demais mamíferos.
O grupo também descobriu que o veneno produzido pelo animal deriva de duplicações em determinados genes durante a evolução, que foram herdados de ancestrais répteis.
"À primeira vista, o ornitorrinco aparenta ser resultado de um acidente evolucionário. Mas, independentemente de sua aparência estranha, a seqüência de seu genoma é muito valiosa para compreender como os processos biológicos fundamentais dos mamíferos evoluíram. Comparações de seu genoma com os de outros mamíferos levarão a novas descobertas a respeito da história, estrutura e funcionamento do nosso próprio genoma", disse Francis Collins, diretor do Instituto Nacional de Pesquisa do Genoma Humano, nos Estados Unidos, que financiou parte do estudo.
"Com o seqüenciamento, poderemos identificar quais genes foram conservados, quais foram perdidos e quais se transformaram durante a evolução dos mamíferos", disse Richard Wilson, da Escola de Medicina da Universidade Washington, um dos autores da pesquisa.
O artigo Genome analysis of the platypus reveals unique signatures of evolution, de Wesley Warren e outros, pode ser lido em www.nature.com.

Bactérias espertas

Agência FAPESP – Bactérias antecipam mudanças no ambiente e rapidamente se adaptam de modo a conseguir vantagem competitiva. É o que aponta um estudo publicado na revista Science.
Por meio de simulação em computadores, Ilias Tagkopoulos, da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, e colegas apresentam no artigo evidências de que bactérias podem aproveitar seqüências previsíveis de sinais ambientais, como variações de temperatura ou de oxigênio, para antecipar necessidades futuras e imediatamente se preparar para um novo cenário.
Os pesquisadores verificaram que as respostas da bactéria simulada em computador espelharam precisamente o comportamento real da Escherichia coli durante transições entre o ambiente externo e o trato gastrintestinal de mamíferos, sugerindo o comportamento antecipatório.
A E. coli também demonstrou capacidade de adaptação única em diversos novos ambientes, modificando-se para a sobrevivência em apenas centenas de gerações, no lugar de milhares, como se achava até agora.
"O estudo fornece evidências de comportamento antecipatório por meio da revelação de relações notáveis entre as respostas transcricionais da E. coli com perturbações na temperatura e em oxigênio", destacaram os autores. "Essas relações internas refletem um real paradigma de aprendizado associativo, uma vez que mostram rápidas alterações internas após exposição a novos ambientes."
Segundo a Science, as descobertas promovidas pela pesquisa destacam a necessidade de se reavaliar as interpretações de respostas a estímulos ambientais observadas em todos os organismos.
O artigo Anticipatory behavior within microbial genetic networks, de Ilias Tagkopoulos e outros em www.sciencemag.org.

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Para a preservação da água

Agência FAPESP – A Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) e a Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomércio) publicaram a cartilha O uso racional da água no comércio, que está disponível para livre consulta na internet.
A publicação traz informações para ajudar no combate ao desperdício da água. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), cada pessoa necessita de cerca de 110 litros de água por dia para atender suas necessidades de consumo e higiene, sendo que no Brasil esse consumo quase dobra: 200 litros por pessoa.
O livreto é dividido em categorias como “Dicas de economia”, “Soluções ambientais”, “Caixa d’água”, “Recebimento de esgotos não domésticos”, “Medição individualizada”, “Como calcular o seu consumo” e “Entenda a sua conta de água”.
Um dos pontos destacados pela obra é o fato de que combater o desperdício e dar o destino correto à água deixaram de ser questões econômicas, passando a também ser um diferencial competitivo para as empresas modernas.
Nesse propósito, a cartilha aponta que, para atender empresas que buscam utilizar melhor a água em seus processos, reduzir custos e preservar o meio ambiente, a Sabesp lançou o Programa Sabesp Soluções Ambientais e o Programa de Uso Racional da Água (Pura) para o incentivo ao consumo consciente por meio de ações tecnológicas e mudanças culturais.
A cartilha está disponível em: www.sabesp.com.br

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Poeira do deserto faz chover na floresta

Por Fábio de Castro

Agência FAPESP – A poeira do deserto do Saara, na África, tem uma influência importante no regime de chuvas da Amazônia. A afirmação, que pode parecer inusitada à primeira vista, foi comprovada em um estudo realizado por um grupo internacional de pesquisadores – com participação brasileira –, publicado na revista Nature Geoscience.
De acordo com Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e um dos autores do trabalho, o objetivo foi realizar, pela primeira vez em uma região tropical do planeta, medidas de aerossóis conhecidos como núcleos de condensação de gelo – partículas que têm a propriedade de formar nuvens convectivas, influenciando a precipitação, a dinâmica das nuvens e a quantidade de entrada e saída de radiação solar.
“As nuvens convectivas na Amazônia, que ficam entre 12 e 15 quilômetros de altitude, têm suas gotas congeladas. Para que possam aparecer partículas de gelo nessas nuvens é preciso existir os núcleos de condensação de gelo. Pela primeira vez medimos as propriedades físico-químicas desses núcleos”, disse à Agência FAPESP.
Segundo Artaxo, ao fazer as medidas, o grupo descobriu que a vegetação da própria Amazônia e a poeira proveniente do Saara são as duas principais fontes dos núcleos de condensação de gelo.
“A importância disso é que a maior parte da chuva na Amazônia é proveniente das nuvens convectivas. E é a primeira vez que detectamos essas partículas. Identificamos como núcleos de gelo e medimos suas propriedades físicas, químicas e biológicas”, disse o também coordenador do Programa de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia (LBA) e ex-coordenador da área de geociências da FAPESP.
Para realizar o estudo, o grupo utilizou modelos matemáticos que simulam o comportamento das nuvens de gelo em condições amazônicas. “A parte surpreendente é que a poeira do Saara é responsável por uma fração significativa dos núcleos de condensação de gelo da Amazônia, especialmente em altas altitudes e temperaturas mais baixas”, explicou.
Segundo Artaxo, o estudo sugere que a contribuição das partículas biológicas locais para a formação de núcleos de gelo aumenta em altas temperaturas atmosféricas – com altitude mais baixa –, enquanto a contribuição por partículas de poeira cresce nas baixas temperaturas das regiões mais altas.
“Descobrimos que a vegetação da própria floresta alimenta os núcleos em altitudes que vão até 8 ou 9 quilômetros. Enquanto isso, a poeira do Saara nessa época do ano – o estudo foi feito entre fevereiro e março – predomina em altitudes acima de 9 ou 10 quilômetros”, disse.
As análises apontaram que os núcleos são compostos principalmente de materiais carbônicos e poeira. “Mostramos que as partículas biológicas dominam a fração carbônica, enquanto a importação da poeira do Saara explica o aparecimento intermitente de núcleos contendo poeira”, contou.
A poeira do deserto africano, segundo Artaxo, é um fenômeno atmosférico sazonal cujo pico se dá entre março e o fim de abril. “É um fenômeno de transporte atmosférico de longa distância que já conhecíamos. Mas nunca tínhamos medido as propriedades de nucleação dessas partículas.”

Continuidade em Temático

Na primeira fase do estudo a equipe utilizou um equipamento supercongelador para esfriar as partículas a 50 graus negativos e lançá-las na Floresta Amazônica, a fim de fabricar cristais de gelo.
“A partir daí, analisamos as propriedades físicas, químicas e biológicas desses cristais, utilizando técnicas analíticas nucleares – especificamente o método Pixe, disponível no Instituto de Física da USP. Pudemos analisar a concentração de alumínio, silício, titânio e ferro nas partículas”, disse.
A partir da análise, os pesquisadores descobriram que a assinatura elementar das partículas correspondia à assinatura da poeira do deserto do Saara. O segundo passo foi descobrir como essas partículas saem da África e chegam à Amazônia.
“Para isso rodamos modelos de circulação global da atmosfera e mostramos que, efetivamente, quando estavam presentes as concentrações de alumínio, silício, titânio e ferro que correspondiam à poeira do Saara, o modelo confirmava essa circulação”, afirmou.
Com a pesquisa, o grupo concluiu que a concentração e a abundância de núcleos de condensação de gelo na Amazônia podem ser explicadas, em sua quase totalidade, por emissões locais de partículas biológicas complementadas pela importação da poeira saariana.
Segundo Artaxo, os estudos terão continuidade dentro de um Projeto Temático apoiado pela FAPESP no âmbito do Programa FAPESP sobre Pesquisa Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG). “Faremos novos estudos dentro desse Temático que acaba de ser aprovado. Tentaremos simular e medir como se dá a variabilidade sazonal dos núcleos de condensação de gelo sobre a Amazônia”, destacou.
Além de Artaxo, participaram do estudo Markus Petters, Sonia Kreidenweis e Colette Heald, do Departamento de Ciências Atmosféricas da Universidade Estadual do Colorado (Estados Unidos), Scot Martin, da Escola de Engenharia e Ciências Aplicadas da Universidade de Harvard (Estados Unidos), e Rebecca Garland, Adam Wollny e Ulrich Pöschl, do Departamento de Biogeoquímica do Instituto de Química Max Planck (Alemanha).
O artigo Relative roles of biogenic emissions and Saharan dust as ice nuclei in the amazon Basin, de Ulrich Pöschl e outros, estão publicado na Nature Geosciences, e podem ser lidos em www.nature.com/ngeo

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

DIA 10 DE JUNHO NA TAILÂNDIA

Tudo isto é fado!

José Gomes Martins

Um dia antes do dia 10 de Junho zarpei de Banguecoque em direcção a Kanchanaburi, onde durante um ano me quedo, várias vezes, para carregar as baterias junto à margem da bonançosa corrente do Rio Kwai, na popular estância turística “Jolly Frog” (Júlia Rã).
-
Ontem, pela manhã peregrinei prestar homenagem, junto de sua imponente estátua o Rei Narasuen, erigida entre imensos lameiros onde se produz muito arroz ,cujo monarca siamês, contribuiu, para a continuação da independência do Reino do Sião, desde o século XVI até aos dias de hoje.
-
Uns quinze dias antes recebi da Embaixada de Portugal, pelo correio, um convite para assistir, em companhia de minha família, integrada na celebração do Dia 10 de Junho, à exibição da fadista portuguesa Carminho, no auditório pequeno, do “Thailand Cultural Centre”.
-
Ignorei o convite e não vou apontar aqui as razões de minha atitude.
-
Todos os dias em minha casa se celebra o Dia 10 de Junho, onde no espaço onde trabalho, diariamente a escrever, estão lá várias bandeiras das cinco quinas.
-
E de quando há celebrações especiais na Tailândia, minha mulher, tailandesa, coloca três bandeiras, a oficial, a de S.M. o Rei e a das Quinas, num suporte fixado no muro que divide o espaço da casa com a rua.
-
Os meus vizinhos de há mais 20 anos, sabem que ali, além de ser a Tailândia também é Portugal. Na minha casa, nos arredores de Banguecoque, todos os dias é Portugal!
-
E mais ainda em todas as casas dos meia dúzia de portugueses, que aqui se fixaram e fizeram vida, constituíram família, há uma bandeira de Portugal juntinha à da Tailândia. Conheço um, que numa das janelas, do segundo andar, de sua casa há uma e outra da Tailândia de dois panos cada.
-
Hoje quinta feira um dia depois do Dia 10 de Junho, pelas 6 da manhã, dou uma vista de olhos aos e-mails e outra a certos blogues, onde se incluiu o do Miguel Castelo Branco, http://combustoes.blogspot.com a noticiar, em parangona, “10 de Junho quer dizer futuro” .
-
Era mais nem nem menos à celebração do Dia 10 de Junho, de Portugal, de Camões, da Raça e das Comunidades Portuguesas, na Embaixada de Portugal em Banguecoque, pelos Embaixadores de Portugal, Maria da Piedade e António de Faria e Maya.
-
Porém o Miguel, na sua peça descreve os apelidos de nomes portugueses, de outras eras, os Siqueira, Costas, Antunes e Pereira. E, ainda, a emoção dos luso-descendentes ao ouvirem o discurso do Embaixador de Faria e Maya.
-
Não sei nem faço ideia qual teria sido a gente de nossas raízes que ensoparam lenços com lágrimas porque o Miguel só se refere aos antigos e não aos actuais que hoje vivem na Tailândia, ordeiramente e têm contribuído para o desenvolvimento deste Reino e dar a continuação do nome de Portugal.
-
O Miguel saboreou bacalhau que fazia parte da ementa do jantar que os representantes de Portugal ofereceram, aos seus convidados, de luxo, na residência, que já não “trincava” há dois anos.
-
Parabéns ao Miguel que depois de um “pobre” do fiel amigo tirou a barriga de misérias e mais notável no “Dia 10 de Junho”!
-
Não poderia ficar aqui ignorado os “miminhos” que vai oferecendo à nossa Embaixatriz Maria da Piedade de Faria e Maya, que só falta colocá-la no topo do pau-de-bandeira que se encontra no jardim da Residência.
-
Pelas fotografias apostas pelo Miguel na peça que escreveu, vimos de facto uma mesa farta e por mais estranho que possa parecer não vimos ali, ninguém, da comunidade portuguesa residente na Tailândia, que sempre haja estado nesta especial celebração onde gostariam, (sem ser sentados à mesa do -embaixador) beber um copo de vinho e comer uma mastiga.
-
Evidentemente que os embaixadores de Portugal sentam à sua mesa as pessoas que muito bem entenderem, mas no Dia de Portugal oferecer (ao que me parece) apenas fado, sem um copo e uma mastiga, aos portugueses residentes na Tailândia não se coordena muito bem e apetece-me dizer: “Tudo Isto é o Fado a que, infelizmente, os portugueses estão sujeitos, não só na Tailândia como em, alguns, outros países onde foram acolhidos, onde não há o mínimo respeito por eles e substituídos, por outros que nada têm a ver com Portugal".
-
Quanto ao Miguel Castelo Branco vejo-o como um desesperado que tudo faz em procura das "graças do senhor" para se manter em Banguecoque (ele diz.... que estuda arduamente!) , com a concessão e da continuação do subsidio mensal da Fundação Calouste Gulbenkian, coisa rara, e que a outros que já muito aqui fizeram em prol da história, de Portugal e a Tailândia, nunca tiveram meio tostão furado.
-
O Miguel continua anunciar festas deitando os foguetes, a tocar a música para se promover um “herói de nada”.

Para finalizar (como o diria o Carlos Castro, no programa da Praça da Alegria”) aqui vai a “laranja amarga” para os Embaixadores de Portugal na Tailândia, pelo facto de oferecerem (não sei quantos estiveram no espectáculo da Carminho) fado aos portugueses no Dia 10 de Junho e não o convívio, no jardim, na arcada, e oferecer-lhe um copo e uma mastiga.

José Martins
-
P.S. O autor serviu Portugal durante 24 anos, na Representação Diplomática em Banguecoque, tem 74 anos, reformado e nunca procurou enaltecer-se com “mimos” (hipócritas) seja a quem fosse para atingir objectivos.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Dinossauro venenoso

Agência FAPESP – Um grupo de cientistas chineses e norte-americanos descobriu um dinossauro venenoso, com aparência de ave, que viveu há cerca de 128 milhões de anos onde hoje está a China.
Trata-se da primeira descrição de veneno na linhagem que deu origem às aves modernas. O estudo será publicado no site e na edição impressa da revista Proceedings of the National Academy of Sciences
“Podemos dizer que esse animal era uma ave venenosa. É um achado que certamente terá um grande impacto”, afirmou Larry Martin, professor da Universidade do Kansas e curador do Museu de História Natural e Instituto de Biodiversidade, um dos autores da pesquisa.
O animal descrito, Sinornithosaurus (“ave-lagarto da China”), é um parente próximo do velocirraptor. Viveu em florestas no nordeste da China que continham grande variedade de animais, incluindo outros dinossauros e aves primitivas.
“Tinha o tamanho aproximado de um peru atual e, muito provavelmente, tinha penas. Foi um predador especializado de aves e dinossauros de pequeno tamanho. Era um parente muito próximo do microrraptor, que tinha asas e planava”, explicou Martin.
Segundo o cientista, o veneno não era letal, mas colocava rapidamente a vítima em choque, diminuindo as chances de retaliação ao ataque, de fuga ou de ser devorado por outros predadores. Em pouco tempo o Sinornithosaurus devorava sua presa.
“As vítimas eram atacadas de surpresa. Ele se escondia em uma árvore, por exemplo, e dava o bote por trás. O objetivo era posicionar as mandíbulas. Uma vez que os dentes estavam na pele da presa, o veneno penetrava na ferida, saindo de glândulas e escorrendo pelos dentes. A vítima entrava em choque e observava o predador em ação enquanto era devorada, sem poder reagir”, disse Martin.
O Sinornithosaurus tinha pelo menos duas espécies que, segundo o estudo, empregavam um sistema de veneno semelhante ao de alguns lagartos modernos, como os do gênero Heloderma. Mas tinha dentes mais longos, eficientes para passar pelas camadas de penas de suas vítimas, no caso das aves.
O artigo The birdlike raptor Sinornithosaurus was venomous, de Larry D. Martin e outros, poderá ser lido em www.pnas.org/cgi/doi/10.1073/pnas.0912360107.

Carta Aberta a Humberto Nuno de Oliveira

Caro Camarada,

Conheci-te, pela primeira vez, meu velho amigo e muito querido camarada, isso no já distante ano de 1983. E não foi por acaso e ao dobrar de uma qualquer esquina. Foi no Campo Militar de São Jorge, no local exacto onde, em 1383, se travou a sempre para nós, portugueses, memorável Batalha de Aljubarrota. Nesse referido ano de 1983 comemorava-se (e que inesquecível e espectacular comemoração foi aquela junto ao Mosteiro da Batalha, recordas-te, Humberto?) os 600 anos de tal gloriosa efeméride. E, Humberto, que melhor local, no mundo, para nos termos conhecido, que não fosse Aljubarrota? Estava escrito nas estrelas que assim tinha que ser. E foi.
Pouco interessa, neste contexto em que eu te escrevo esta missiva, se eu votei em ti ou não, isso nas eleições do passado domingo, dia 7 de Junho de 2009, para o Parlamento Europeu. O que eu quero e realmente me importa deixar aqui registado – passado que foi a realização das ditas eleições – é que me agradou bastante a tua intervenção política nas mesmas; o teu enorme portuguesismo; a tua coragem e coerência; a tua fidelidade a Portugal; a tua superior inteligência na abordagem das questões lançadas por ti na tua campanha; o teu à-vontade no trato das respostas (e da RESPOSTA pronta) às perguntas que os jornalistas te colocaram e, sobretudo, à inesperada surpresa que tu causas-te entre os ditos nas entrevistas que tu lhes destes nas rádios e nas televisões.
Na verdade eles estavam à espera de uma qualquer criatura mais ou menos boçal que, logo às perguntas mais banais ou matreiramente urdidas, se espalhasse ao comprido, como se costuma dizer. Talvez esperassem (para eles era o ideal, não era?) um “brutamontes” de um “Skinhead” (1)? Porém (e que grande desilusão eles sofreram!), tu não foste nada disso, já que tu não és nada disso. Independentemente daquilo que eu possa pensar acerca do PNR, tu foste absolutamente brilhante. Independentemente de eu achar que o PNR não te merece lá ter (e esta minha afirmação é meramente pessoal, é evidente), muito obrigado Humberto Nuno de Oliveira. Assim como, um dia, nos conhecemos em Aljubarrota e porque isso estava escrito, estava também já escrito que eu, passados estes 26 anos (como o tempo passa, não é?), te tinha que te escrever estas palavras.


António José dos Santos Silva

sábado, 19 de dezembro de 2009

Diferenças e diversidade

Agência FAPESP – Mais finos ou mais grossos, pouco ou muito. Há muitas variações com relação às características dos pelos humanos. Mas há diferenças ainda maiores entre os pelos do homem e os de um chimpanzé, seu parente mais próximo.
Os genes que fazem com que uma espécie seja diferente da outra são os mesmos responsáveis pela diversidade observada na própria espécie? Essa é uma questão que há muito os cientistas tentam responder.
Um novo estudo, publicado na revista Science, indica que a resposta é sim. Os genes da diversidade são os mesmos, seja entre espécies ou dentro delas, pelo menos em alguns casos.
A pesquisa, feita por Patricia Wittkopp, do Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, e colega, indica uma origem genética para as diferenças em pigmentação entre duas espécies próximas de insetos. Os mesmos genes atuam na determinação de cores diferentes dentro de cada uma das espécies.
Os cientistas analisaram os mecanismos genéticos que definem a pigmentação em duas espécies de drosófilas, a Drosophila americana, que tem cor marrom escuro, e a Drosophila novamexicana, que é amarelo claro.
“Inicialmente procuramos identificar que partes dos genomas contribuíam para as diferenças de pigmentação entre as espécies. O mapeamento genético nos levou a duas regiões que contêm genes envolvidos na pigmentação”, disse Patricia.
Em seguida, o grupo focou em um gene específico, conhecido como “bronze”, e mapeou novamente os genomas, verificando que mudanças evolucionárias nesse gene – e não em outro na mesma região – contribuíram para as diferenças de pigmentação.
Os pesquisadores transferiram cópias do gene “bronze” da espécie amarela para moscas de outra espécie diferente (Drosophila melanogaster) e, depois, fizeram o mesmo com o gene “bronze” da espécie marrom. “A única diferença entre os dois grupos de moscas modificadas foi o gene transferido. E essa diferença foi suficiente para resultar em variação na pigmentação”, disse Patricia.
Em seguida, os pesquisadores investigaram as diferenças de tonalidade em indivíduos da espécie Drosophila americana – alguns são bem mais escuros do que os outros.
Por meio de mapeamento genético, o grupo encontrou evidência de que o gene “bronze” também contribuía para variação de cores entre indivíduos da espécie marrom.
Na sequência do estudo, os pesquisadores pretendem determinar quais são as mudanças genéticas dentro do gene responsáveis pelas diferenças de pigmentação. Segundo eles, embora o trabalho tenha se centrado em moscas-de-frutas, poderá levar a um melhor entendimento dos padrões de variação na natureza.
“Trata-se de um modelo, mas quando verificamos os mecanismos básicos da herança – como informações são passadas de uma geração a outra – o processo é essencialmente o mesmo em todos os seres vivos. Mutações que contribuem tanto para variações dentro das espécies como entre espécies podem ser uma fonte comum de mudanças evolucionárias”, disse Patricia.
O artigo Intraspecific polymorphism to interspecific divergence: genetics of pigmentation in drosophila, de Patricia Wittkopp e outros, pode ser lido na Science em www.sciencemag.org.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

DIA DE PORTUGAL

Dia de Camões e das Comunidades Portuguesas

De celebração em celebração vamos empacotando os símbolos vivos da nação, na banalidade da rotina factual comemorativa, como se tratasse de sardinhas embrulhadas em folhas de jornal. Festa de desobriga com golfadas de incenso para o corpo moribundo da nação.

A 10 de Junho de 1580 morre Luís de Camões, o Homem que cantou o alvorecer e expandir de Portugal. Camões conseguiu, na sua incomparável epopeia “Os Lusíadas”, imortalizar o espírito português. “Os Lusíadas” tornaram-se o livro da identidade portuguesa. Identidade esta, com o tempo desbotada pelo sol desgastante da ideologia e pelas ondas enleantes das revoluções.

Os descendentes dos Homens-bons afirmam que, à morte de Camões, Portugal também morreu. Seguramente, uma afirmação certa no que respeita à classe política dos governantes de Portugal. Esta já não entende Camões nem entende a alma portuguesa, hoje residindo no borralho das cinzas do povo. Um governo “fraco torna fraca a forte gente…” escrevia aquele visionário que ao morrer terá dito "Morro com a Pátria"!

Não, Portugal não morreu. Só morrerá quando deixar de possuir aquilo que o criou, ergueu e tornou específico: a fé. A grandeza de Portugal foi construída à sombra do cristianismo. O povo assumiu a missão cristã tornando-a sua. Pátria e fé eram uma coisa só. O povo sabia conjugar o “ heróico” com o “imortal”. Assim, os portugueses descobrem o mundo como missionários da pátria. Com o andar dos tempos perdeu-se o povo e com ele a pátria também. Agora, dela pouco mais resta do que massas à deriva e um Estado de abutres que voam sobre elas.

A obra à nossa frente não é menos grandiosa do que a dos descobrimentos. Já não chega uma restauração, é necessário uma nova descoberta. Hoje, os Homens Bons” terão de se deitar à missão de, primeiro, descobrir o povo e a pátria, na redescoberta do novo cristianismo.

Para ressurgir terá de descobrir “mares nunca antes navegados”. Terá de ultrapassar a “Taprobana” do materialismo institucional estatal e religioso. Terá de, como os nossos “egrégios avós”, possuir a coragem de se lançar no fluxo da vida, arriscar e ousar “pecar corajosamente” para abandonar as certezas dos “Velhos do Restelo” que, agarrados às velhas ideologias materialistas, fizeram o 25 de Abril, embrulhando, com elas, um povo inteiro. Filhos da escrava, da russa Agar, da gálica Libertas, continuam a enxovalhar, inconscientes, a grei.

Portugal, desembrulhado, voltará a descobrir-se povo e então redescobrirá a missão que o levará à vitória sobre o nevoeiro estranho que embacia o cérebro das nossas elites e tolhe a vida moura do país.

Então, alijará as formas mecanicistas do seu pensar para poder proporcionar o salto quântico da nova física, a nova consciência. Uma nova mundivisão, surgida já não de revoluções de interesses oportunos e subjugadores mas dum impulso genuíno de verdade, dum desejo de liberdade criadora e universal.

Não teremos a ajuda dum infante D. Henrique que concatenou então saber e engenho e energia universal. Seremos ajudados por um processo paulatino desformatizador das formas do medo, do ganho, da avidez e do poder. O sofrimento e o desespero duma natureza cada vez mais atrofiada despertar-nos-á para uma nova criatividade, um novo pensar. Então sonho e realidade serão as formas do mesmo pensar. Então seremos tão livres que não saberemos onde a liberdade começa nem acaba. Então navegaremos à tona do mar como se esta fosse o seu fundo! Descobriremos no céu do horizonte novos mundos com caminhos diferentes. Nesse mundo da nova consciência a dignidade já não é apenas humana, passa a ser natural!

No novo mar português, o Povo já não descobre; ele pode criar porque a nova cultura já não é poder nem ter, mas sim relação.

Até lá vamos rasgando a cobertura das ideologias do céu português. Das aberturas surgirão novas auroras e do céu baixarão as cores do arco-íris. Então todas as relações e ligações serão libertadoras e benditas porque, entre uns e outros, deixará de haver muros, para nos delimitar chegarão apenas as cores do arco-íris.

António da Cunha Duarte Justo

Plasticidade comprometida

Por Fábio de Castro

Agência FAPESP – Ao estudar células nervosas em moscas-das-frutas (Drosophila melanogaster), cientistas norte-americanos descobriram uma nova função para um gene cujo equivalente em humanos tem um papel fundamental na esquizofrenia.
Os pesquisadores da Universidade da Califórnia em São Francisco (UCSF), nos Estados Unidos, já sabiam que a forma mutante do gene humano – um dos três consistentemente associados à esquizofrenia – interrompe levemente a transmissão de sinais químicos entre as células nervosas do cérebro.
O estudo, publicado na revista Science, tem foco em genes envolvidos na chamada “plasticidade adaptativa” – a capacidade das células nervosas em compensar uma ampla gama de perturbações e permanecer funcionando normalmente.
Pesquisas feitas com diversas espécies – de moscas-das-frutas até humanos – mostraram que, se uma célula nervosa for funcionalmente comprometida, as células vizinhas podem compensar o prejuízo e restaurar a comunicação normal entre células. Esse tipo de plasticidade adaptativa estabiliza as funções cerebrais, mas as moléculas envolvidas no processo ainda permanecem desconhecidas.
A equipe coordenada por Graeme Davis, chefe do Departamento de Bioquímica e Biofísica da UCSF, realizou testes de triagem com 276 genes mutantes, ou “desligados”, a fim de determinar se sua ausência teria algum papel na plasticidade adaptativa do sistema nervoso das moscas-das-frutas.
Ao contrário do que ocorreu com a maior parte dos genes, a ausência do gene conhecido como disbindina teve grande impacto na plasticidade adaptativa. “A mutação do gene comprometeu completamente a capacidade dos circuitos neurais para responder a uma perturbação experimental – isto é, para ser adaptável”, disse Davis.
Segundo ele, a mutação da disbindina foi uma das poucas mutações genéticas a causar tal efeito. “A função singular do gene sugere que o prejuízo à plasticidade adaptativa pode ter uma particular relevância para a causa ou progressão da esquizofrenia”, afirmou.
A esquizofrenia geralmente se desenvolve no fim da adolescência ou no início da idade adulta. Segundo o estudo, é possível que as mudanças normais de desenvolvimento nessa fase da vida representem um esforço significativo para as funções neurais.
“Se isso realmente ocorre, a capacidade do sistema nervoso para responder a essas mudanças normais de desenvolvimento – que em certo sentido são perturbações – pode estar comprometida nas pessoas que se tornam esquizofrênicas”, disse Davis.
O próximo passo para as pesquisas consistirá em investigar se a ausência do gene disbindina provoca um bloqueio da plasticidade adaptativa em camundongos e se outros genes ligados à esquizofrenia causam efeito semelhante.
O estudo revelou, ainda, uma visão mais geral sobre os mecanismos de plasticidade adaptativa, pois foi possível descartar o envolvimento de inúmeros genes que haviam sido previamente considerados potenciais atores do processo.
“Testamos várias mutações que alteram a função neural. A maioria delas mostrou perfeita plasticidade adaptativa. Isso sugere que existem papéis distintos para os genes na sinapse: alguns apóiam a função neural normal, enquanto um pequeno subconjunto controla a plasticidade adaptativa”, disse.
O fenômeno da plasticidade adaptativa, segundo os autores, representa uma área emergente de investigação nas neurociências, reconhecida pela primeira vez há cerca de uma década. Os primeiros estudos de Davis – cientista pioneiro da área – mostraram que, quando os genes em funcionamento no sistema nervoso das moscas-das-frutas sofrem mutação, o sistema nervoso compensa a modificação e os animais parecem surpreendentemente normais.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

No rastro dos tubarões

Por Alex Sander Alcântara

Agência FAPESP – A partir da análise de fragmentos do DNA mitocondrial de barbatanas, um grupo norte-americano, com participação de pesquisador brasileiro, conseguiu reconhecer a região geográfica oceânica na qual tubarões-martelo da espécie Sphyrna lewini – globalmente explorada pela pesca – foram capturados.
O estudo analisou parte da sequência do DNA mitocondrial extraído de nadadeiras comercializadas. Um dos objetivos do trabalho, publicado na revista Endangered Species Reseaech, é propor a moratória ou a restrição da captura dessa espécie de tubarão-martelo, atualmente ameaçada de extinção devido à caça predatória e ao comércio ilegal de barbatanas.
As barbatanas alimentam um mercado clandestino, principalmente na Ásia, onde atingem alto valor comercial. A sopa de barbatana de tubarão é considerada pelos povos orientais uma iguaria, muito apreciada em cerimônias como casamentos e banquetes.
“Conseguimos associar todas as barbatanas analisadas a uma determinada área dentro dos oceanos, onde essa espécie de tubarão-martelo habita, com base na similaridade entre a composição genética das barbatanas e estoques genéticos dos indivíduos dessas águas”, disse Danillo Pinhal, doutorando no Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (UNESP), em Botucatu, à Agência FAPESP.
A pesquisa foi coordenada por Demian Chapman, da Universidade Stony Brook, em Nova York, e por Mahmood Shivji, diretor do Instituto de Pesquisa Guy Harvey, da Universidade Nova Southeastern, na Flórida, Estados Unidos.
Pinhal se integrou à equipe para desenvolver parte de seu doutorado, intitulado “Estrutura genético-populacional do tubarão-martelo Sphyrna lewini (Elasmobranchii: Sphyrnidae) utilizando marcadores moleculares de microssatélites”, que tem apoio da FAPESP na forma de bolsa. O projeto se insere no âmbito de um Auxílio à Pesquisa, coordenado pelo professor Cesar Martins, do Instituto de Biociências da Unesp.
Segundo Pinhal, o objetivo da pesquisa de doutoramento é entender a dinâmica populacional da espécie Sphyrna lewini ainda mais detalhadamente, ao longo da costa brasileira.
“Realizo uma análise em fina escala comparando um grande número de indivíduos oriundos de múltiplas localidades, na costa do Brasil. Também utilizo amostras do Caribe e do Golfo do México e marcadores genéticos microssatélites, além do DNA mitocondrial, para estabelecer uma comparação da composição genética dos animais ao longo da costa brasileira em relação a essas áreas e melhor avaliar a evolução contemporânea da espécie”, explicou.
Além das barbatanas, o estudo também comparou o DNA de 177 amostras de indivíduos selvagens de S. lewini do Atlântico e determinou a variabilidade genética dos estoques existentes.
Pelas análises foi possível identificar três estoques distintos no Atlântico Ocidental, compreendendo a parte norte do Atlântico (Estados Unidos e Golfo do México), a parte central (Mar do Caribe) e o Atlântico Sul, que englobaria todo o litoral brasileiro.
Uma das possíveis explicações para a diferenciação genética dentro de uma mesma área se daria pela existência dos berçários ao longo da costa, constituída de águas rasas, calmas e ricas em alimento.
“As fêmeas escolhem essas áreas porque há segregação entre neonatos e adultos machos que ali não habitam e assim, não predam seus próprios filhotes, uma das estratégias da espécie”, disse.
A alta fidelidade de as fêmeas ao local de nascimento seria outro motivo para explicar a presença de estoques distintos da espécie no Atlântico Ocidental. “Não só verificamos que a tendência de filopatria, ou seja, a chance das fêmeas retornarem ao local de nascimento, para ter os filhotes é muito maior do que se pensava, como percebemos que há uma grande diferenciação entre populações de pontos relativamente próximos”, apontou.
Segundo ele, essas características seriam responsáveis pela diferenciação genética nessas áreas. Além disso, a continuidade da pesquisa de doutorado busca também entender melhor a movimentação dos machos.
“Mostramos que existe diferenciação entre as populações do tubarão-martelo S. lewini não somente entre os oceanos, como já havia sido publicado, mas também em menor escala, entre áreas relativamente próximas. Observamos que dentro de um mesmo oceano, no caso o Atlântico, se encontram populações geneticamente bastante distintas”, disse Pinhal.
Ameaça
O estudo destaca que as espécies de tubarão-martelo são alvo da pesca predatória. As barbatanas chegam a custar de 20 a 30 vezes do mais que o quilo da carne do animal. Hong Kong é o principal comércio mundial de barbatanas, mas a prática está disseminada em todo o mundo.
“O problema é a falta de fiscalização da pesca e do comércio do pescado. Os pescadores empregam o finning, método em que o animal é capturado e, depois de cortadas as barbatanas, é jogado no mar ainda vivo. Como não consegue mais nadar, agoniza até a morte”, contou Pinhal.
No artigo publicado, os pesquisadores concluíram, a partir da análise da região controle do DNA mitocondrial (mtCR), que 21% das barbatanas analisadas eram provenientes do Atlântico Ocidental, região onde o tubarão-martelo já entrou na lista de espécies consideradas “em perigo”, segundo a União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN). De acordo com o biólogo, é a primeira vez que um estudo conseguiu determinar a origem geográfica de barbatanas utilizando o DNA.
De acordo com diversas pesquisas, o declínio global do tubarão-martelo já o coloca como uma espécie em perigo de extinção. “Na costa brasileira, como temos verificado que há falta de peixes, os pescadores têm capturado e aproveitado também a carne. Podemos dizer que a prática do finning caminha para não ocorrer mais, porque estão tentando aproveitar tudo em função da queda nas pescarias tradicionais, ou seja, de outras espécies que eram comumente comercializadas”, disse Pinhal.
Segundo ele, as análises de DNA estão contribuindo significativamente para o conhecimento acerca da distribuição e da saúde das populações de espécies marinhas criticamente ameaçadas.
“Os tubarões são particularmente sensíveis à exploração excessiva em função de apresentarem crescimento lento, maturidade sexual tardia e baixa fecundidade relativa, características biológicas que os aproximam dos mamíferos”, destacou.
O pesquisador ressalta que o trabalho tem como meta fornecer mecanismos que possibilitem a adoção de medidas para o adequado manejo e conservação dessas espécies de peixes.
O grupo pretende utilizar dados publicados no artigo para propor medidas de proteção na Convention on Internacional Trade in Endangered Species, que será realizada em março de 2010 no Qatar.
O artigo Tracking the fin trade: genetic stock identification in western Atlantic scalloped hammerhead sharks Sphyrna lewini, de Demian D. Chapman, Danillo Pinhal e Mahmood S. Shivji, pode ser lido em www.int-res.com/abstracts/esr/forensic/pp9.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Quatro planetas são descobertos

Agência FAPESP – Um grupo internacional de caçadores de planetas acaba de descobrir quatro novos desses corpos celestes em órbita de duas estrelas relativamente próximas e que são muito parecidas com o Sol.
Os planetas foram encontrados por astrônomos australianos, britânicos e norte-americanos, com a ajuda dos telescópios Anglo-Australiano e Keck, localizados respectivamente na Austrália e no Havaí. O anúncio foi feito no passado dia 13 de Dezembro.
O grupo não observou os planetas diretamente, tendo usado para a detecção o efeito Doppler, que mede como os planetas são atraídos pela gravidade das estrelas dos sistemas de que fazem parte.
Dos planetas descobertos, três orbitam a estrela 61 Virginis, que é praticamente uma gêmea do Sol, tamanha a semelhança entre as estrelas. As massas dos planetas variam de 5,3 a 24,9 vezes a massa da Terra.
“Esses planetas são especialmente instigantes. Estão próximos, em tamanho, à Netuno, que tem 17 vezes a massa da Terra. Aparentemente, há muitas estrelas parecidas com o Sol que contam com planetas dessa massa ou menor. Isso indica um caminho para descobrirmos planetas menores que podem ser rochosos e com condições favoráveis ao suporte da vida”, disse Chris Tinney, da Universidade de New South Wales, na Austrália, um dos autores do estudo que será publicado em breve no Astrophysical Journal.
A 61 Virginis pode ser vista da Terra a olho nu. Ela se encontra a 28 anos-luz da Terra na constelação de Virgem, que, nesse período do ano pode ser observada algumas horas antes do nascer do Sol.
O quarto planeta descoberto é bem maior, com massa semelhante à de Júpiter, e orbita a estrela 23 Librae, também parecida com o Sol. A estrela está a 84 anos-luz da Terra na constelação de Libra. É o segundo planeta observado nessa constelação, após o primeiro em 2006. O novo planeta tem uma órbita de 14 anos, um pouco maior do que a de Júpiter, que é de 12 anos.
“O que detectamos nesse sistema estelas é muito parecido com o que encontraríamos em nosso Sistema Solar se o estivéssemos observando a distância”, disse Simon O’Toole, do Observatório Anglo-Australiano, outro autor da descoberta.
Outro ponto destacado pelos pesquisadores é a colaboração entre equipes e instrumentos, com o uso conjunto, no caso, de dois potentes telescópios. “Com essa colaboração, teremos uma excelente chance de identificar, nos próximos anos, planetas potencialmente habitáveis em órbita de estrelas próximas”, disse Paul Butler, do Instituto Carnegie, em Washington, outro autor do estudo.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Mais quente e seco

Agência FAPESP – Dados preliminares do projeto Mudanças Climáticas Impactantes no Brasil, colaboração entre o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e o Met Office Hadley Centre, do Reino Unido, indicam que o aquecimento global e desmatamentos podem causar grande impacto na floresta amazônica e também afetar o clima local e regional.
Além disso, de acordo com o Inpe, reforçando conclusões de estudos anteriores, a pesquisa aponta que o desmatamento em grande escala poderá tornar o clima mais quente e seco.
Se mais de 40% da extensão original da floresta amazônica for desmatada, pode significar a diminuição drástica da chuva na Amazônia Oriental. Esse percentual, ou aquecimento global entre 3°C e 4°C, representaria o tipping point, ou seja, o ponto a partir do qual parte da floresta corre o risco de entrar em colapso.
O projeto foi apresentado durante evento do Met Office na 15ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP15), em Copenhague.
O estudo foi desenvolvido a partir de modelos climáticos do Inpe e do centro britânico, que indicam um aquecimento maior nas regiões tropicais amazônicas em relação ao aumento médio de temperatura projetado para as áreas continentais do planeta.
Outro resultado importante é a tendência de tropicalização do clima em parte do Brasil, com duas estações ao ano. Nesse cenário, a primavera pode se tornar tão ou mais quente que o verão em algumas regiões hoje de clima subtropical.
“Esses impactos são extremamente importantes porque reduções de precipitação nas bacias levarão à diminuição da geração de energia hidrelétrica. Os modelos mostram que concentrações mais baixas de dióxido de carbono na atmosfera causam menor aquecimento e, portanto, menos impactos nas chuvas e nos regimes de temperatura e de extremos de clima. Talvez para o Brasil a melhor opção de mitigação dos efeitos do aquecimento global seja reduzir o desmatamento tanto quanto possível”, disse José Antonio Marengo, coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Mudanças Climáticas do Inpe.
Também é importante ressaltar que os próprios impactos do desmatamento são maiores em condições de seca. Por conta disso, reduzir o desmatamento ajudaria a manter a floresta mais resistente num clima sob mudanças. Pelo Inpe participam do projeto os pesquisadores Carlos Nobre, Gilvan Sampaio, Luiz Salazar e Marengo.
Enquanto o modelo climático global do Hadley Centre é usado para projetar mudanças do clima em todo o mundo, o modelo climático regional do Inpe fornece maiores detalhes sobre o Brasil para níveis diferentes de aquecimento global.
Mais informações: www.inpe.br

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Nova Déli lança campanha para combater o ato de urinar em público, será que Portugal vai lançar uma campanha para combater os políticos corruptos...

A capital indiana vai sediar os jogos da Comunidade das Nações em 2010. E lançou uma campanha para combater o ato de urinar, cuspir e jogar lixo nas ruas que passam a poder ser punidos com multas.
Uma boa iniciativa que merecia ser também seguida em Portugal, com uma campanha para combater os políticos e gestores corruptos que se deixam comprar por caixas de peixe ou meia dúzia de euros embrulhados em papel de almaço...
Podia delimitar-se como útil urinar ou defecar publicamente em cima dos políticos corruptos, como forma de os notificar da imagem que tem para os portugueses.

O senhor Pinto continua sob suspeita publica

O maior dilema politico, e que virou autentico problema nacional relativamente a imagem e credibilidade do PM, é no momento o assunto das escutas telefônicas de conversas do senhor Pinto, com alguns amigos implicados em inúmeros casos de corrupção e outros crimes que tais.

A questão central não é se foi escutado, pois não existem cidadãos acima da lei... ou se não devia ter sido escutado..., pois ninguém obviamente está livre de ser escutado..., mas sim, a verdade sobre o assunto uma vez que já esta mais do que provado que o homem foi escutado, e também já esta alegadamente provado que não pescou nem comeu os robalos, mas quem sabe foi efetivamente convidado para o repasto... pelo menos da duvida ninguém o livra.

Na verdade o desconhecimento real, por parte dos portugueses, em termos de veracidade sobre o muito que se vai escutando por cada rua, esquina, repartição publica, café ou boteco, é que deixa o senhor Pinto sob constante e crescente suspeita publica, e aumento do descrédito na sua credibilidade e honorabilidade como pessoa publica, ainda mais com as responsabilidades nacionais que tem sobre as suas costas.

Os portugueses neste momento do campeonato, e perante o ponto da situação, e em especial do constante vazamento de informações sobre o assunto, tem o direito de saber o que realmente esta a acontecer, uma vez que o assunto por portas e travessas já se tornou do foro publico... e sendo boatos ou verídicos os episódios e as historias que correm, com o constante silencio, só podem agravar as duvidas na mente dos cidadãos, e aumentar o ruído exterior...


“João Massapina”

sábado, 5 de dezembro de 2009

UM CERTO ODOR SALAZARENTO

O que me provoca uma repulsa epidérmica neste processo (no sentido dialéctico do termo, não no sentido jurídico-burocrático) de «Face Oculta» são três coisas:
• Um ar certo de leviandade generalizada
• Um odor forte de ausência de profissionalismo
• Um toque fatal de moralismo provinciano
Confesso que a junção destes três ingredientes me parece uma amostra de um caldo de cultura do piorzinho que Portugal tem. Um compósito de resíduos inquisitoriais-pidescos com cheirete a salazarenta sacristia, tudo muito repelente e de má memória, insuportável e incompatível com a Democracia. Leviandade e incompetência profissionais pintadas por fora com umas tintas de moralismo são, de facto, um traço típico de um certo Portugal salazarento.
Confesso que não percebo o “moralismo”, vindo de quem vem, e muito menos entendo o ar de leviandade e falta de profissionalismo em pessoas e cargos a que tal não se pode admitir. Fica-se com a ideia de que os que têm como função e obrigação velar pelo Estado de Direito nem se preocupam já sequer com o direito de Estado e passaram no seu quotidiano a ignorá-lo. E tão evidente isso é que até Proença de Carvalho se permite, sob forma interrogativa, declinar o tema Agentes da lei fora da lei...
A confirmarem-se estes ares, odores e toques, então, o Estado português terá entrado em anomia e ter-se-á tornado disfuncional e contraproducente… E isso obriga cada português a tirar conclusões. E a primeira será, nesse cenário, que o Estado Português falha a única missão que o justifica e legitima e pela qual lhe pagamos: garantir a segurança e o bem-estar dos cidadãos. E, se o Estado falha, serão os próprios cidadãos a ter que assumir o essencial da sua segurança e do seu bem-estar… Para ter umas luzinhas sobre o império futuro (mas próximo) deste novo “sistema D”, leia-se John Robb que tem algumas pistas (“power to the people” e “resilient communities”) sobre o assunto.
Gostaria – confesso-o - que Robb estivesse totalmente enganado, na análise e nas propostas, mas quanto mais o leio e quanto mais observo o que se passa à minha volta mais dúvidas tenho sobre as possibilidades de realização deste meu desejo.
José Mateus Cavaco Silva

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Haverá asas brancas nas costas de Pinto Monteiro?

Vamos ver se nos entendemos: Fernando José Pinto Monteiro é procurador-geral da República desde Outubro de 2006 e a sua nomeação foi uma escolha pessoal do primeiro-ministro José Sócrates. Pinto Monteiro, coitado, não tem culpa disso - são as regras da pátria -, mas factos são factos: ele deve a José Sócrates o gabinete mais espaçoso no palacete da Procuradoria. Não foi o Parlamento que o pôs lá. Não foi o Presidente da República (formalismos à parte) que o pôs lá. Foi o Governo, foi este primeiro-ministro.
Implicação óbvia: nem por um momento Pinto Monteiro pode deixar transparecer que a sua independência possa estar em causa quando se trata de lidar com suspeitas que recaem sobre o primeiro-ministro. Mas é isso que tem transparecido. Pinto Monteiro teve azar, porque ninguém poderia imaginar que o percurso de Sócrates contivesse material capaz de animar cinco séries inteiras do CSI. Só que ele, como PGR, também não tem dado mostras do distanciamento que lhe seria exigido no caso "Face Oculta", em que, se não está a proteger o primeiro-ministro a todo o custo, está pelo menos a imitar muito bem.
Os golpes de cintura que Pinto Monteiro tem dado para impedir que se saiba o que quer que seja sobre as certidões emitidas pelo juiz de Aveiro são dignos de um malabarista do circo Chen. A coisa chegou a tal ponto que a própria associação dos juízes se viu obrigada a emitir um comunicado duríssimo, em que fala de uma "inexplicada divergência de valoração dos indícios que foi feita na comarca de Aveiro e pelo PGR", considerando que "os deveres de transparência e de informação impõem o esclarecimento daqueles equívocos", e que é "imperioso" que "se proceda à publicitação das decisões do PGR e do presidente do Supremo Tribunal de Justiça".
Os juízes têm toda a razão. Afinal, que argumentos apresentou até agora o procurador para mandar as certidões e as suspeitas sobre Sócrates para o baú? Zero. Pinto Monteiro disse: "Não há indícios probatórios" e esperou que todos acreditássemos. O procurador deu-nos a sua palavra e nada mais. Ora, diante de todas as notícias vindas a público, qualquer português que não viva à sombra do guarda-sol cor-de-rosa perguntar-se-á: e porque vou eu acreditar na palavra, e nada mais do que a palavra, de um homem que foi posto naquele lugar por José Sócrates?
As regras institucionais existem exactamente para não estarmos apenas dependentes da boa vontade e do carácter de determinados homens. Se fôssemos todos anjos, não precisaríamos de leis nem de edifícios jurídicos. Ora, até este momento, Pinto Monteiro limitou-se a apontar para as suas costas e a rezar para que o povo ali vislumbrasse um belo tufo de penas brancas. Eu, infelizmente, não vislumbro.

“João Miguel Tavares”

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Honduras: O jogo vai para a prorrogação

Ahora es esta la batalla
Pa’que vuelva Manuel Zelaya

E parece que vai ter de chegar aos pênaltis. O governo golpista de Roberto Micheletti resolveu não ceder nem mesmo diante do acordo que fez com o governo norte-americano. Para este, fica a escolha entre ter encenado um acordo para também ganhar tempo e favorecer os golpistas, ou não ter forças para enfrentar uma situação política que vai embaraçar – embaçar – toda sua relação com a América Latina e prejudicar sua posição perante sua oposição interna.
Dia 29 deverão se realizar as eleições gerais em Honduras. Quase toda a América Latina, do México à Argentina e ao Chile, está comprometida com o não reconhecimento dessas eleições promovidas sob a égide do golpe. O presidente (deposto, suspenso) Manuel Zelaya chamou o boicote às urnas. O candidato de esquerda Carlos Reyes retirou sua candidatura; outros cinco candidatos continuam inscritos, entre eles os favoritos Porfírio Lobo Sosa, do Partido Nacional, e Elvin Santos, do Partido Liberal.
A situação internacional tornou-se mais complicada. Para a presidência do Conselho da União Europeia elegeu-se no dia 19 de novembro o primeiro ministro belga, do Partido Democrata Cristão, Herman Van Rompuy. Ele assume no dia 1º de janeiro de 2010, mas desde já isso significa uma inclinação mais para a direita. Se nenhum país reconheceu o governo de Micheletti, é possível que alguns venham a fazê-lo depois da eleição. Um indício disso é a posição dos dois partidos que compõem o atual governo alemão. O governo de Berlim, seguindo os demais da União Européia, não reconheceu o governo golpista. Mas em compensação, informações na imprensa local dizem que a União Democrata Cristã, partido da chanceler Ângela Merkel, apoiaria o Partido Nacional, enquanto o FDP, do ministro de Relações Exteriores, Guido Westerwelle, apoiaria o Partido Liberal.
Ainda é impossível dizer o que acontecerá. Tudo vai depender do comparecimento às urnas, do desempenho das Forças Armadas, da possibilidade da Frente de Resistência contra o Golpe de Estado em Honduras, de que Carlos Reyes é líder, capitalizar o boicote. Certamente tudo vai depender também da até aqui mantida unidade de 99% dos governos da OEA contra os golpistas e contra a atitude complacente dos Estados Unidos. Quanto a este governo, a impressão que dá é a de não só estar enredado em suas contradições internas e confrontos externos (com o governo de Hugo Chávez, por exemplo), como a de estar disposto a sacrificar o futuro de suas relações na região por causa de suas lealdades do passado. Ou seja, o governo de Barck Obama pode estar muito bem dando um pequeno passo para o abismo em matéria de relações diplomáticas na América Latina enquanto olha no espelho retrovisor.
Quanto à direita latino-americana, esta almeja, evidentemente, o sucesso golpista.


Flávio Aguiar é correspondente internacional da Carta Maior.

sábado, 28 de novembro de 2009

A trajetória errante de Kurt Cobain

Dojival Filho
Do Diário do Grande ABC

No início da década de 1990, o universo pop exalava glamour e pretensão, com um abismo entre o grande público e as produções de caráter alternativo. Sob a liderança do vocalista, guitarrista e compositor Kurt Cobain (1967-1994), o Nirvana mudou definitivamente o panorama musical, com meia dúzia de acordes e versos que condenavam a alienação juvenil de maneira cáustica.
Registro da trajetória errática do cantor, o recém-lançado livro "Cobain dos Editores da Rolling Stone" que reúne entrevistas, resenhas e reportagens especiais publicadas na revista norte-americana.
FAMÍLIA - Filho de secretária e mecânico de automóveis, o músico nasceu em Hoquiam, no Estado de Washington. Aos 6 meses, mudou com a família para o município vizinho Aberdeen - cidade madeireira com altas taxas pluviométricas e elevados índices de suicídio.
Foi uma criança dotada de extrema sensibilidade, que gostava de cantar Beatles a plenos pulmões e reservava lugares à mesa para amigos imaginários. Um dos companheiros criados pelo menino foi Boddah, parceiro que o acompanhou até os últimos dias e ganhou até citação na carta de suicídio deixada pelo roqueiro.
A primeira e irreversível mudança na vida de Cobain ocorreu aos 8 anos, com o divórcio dos pais."Ele mudou completamente. Ficou muito introvertido e isso o deixou desolado", lembrou a mãe do ídolo, Wendy O'' Connor.
Na adolescência, já aficionado pela distorção das guitarras do punk rock, era o típico desajustado social. Passou temporadas na casa da mãe, do pai, tios, avós e até dormiu sob a ponte North Aberdeen.
CARREIRA E DROGAS - No livro, a saga do Nirvana - desde o início da amizade de Cobain com o baixista Krist Novoselic, em 1985, até o último álbum de inéditas, "In Utero" (1993) - é ilustrada com fotos raras e análises de medalhões do jornalismo musical, como Greil Marcus e David Fricke.
Um dos destaques é a entrevista concedida pelo astro cerca de três meses antes de morrer. Na ocasião, ele comentou a camisa de força artística criada pelo sucesso do disco Nevermind, turbinado pelo clássico Smells Like Teen Spirit.
"Eu mal consigo chegar ao final dessa música. Tenho vontade de jogar a guitarra no chão e ir embora."
Os textos também abordam o efeito destruidor do envolvimento de Cobain com a heroína, a angústia em relação às pressões do megaestrelato e a conturbada relação com a cantora Courtney Love, com quem teve uma filha, Frances Bean. Trata-se de leitura recomendável para quem deseja aprofundar conhecimentos sobre a cartilha roqueira.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Impacto imediato

Agência FAPESP – Um novo estudo afirma que a supererupção vulcânica de Toba, ocorrida na ilha de Sumatra há cerca de 73 mil anos, resultou no desflorestamento da maior parte da Índia central, em uma área que se estendeu a até 5 mil quilômetros do epicentro.

O vulcão teria ejetado estimados 800 quilômetros cúbicos da cinza na atmosfera. Outra consequência foi uma cratera de 100 quilômetros de comprimento por 35 quilômetros de largura, que hoje é o maior lago vulcânico do mundo.

De acordo com a pesquisa, cujos resultados foram publicados na revista Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology, a cinza refletiu a luz solar e os aerossóis de enxofre bloquearam os raios solares na região por seis anos, iniciando uma era do gelo que teria durado 1.800 anos.

“Durante essa era do gelo, as temperaturas caíram em até 16º C”, disse Stanley Ambrose, professor da Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, principal autor do estudo. Segundo ele, os efeitos da erupção podem explicar a queda nas populações humanas em todo o mundo que se estima teria ocorrido entre 50 mil e 100 mil anos atrás.

Os cientistas analisaram substrados marinhos na baía de Bengala, que contêm uma camada de cinza resultante da erupção. Também estudaram taxas de isótopos de carbono em sedimentos fossilizados subterrâneos em três regiões na Índia.

Os resultados indicam uma alteração clara no tipo de vegetação encontrada na Índia imediatamente após a erupção. A vegetação que se sucedeu demonstra as condições mais secas e mais frias na região por pelo menos mil anos depois do evento.

O artigo Environmental impact of the 73 ka Toba super-eruption in South Asia, de Stanley Ambrose e outros, pode ser lido por assinantes da Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology em:

www.sciencedirect.com/science/journal/00310182.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Deputados Prestaram um Mau Serviço à Democracia

A democracia é hoje um dos modelos políticos que mais vigora em grande parte dos países, no entanto, cada país procura enquadrar o modelo a sua própria realidade social e política. Muito recente na Guiné-Bissau, ela reclama por ajustes que facilitem sua institucionalização, mas a incompreensão do modelo e, sobretudo as enormes dificuldades de instituições responsáveis para o seu funcionamento dificultam gravemente o aperfeiçoar de regras que garantem a participação e contestação.

Duas emendas de lei-eleitoral foram recentemente aprovadas no Parlamento guineense. A primeira foi a emenda que criou novo regulamento para se candidatar ao cargo de presidente da República. Esta nova lei obriga os candidatos às próximas eleições a depositarem uma caução de 20.000.000 de F.cfa para, entre outros, validarem suas candidaturas. E caso o candidato não atinja 10% de votos validamente expressos, perderá o direito de recuperar o dinheiro, que será revertido aos cofres públicos e depois destinado ao fundo da democracia. A segunda obriga a automática extinção de partidos ou coligações que não conseguirem atingir 5% de votos validamente expressos nas legislativas. A medida apresentada pela bancada do PAIGC também teve apoio da bancada oposicionista liderada pelo PRS. Para defensores das emendas, isso visa por um lado reduzir o elevado número de candidatos à Presidência da República e, por outro lado, permitir que menos partidos compitam pelos votos que dão acesso à ocupação de cadeiras no Legislativo e controle do Executivo.

No mínimo, e dentro dos critérios de princípios democráticos pode-se dizer que é irracional agir dessa forma. Apesar de não se poder negar hoje o elevado índice de proliferação de partidos e candidatos nas eleições, isso se levarmos em consideração o número de habitantes que temos (1.700.000hab, aproximadamente) e com apenas pouco mais de 500.000 eleitores. Mas, mesmo com esse cenário, não é recomendável a criação de leis antidemocráticas como forma de controlar a situação. Além do mais, a proliferação de partidos e candidatos é própria de uma sociedade multi-étnica e, sobretudo, com elevado índice de analfabetismo como a nossa.

É contra as leis da democracia extinguir partidos ou coligação de partidos porque tiveram baixo desempenho nas urnas ou deixaram de comparecer em determinadas eleições. Em alguns países, como o Brasil, por exemplo, um dos mecanismos para controlar a proliferação de partidos é retirar o beneficio de fundo partidário àqueles que não atingiram 10% dos votos nas eleições, salvo erro. Na Guiné, contrariamente, há muito que os partidos não são beneficiados com fundos provenientes do Governo para apoiar suas atividades políticas, devido à falta de recursos. E preferimos não acreditar no que dizem algumas pessoas, que essa estratégia é para permitir ao PAIGC e ao PRS terem o domínio sobre o ambiente político nacional. Pois, o sistema bipartidário de competição eleitoral como nos Estados Unidos, Portugal, Cabo Verde, etc., foi resultado de um processo consolidado que permitiu naturalmente dois partidos competindo a nível nacional por votos dos eleitorados, o que não quer dizer que não existem nas arenas Estaduais e Municipais pequenos partidos a competir.

A democracia faz parte de um conjunto de “pacotes” padronizados de ideais liberais. Da mesma forma como funciona o mercado econômico, a democracia também se auto-regulariza à medida que são criadas condições institucionais legais para o seu funcionamento. Ou seja, é o próprio sistema que naturalmente vai de acordo com a sua institucionalização eliminar pequenos partidos e candidatos fracos na arena de competição eleitoral e não as leis ilusórias e inconsistentes que irão desempenhar essa função. Como chegar à institucionalização? É um processo que exige respeito pelo princípio do jogo democrático, no entanto, alguns requisitos são fundamentais para atingir o objetivo, como: ausência de golpes de Estado, ausência de queda do Parlamento e do Executivo, remodelar o Governo com menos frequência e de forma racional, selecionar para Legislativo pessoas com reconhecidas capacidades técnico-administrativa, idoneidade do Judiciário, submissão do poder militar ao civil, fidelidade e disciplina partidária, realização de eleições livres, justas e transparentes, e criação de uma consciência cidadã na sociedade que deve se sustentar mediante um investimento educacional sério. Portanto, adequar o nosso sistema às leis democráticas significa ausência da violência institucional, mais responsabilidade pública, e, isso ajuda a reduzir a proliferação de pequenos partidos e candidatos fracos nas eleições.

A condição exigida para se concorrer à Presidência da República nas próximas eleições seguramente não será barreira para impedir a afluência de possíveis candidatos por motivos que são óbvios. Pois, nosso sistema de finanças públicas ainda não consegue controlar o rendimento anual financeiro dos contribuintes (pessoas físicas), o que abre uma enorme possibilidade na alocação fácil e por vias criminosas de recursos para concorrer às eleições presidenciais. E literalmente pode-se dizer que a referida lei vai apenas incentivar o crime financeiro contra as finanças públicas. Desafio que o nosso sistema de segurança pública não tem estrutura para enfrentar, tanto que existem cidadãos que de dia para noite aparecem com fortunas (dinheiro, palácios e carros de elevado valor) e não são questionados sobre a procedência da riqueza que adquiriu em pouco tempo sem ter herdado dos pais ou ganho na loteria. E mais, um número insignificante de servidores públicos consegue ter rendimento anual de 5.000.000 F.cfa e se conta pelos dedos os que têm nos bancos (seja na conta corrente ou poupança) valor correspondente a 1.000.000 de F.cfa. Criar leis incompatíveis com a realidade do país, em linhas gerais, é motivar cidadãos a praticar crimes. Não obstante, resta saber em que moldes ficará a lei de financiamento público das campanhas eleitorais, evento em que habitualmente circulam elevados valores de procedência duvidosa, além de descarado desvios de bilhões do cofre público. Por que candidatos, partidos ou coligações não declaram seus gastos de campanha nas Contribuições e Impostos?

Há muita coisa que precisa ser revista na nossa lei eleitoral, e, apesar da legitimidade que os deputados têm para fazê-la, contraditoriamente, uma parte considerável carece de um adequado preparo técnico para discernir o assunto e se limitam apenas aos empurrões da liderança partidária. Votam favoravelmente ou não porque simplesmente foram mandados e abdicam-se outrora por falta de conhecimento da realidade de ver o interesse nacional. Por isso, às vezes, é pertinente convidar especialistas para ministrar palestras sobre o funcionamento da democracia e suas leis para precavê-los em tomadas de decisões, no sentido de contribuir para dissipar algumas dúvidas sobre as matérias complexas.

Com o mau serviço prestado à democracia pelos deputados da Assembleia Nacional Popular, agora se espera uma correção do presidente da República Bacai Sanhá que deve responder à situação de modo mediato, reflexivo e racional para salvar o barco de um possível naufrágio democrático. Outrossim, esperamos a contribuição exemplar de seus assessores em mostrar-lhe não só a inconstitucionalidade da nova lei como a sua inadequação ao pleno funcionamento da democracia e não promulgar a emenda ora aprovada pelos parlamentares.


"Rui Jorge da Conceição Gomes Semedo"

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Ferramenta de telecomunicação simula teletransporte

Através de um sofisticado óculos que projeta cenários de imersão digital, já é possível fazer chamadas telefônicas como se os interlocutores estivessem interagindo no mesmo ambiente.

Esta tecnologia é uma plataforma de telecomunicação inspirada no teletransporte e batizada de Arcah, desenvolvida pela empresa Ualah – start-up 100% brasileira. O diferencial da Arcah para outras tecnologias de imersão digital, é a capacidade de interagir em ambientes projetados vendo a si mesmo em 1ª. pessoa, o que aumenta a sensação de estar em outro ambiente. “Olhe para seu corpo e imagine que tudo a sua volta é uma projeção. Isso é o Arcah, a captura da imagem do seu corpo físico, vista em primeira pessoa, em diferentes ambientes projetados” diz Martin Ignácio Izarra, co-fundador da Ualah. Para interagir através do Arcah, o usuário deve ter o óculos de imersão digital, chamado de Imersor.

O sistema detecta o movimento das mãos dentro do espaço projetado possibilitando navegar pela internet, interagir em espaços projetados com outros usuários, como em reuniões de trabalho, encontros sociais, palestras e aulas particulares. “As pessoas que utilizaram o Arcah se sentiram imergidas dentro de um sistema e teletransportadas para um lugar diferente”, diz Léo Souza, co-fundador da Ualah. Segundo os sócios da Ualah, o uso de programas e aplicativos da internet e a telefonia VoIP são particularidades do Arcah que tornam o produto funcional, indo além do seu valor de imersão digital. A tecnologia Arcah já possui protótipo em funcionamento. Em Dezembro de 2009, será disponibilizada uma versão beta gratuita para o público com funcionalidades parciais e uso através do computador conectado a webcam.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

ODORES!

O odor da distancia
sulca as águas do Mar
esse odor da coisa dita
com o sentido de limitar

Odor com conteúdo
que muito bem compreendo
usado por muito poucos
no muito que vão fazendo

Odor vindo na maresia
do putrefacto das galés
ao tempo na travessia
dos acorrentados pelos pés

Odor trazido pela corrente
diferente no cheiro da maresia
dos corpos lançados á água
de gente que ao tempo morria


"grapilho"

terça-feira, 13 de outubro de 2009

A Fixed Idea

What torture lurks within a single thought When grown too constant; and however kind, However welcome still, the weary mind Aches with its presence. Dull remembrance taught Remembers on unceasingly; unsought The old delight is with us but to find That all recurring joy is pain refined, Become a habit, and we struggle, caught. You lie upon my heart as on a nest, Folded in peace, for you can never know How crushed I am with having you at rest Heavy upon my life. I love you so You bind my freedom from its rightful quest. In mercy lift your drooping wings and go.

"Amy Lowell"

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Tudo combinado

Com um posicionamento oficial que poderia ser considerado até mesmo desrespeitoso, por seu conteúdo que mistura o inverossímil e o irônico, o governo subestimou a inteligência da opinião pública brasileira, ao encarregar representantes do seu corpo diplomático de divulgarem que o presidente deposto de Honduras, Manoel Zelaya, se “materializou” na Embaixada brasileira naquele país, onde permanece acolhido.

Houve sim uma clara e prévia decisão política do governo brasileiro de abrigar Zelaya, não tendo sido, obviamente, mera coincidência o seu acolhimento na Embaixada às vésperas da Assembleia Geral da ONU, em Nova York, para a qual o presidente Lula já tinha um discurso preparado em defesa do presidente deposto e de sua recolocação no cargo. Estava tudo combinado.

O governo brasileiro não deveria estar se imiscuindo nos assuntos internos de outros países. E, antes de fazê-lo, deveria ter levado em consideração que Manoel Zelaya não fora deposto pelas armas, mas destituído do cargo por uma decisão da Suprema Corte e do Parlamento de Honduras. A medida se deveu à iniciativa de Zelaya de, desrespeitando a Constituição Federal seu país, querer realizar um plebiscito sobre a instalação de uma Assembleia Constituinte que se destinaria a reformar a Carga Magna hondurenha.

Estava tudo combinado. E o governo brasileiro não deveria estar se imiscuindo nos assuntos internos de outros países.


Deixe o seu comentário em www.marceloitagiba.com

sábado, 26 de setembro de 2009

Não é uma questão de dentes

-“As mães mandam os miúdos para a escola sem comer! A gente é que tem que tomar conta deles”.

Foi a minha amiga que me contou: Uma das participantes da roda aonde costuma ir com outra amiga, às vezes à tarde, tomar o café pingado, sentou-se esmorecida, já estafada, em princípio de ano escolar. Mas só a minha amiga escutou: - “Pode ser que mude!”, disse simpaticamente.

As outras têm outros assuntos de conversa, não discutem política, todas de bem na vida e ainda bem, todas de bem com Deus, com Sócrates, de quem nunca falam. A moça professora ainda acrescentou: “E temos que encher páginas de relatórios. Será isto ensinar?”

A minha amiga, prudentemente, remeteu-se ao silêncio, olhando-a com comiseração.

Contou-me hoje. E comentámos que não, não era aquilo ensinar. Parece que a moça dava aulas nos subúrbios, fora do percurso eleitoral, por consequência, fora da dedada socrática. Podia ser que depois...

Eu contei-lhe da entrevista de ontem do Mário Crespo ao professor José Gil, que analisou uma situação de estranheza, como já ambas tínhamos estranhado. Uma figura, um partido, um governo, cheios de mazelas pessoais, sociais, com tanto escândalo ao longo dos quatro anos, tanto vilipêndio humano, e estava à frente nas sondagens para as eleições de amanhã. Qual a varinha mágica de tanto êxito? Será forjado? Pacheco Pereira afirma contundentemente que, ao sofrer na pele as mentiras periodísticas sobre si próprio, percebeu como é fácil forjar mentiras para convencer o povo. E o povo deixa-se enrolar pelas sondagens.

- “O que vale é que o carnaval já acabou. Mas tanto Carnaval!. Para quê? E o Zé Povo gosta que se farta! Mesmo que estejam desempregados! Eu ouvi um homem de uns cinquenta anos a dizer isto: “Ou ganha um, ou ganha outro – a Manuela ou o Socas”. Que as velhinhas digam “Socas”, vá que não vá, não têm dentes, os rr enrolam-se na língua. Agora um de cinquenta anos a dizer “Socas”!”

Ainda rimos com a história e eu contei que tal comentário já o fizera “Cassandra”, com sarcasmo implacável, na peça “La Guerre de Troie n’aura pas lieu”, a respeito dos gritos da multidão: “Viva Vénus! Eles não gritam senão frases sem r, por causa da falta de dentes... Viva a Beleza... Viva Vénus... Viva Helena... Eles pensam proferir gritos. Apenas içam as mastigadelas ao cúmulo da sua potência.”

A minha amiga ficou lisonjeada com o paralelo, mas hoje sentia-se deprimida, sem saber bem em quem votar. Eu lembrei pessoas do CDS que me pareceram gente da velha guarda – o Lucas Pires, o Nogueira de Brito, o Narana Coissoró, o Ribeiro e Castro, o Lobo Antunes, e tantos outros.

- “Olhe, diz-me ela, mas julgo que não a sério, o melhor é a gente não saber ler, senão passa a vida numa irritação completa. Isto da tal professora! Quem está bem instalado não quer saber de nada! Zero! Lamentar a vida dos outros!? Não estão para aí viradas! E gozam que se fartam! Essas vão votar no Sócrates, com o r direitinho, porque não lhes faltam dentes, dos tratamentos protésicos mais careiros.

- Sim, Sócrates representa a mágica Helena para a maioria influenciável – quer com dentes, votando Sócrates, quer sem eles, votando Socas.


Berta Brás

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Da Democracia Partidária para a Democracia Civil

As desilusões acerca de políticos e políticas, a sua complexidade e falta de informação objectiva, motivam uns cidadãos e desmotivam outros a deslocarem-se aos locais de voto.

Cada vez se torna mais difícil permanecer fiel a um partido ou a encontrar um que satisfaça a própria visão política. As ligações sociais e culturais tradicionais de filiados e adeptos têm sido sistematicamente desacreditadas. A desilusão conduz muitos a não votarem. Os partidos, cada vez se desvinculam mais das regiões, da natureza e do povo, para darem mais relevância à ideologia e à banalidade pragmatista. Em Portugal a macrocefalia com a sua concentração em Lisboa mais agudiza a problemática duma nação cada vez mais estranha a si mesma.



Os eleitores protestadores querem manifestar com o voto o seu descontentamento para com os governantes quando fazem uso do boletim de voto para colocarem o nome duma pessoa ou partido não considerado na lista (tornando o voto inválido, colocando a cruz em todos os partidos ou votando no considerado irrelevante).



Os eleitores tácticos procuram com o seu voto fomentar coligações.



Os eleitores bonzinhos querem ver na política visões, justiça, o que ela, em democracia partidária, não pode dar. Esperam uma política de visão completa e não partida, esquecendo que o Partido é partido não podendo pela sua essência ser inteiro.



Os abstencionistas tornam-se, entretanto, num partido com aspirações a maioritário. Uns protestam, outros não sabem o que eleger; outros sabem mas não querem, pelas mais diversas razões. Também os há que não votam para que o partido não seja indemnizado pelo dinheiro do Estado, na comparticipação devida por votante.



Na imprensa aparecem opiniões a defender a participação com o voto e outras contra ela.



Os defensores da participação nas eleições argumentam com a obrigação civil livre de votar. Assim, o eleitor pode influenciar a governação dos 4 anos e manifestar que está atento à política, podendo mais facilmente criticá-la ou aplaudi-la. Quanto menos o poder popular se manifestar mais oportunidade dá a grupos de interesse duvidoso. A não participação no acto eleitoral favorece extremismos.



Os defensores da abstenção nas eleições argumentam que os não votantes não têm outra alternativa nas listas de eleições que possibilitem mostrar o seu protesto e descontentamento com a política vigente. Muitos não eleitores, mais que por indiferença, não alinham na eleição de partidos que se desviaram do povo que deixaram de representar para defenderem ideologias. Mostram que perceberam o teatro das campanhas eleitorais não reconhecendo nelas alternativas. Muitos não vão votar para se contraporem à dominância dos partidos que se assenhorearam da praça pública (do Estado) avassalando a formação de organizações cívicas. Muitos querem uma democracia menos representativa e mais directa, como na Suiça.



Embora o meu partido inoficioso seja o do arco-íris, aconselho todo o cidadão a considerar bem o seu voto e, no caso excepcional de não votar, organizar ou entrar numa associação cívica que tente intervir directa ou indirectamente na política. Facto é que quem não vota continua a deixar os outros falar e agir em seu nome, sem possibilidade de, pelo menos, protestar perante o partido em que votou.



Muito embora os partidos se tenham assenhoreado de tudo o que é relevante no Estado, isto não pode constituir motivo para a renúncia à implementação duma sociedade civil adulta que mais tarde corrigirá os vícios da democracia partidária no sentido duma democracia civil.



Na discussão política não se encontra um partido da classe média nem um partido conservador, nem tão-pouco são tematizadas as questoes que o Partido Pirata vai colocando por essa europa fora e que são muito oportunas. De facto não é bom que a esquerda continue a privatizar o saber e o capitalismo a propriedade. Socialismo e turbocapitalismo são irmãos gémeos sorvendo da pessoa o seu espírito para o colectivizar e proletarizar em função de superstruturas em que o indivíduo não vale nem tem lugar. Se queremos ser coerentes e humanos teremos transformar todas as instituições políticas e económicas em verdadeiras oficinas de futuro, um futuro aberto e solidário! Para isso torna-se óbvio participar e contribuir para superar as velhas frentes de esquerda e de direita! O futuro já começa a estar presente numa visão integral de participação na complementaridade.


António da Cunha Duarte Justo

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Olha que eu não te vou lá tapar

Falava com a minha filha. Da Mafalda, a minha neta de quatro anos. Concordámos que as suas respostas a cada passo nos deixam surpreendidos. E contou-me nova história.

É certo que tenho vivido mergulhada em êxtase de avó. Como mãe, descurei um tanto o acompanhamento dos filhos, a profissão pouco tempo me deixando para lhes contar as histórias do seu adormecer, cuidando que, tal como sucedera comigo, cada um era livre – dentro das regras que já trouxera de casa, e que contribuem para a formação do carácter - fechando um pouco os olhos, todavia, às fugas, acima de tudo desejando que fossem felizes na liberdade, que não descurava, contudo, o desejo de que se saíssem bem como estudantes. Mas a filha foi, de facto, a mais cumpridora, não precisando tanto de que lhe vigiasse os cadernos, ela própria sabendo das suas dúvidas que, assim que desfeitas, a levavam a singrar no seu próprio caminho, com o entusiasmo da boa estudante que sempre foi. E hoje corrige-me os erros das minhas dúvidas ortográficas, que a idade e os acordos (com o fechado) ortográficos vão semeando no meu espírito. Todavia, estou convencida de que é necessário mais autoridade, conheço filhos de pais agricultores e merceeiros, cujos filhos, bons estudantes, ajudam os pais na lavoura, em tempo de férias. A liberdade, segundo os princípios da Constituição dos Direitos Humanos, ao maximizar a fragilidade infantil sob o domínio paterno ou docente, e os seus direitos à própria personalidade – tudo o que seja repressão significativo de autoritarismo e crueldade - instituiu o excesso de mimo como prática, e as crianças, sob o apoio da lei, tornam-se muitas vezes déspotas na escola como na família.

Ciente das dificuldades do viver futuro das crianças mais novas, aos netos mais novinhos – as mais velhinhas já no seu percurso de adultas, tendo deixado em mim igualmente as suas marcas de encanto - vou assistindo e vibrando com o seu trajecto, o Bruno, na doçura da sua sensibilidade e marotice, a Beatriz, a mais novinha, espantando-me com a sua ciência sobre as marcas dos carros e outras saídas vocabulares que vai buscar creio que às histórias do Panda, aos CDs que todos eles gostam de ver, às lições dos Infantários, e, naturalmente, ao acompanhamento familiar.

Todavia, a Mafalda, de longa data a todos tem espantado na articulação rápida do pensamento, de uma firmeza já notória nas fotos da sua primeira infância.

Eis a história transmitida pela tia:

A tia e a mãe jogavam a um jogo de computador em casa daquela, o tio deu-lhe um beliscão por brincadeira, a que reagiu, não educada ainda no politicamente correcto, em imediata queixa à mãe. O pai pô-la em contacto telefónico com a avó, dizendo-me ela que estava aborrecidinha, estado de espírito que me levou a tentar aplanar, falando-lhe do Bruno e da Beatriz não presentes para brincarem. Ao que parece, o tio ia sair, quis saber para onde, foi-lhe explicado que ia dar de comer aos “Sem Abrigo”, na sua ronda nocturna, e concluindo, talvez na brincadeira com ela, que iria lá dormir, depois de lhe ter explicado quem eram os senhores que ia visitar.

E a Mafalda, muito séria e muito rápida, contestou, pesarosa: “Olha que não te vou lá tapar”.

Uma vez mais foi objecto de admiração a sua saída.

Sem o saber, a Mafalda estava a programar um caminho futuro, para uma sociedade já não dividida entre a miséria e o voluntariado, a actual miséria dos Sem Abrigo que as iniciativas de Solidariedade para a Reinserção Social, através dos seus Voluntários, tentam chamar à razão e trazer para um viver mais digno, intenção poucas vezes coroada de êxito, pois não raro são repelidos com violência, num clima a que a droga, nos nossos tempos, não é alheia.

Vem de longa data, entre nós, a atenção pelos pobrezinhos, a cada passo até recordados literariamente. Somos esmoleres por natureza, confrange a miséria, e com a nossa esmola julgamos contribuir para libertar um pouco da fome os esfomeados. E os Voluntários da Solidariedade Social são dignos de todo o apreço, sacrificando o seu bem-estar, por vezes sob os frios do inverno, para levar conforto e tentar salvar os sem agasalho.

Mas a luta é entre os que os querem salvar e os que preferem continuar, no embrutecimento de uma liberdade que os desresponsabiliza, sacrificando indiferentemente os outros, achando-se em seu pleno direito para tal, num egoísmo sem tréguas.

Quando a Mafalda diz ao tio: - “Olha que não te vou lá tapar” é todo um programa rígido de um futuro possível, se mais Mafaldas houvesse que continuassem o seu discurso para uma maior dignidade humana: - “Tens direito a um lar, mas deves trabalhar e não pedir, para satisfazeres as necessidades da tua condição humana. O teu agasalho deves ser tu a obtê-lo”.

E o tio deveria meditar nisso, não se sacrificar tanto – no dia seguinte ele vai trabalhar cedo - em prol daqueles que não querem nada, que se deixaram conduzir ao degrau ínfimo da sua condição humana.

Era necessário que os governos propusessem medidas eficazes para combater a mendicidade e a indignidade dos que preferem pedir a trabalhar. Creio que noutros países mais desenvolvidos do que o nosso, se tomam medidas a favor desses. O mal é que, no nosso, as medidas não são suficientes sequer para a maior parte dos que trabalham.

Depende também de hábitos cívicos e educacionais. Mas como diria o falso “Mendigo” do “Deus lhe pague”, a esmola é uma prática dos abastados para angariarem a ajuda celeste, pelo reconhecimento do bem que fizeram na Terra.

Eu sou das que a dou. Mas com raiva, não por bondade nem por interesse nos favores divinos. Por saber que nada obtenho com isso em termos de recuperação social. E que muitas vezes o mendigo ganha mais mendigando do que trabalhando decentemente.

Gostaria de dizer como a Mafalda: - “Olha que não te vou lá tapar”. Mas limito-me a esperar que esse dia chegará com mais critério.

Hoje ainda vivemos sob a magia do “Menino do Bairro Negro” do nosso Zeca Afonso, “menino” a quem só soubemos transmitir os ideais não de responsabilidade mas de liberdade. E de insolência.


Berta Brás

Portugal entre o Labirinto do Socialismo e o Campo de Touros

Temos tido uma campanha de rostos sem discussão de temas de fundo nem de interesse nacional. Muitos cartazes de fachada que não dizem nada de concreto e nada trazem. Dum lado a retórico e a vantagem do partido de governo e do outro a falta de eloquência e juventude. As armas da democracia são as palavras e estas revelam-se muito fracas de conteúdo. Este é o tempo dos partidos e não do Estado nem do Povo. O que o PS tem a mais de empolamento e retórica falta ao PSD. As máquinas da opinião funcionam, mesmo à custa da verdade. Esta desmotivaria o povo a votar em governos que se servem em vez de servir.

A verdade será dita ao povo depois das eleições. Então falar-se-á mais seriamente da dívida externa portuguesa que consta de 32,6 milhoes de euros por dia, ou seja, cada hora que passa os portugueses devem mais 1,4 milhoes de euros. Portugal caminha, a passos largos, para a anarquia tal como aconteceu na República, a toque de caixa de políticos irresponsáveis que sacrificam o futuro dos portugueses ocultando-lhe a realidade e o estado do Estado. O PM Sócrates, com a sua ideologia e actuar, parece seguir as pegadas dos seus modelos republicanos que conduziram Portugal à falência na República, o que veio a legitimar o golpe militar de 1926 que instaurou a ditadura militar e vem a dar origem ao surgir do Estado Novo como restabelecedor da dignidade de país a nível internacional.

O sucesso imediato dá razão à mentira mas esta tem pernas curtas. A Portugal falta-lhe a consciência duma política civil da verdade por isso aposta num futurismo agnóstico do oportuno. Por isso o país não consegue chegar longe. A pobreza do povo, que temos, não é compatível com ordenados e pensões de senhores parasitários, alimentados à custa dum estado a caminho da banca rota. Em nome da democracia se afirma a tirania dos homens bem, hedonistas, irresponsáveis de fachada alegre e festiva.

Não se assiste a um debate sério sobre a formação (escola) como chave do sucesso e do futuro, pelo contrário vêem-se programas de formação subsidiados pela União Europeia mais dirigidos a dar emprego aos formandos do que em transmitir uma formação séria aferida às necessidades da nação. Estes são dinheiros desviados para interesses individuais e ideológicos à margem dos interesses e das necessidades do país. O governo continua a adiar o país, a desfazer Portugal.

Não há protecção de dados do cidadão; a Constituição nacional, é mais partidária que nacional.

Não se discute a sério o sentido do empenho militar no estrangeiro. Que interesses de Portugal se defendem no Afeganistão?

Que política se desenvolve no sentido de evitar o Dióxido de Carbono e de produção de energias limpas, para se venderem ao estrangeiro. A energia fotovoltaica é reservada para as grandes multinacionais, quando os tetos das casas portuguesas poderiam tornar-se todos em fonte de riqueza nacional e de investimentos rendosos para os particulares que em vez de investirem em cimento e casas poderiam investir na energia limpa.

Quem se empenha pela transformação do sistema de medicina de classes que brada aos céus para a transformar num sistema de medicina solidário. Pacientes encontram-se mais de meio ano e até anos à espera de operacoes fáceis… Médicos importados e outros que se vão formar ao estrangeiro porque o sistema de escola português tem muito de ideologia e pouco de adaptação às necessidades reais do país.

Uma política económica que se limita a atirar cimento e alcatrão parta o cidadão é contra o ambiente e contra os mais fracos e retrógrada. Desperdiça-se o capital da nação em acções duvidosas.

Onde se encontra a discussão sobre a necessidade de regionalização do país contra a centralização desenfreada que só tem servido políticos e elites económicas à sombra dum estado que pretende ser português num país de terra queimada, para lá de certos centros.

Um estado com uma filosofia parasita só poderá continuar a asfixiar o resto da classe média com impostos insuportáveis. Para o futuro não haverá fundos de meneio que possibilitem o estado tornar-se livre. As gerações novas terão de fazer revoluções para poderem recomeçar a construir um país para todos.

O horizonte de Portugal e da democracia não pode ser configurado ao horizonte míope dos partidos nem de arrogâncias de popularidades.

Os revolucionários do 25 de Abril, nas pegadas dos revolucionários do 5 de Outubro, têm feito tudo para que Portugal se tenha de ajoelhar à Espanha ou de dar lugar a novos Gomes da Costa!

Em país habituado a construir e fundamentar a sua identidade em datas revolucionárias sem personalidades à altura não pode ir muito avante.


António da Cunha Duarte Justo

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

CAMPANHA ELEITORAL NO GRAMADO PORTUGUÊS

Povo fora de Jogo e Atletas perdidos nas Fintas

Vazia de contudo com figuras de barões de rostos polidos. A horizontalidade socialista afirma-se contra a verticalidade conservadora. Faltam respostas convincentes aos problemas a resolver na próxima legislatura: endividamento do estado, desemprego, envelhecimento da sociedade, emigração, energia alternativa, escola e saúde, ocupações precárias com salários de judas, tudo problemas adiados.

Fora de jogo

O povo não aguenta conceitos para resolução da crise e os partidos, para evitarem uma maior erosão do eleitorado contentam-se com perfis de imagens. Não falam das obrigações e encargos futuros que pesarão dolorosamente sobre todos nem da maneira de resolver a crise.



Esta é a hora dos partidos pequenos que podem criticar e fazer ofertas de benefícios na certeza de não serem chamados à responsabilidade governamental para os poder cumprir. Os partidos grandes que façam promessa só poderão mentir ou fazê-las a favor da ideologia contra o país.

“Benfica” contra o “Porto”

Apesar de tudo há uma cera polarização, atendendo a que, na liga, o líder campeão tem metido golos na própria baliza, não ligando aos colegas de equipa nem à natureza do relvado que tem. Isto, num país do futebol, é grave mas não ameaçador. Os adeptos têm grandes reservas na capacidade de frustração quanto ao “Benfica” e ao “Porto”; relativamente aos outros clubes não passam de tambores da festa eleitoral que se aproveitarão dos erros do maioral. Quanto a técnicas e metas a atingir, os adeptos contentam-se com o olhar para os capitães de equipa num desejo imenso de levantar as mãos para os poder aplaudir. Os restantes, os espectadores televisivos, desconhecedores das regras do jogo, esses não lhes resta senão dar asas ao sentimento e lançar umas carvalhadas contra uma ou outra jogada dalgum jogador.



O “Benfica”, macho e galaroz, com o seu avançado Sócrates, tem até força para colocar jogadores fora de jogo como no caso da TVI. Tem muitas bandeiras e bandeirinhas além dos seus fiscais no gramado português, não lhe faltando também o cacarejar das galinhas mais interessadas nas suas penas do que no seu jogo. Alguns pretendentes a galo da equipa sofrem, sabendo que só poderão mostrar a sua voz quando o galaroz se encontrar distraído no poleiro ou no caso de perder muitas penas no despique.



O “Porto”, com a sua avançada Manuela, mais preocupada com a sorte do galinheiro, encontra-se um pouco apreensiva das caneladas e rasteiras que a equipa adversária lhe tem passado, apesar de algum árbitro distraído com o aplauso das claques das bancadas da esquerda. Aposta no rejuvenescer de energias depois do intervalo! Não parece convencida numa vitória, seja ela de quem for, e que trará grandes surpresas negativas para a liga, dado só então ser aberto o jogo e serem postas as cartas na mesa. Por outro lado, mesmo que a adversária do campeão da liga soubesse o estado mísero da mesma, não o poderia apresentar, porque, como antigamente, os anunciadores de más notícias são sacrificados. O povo não aguenta a verdade. Por isso, só quem promete ganha.



Na falta de jogo (programa) a opinião pública ocupa-se das escorregadelas dos jogadores em terreno, de escândalos inocentes provocados pela chuva e do que poderia estar por detrás do terreno escorregadio.



Com o andar do jogo, a situação não parece fácil para os que se encontram na tribuna. O craque das bancadas já não soa tão ritmado. Na falta de maiorias absolutas, sempre perigosas para a democracia, os partidos têm que manter sempre uma janela aberta para o vizinho da Direita e da Esquerda.



Se pensarmos nos interesses de Portugal e não no dos partidos a próxima legislatura precisaria duma coligação PSD – PS. Só assim, longe de interesses de clientelas poderia Portugal arregaçar as mangas e fazer algo pelo país e pelo povo.


António da Cunha Duarte Justo

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

DEBATES

Chegou ao fim a série de dez debates que opuseram os líderes dos cinco maiores partidos.

A primeira ideia a reter é a de que o modelo adoptado, importado dos EUA, falhou em toda a linha. As restrições de tempo e de temas em cada frente-a-frente levou a uma série de ideias apenas afloradas, facilitou a fuga a perguntas difíceis e, de uma maneira geral, retirou interesse aos debates. Faltou, também, em quase todos os debates, o confronto directo, algo que melhorou nos últimos frente-a-frente.

A série começou com um duelo entre Sócrates e Portas que foi, basicamente, equilibrado, tendo, talvez, o segundo conseguido uma vitória tangencial.

Seguiu-se um soporífero confronto entre Jerónimo de Sousa e Francisco Louçã, com o líder do BE a conseguir ser menos eficaz como cura para a insónia.

Sócrates foi vencedor claro frente a Jerónimo de Sousa, enquanto Ferreira Leite surpreendeu pela positiva face a Louçã.

Frente a Jerónimo, Paulo Portas voltou a sair vencedor, tendo conseguido encontar pontos de contacto entre CDS-PP e os comunistas, nomeadamente na «defesa dos agricultores».

O debate seguinte trouxe nova surpresa, com Sócrates a incomodar bastante Louçã e a conseguir vencer o confronto que muitos pensavam que seria o mais difícil para o primeiro-ministro. O trunfo do fim dos benefícios fiscais defendido pelo Bloco para os PPR, Educação e Saúde deixou Sócrates em clara vantagem.

Contra Jerónimo de Sousa, Ferreira Leite abriu o capítulo das gaffes, confundindo taxas de IRS com IRC. No dia seguinte, a líder do PSD voltou a sentir dificuldades, perdendo claramente face a Paulo Portas, apesar de ter tocado um ponto sensível ao lançar a ideia de que para o CDS era indiferente se vencia o PS ou o PSD, uma posição de mera estratégia política e não de convicções.

Portas voltou a exibir-se em boa forma frente a Louçã, num debate entretido que serviu de aperitivo para o dito «Grande debate».

Sócrates e Ferreira Leite mostraram, de forma inequívoca, as debilidades do modelo dos debates, deixando de fora muitas questões importantes, nomeadamente as áreas da Segurança ou Justiça, e aflorando apenas outros temas de interesse.

Pelo meio ficam mais duas gaffes da líder do PSD, com uma explosão anti-espanhola inaudita e uma imagem infeliz sobre orfãos parricidas.

Contas feitas, a série de debates beneficiou claramente Paulo Portas, que insiste na especialização em nichos de oportunidade (segurança, agricultores, pensionistas, antigos combatentes, etc). Sócrates acabou por se sair bem, podendo a jogada do fim dos benefícios fiscais proposto pelo Bloco vir a impedir alguma transferência de votos do PS para o BE. Ferreira Leite não convenceu, mas acabou por não ser o desastre que muitos previam, saindo, eventualmente, mais penalizada com o facto de falar de «asfixia democrática» ao lado de Jardim. Jerónimo de Sousa esteve ao nível esperado, sabendo-se que o eleitorado comunista não é conquistado em debates mas sim nos movimentos sindicais e nas ruas. Louçã surpreendeu pela negativa, vendo-se obrigado a falar de alguns aspectos do programa do BE que podem alienar alguns potenciais eleitores.

A campanha (oficial) começa agora e o tom dos ataques deverá começar rapidamente a subir. As contas, essas, ficam para dia 27.

P.S.: O «Caso TVI» marcou o período da pré-campanha e é, no mínimo, um episódio grave. Admitindo que a decisão da administração seja legal, algo que é muito duvidoso, parece óbvio que o modo e o timing são totalmente errados. Que alguém apregoe que o grande beneficiado de toda esta situação é o PS entra quase na esfera da inimputabilidade...


"Pedro Corvelo"

domingo, 6 de setembro de 2009

O atestado médico por José Ricardo Costa

Imagine o meu caro que é professor, que é dia de exame do 12º ano e vai ter de fazer
uma vigilância. Continue a imaginar. O despertador avariou durante a noite. Ou fica
preso no elevador. Ou o seu filho, já à porta do infantário, vomitou o quente,
pastoso, húmido e fétido pequeno-almoço em cima da sua imaculada camisa.
Teve, portanto, de faltar à vigilância. Tem falta. Ora esta coisa de um professor ficar
com faltas injustificadas é complicada, por isso convém justificá-la. A questão agora é:
como justificá-la?
Passemos então à parte divertida. A única justificação para o facto de ficar preso no
elevador, do despertador avariar ou de não poder ir para uma sala do exame com a
camisa vomitada, ababalhada e malcheirosa, é um atestado médico. Qualquer pessoa
com um pouco de bom senso percebe que quem precisa aqui do atestado médico
será o despertador ou o elevador. Mas não. Só uma doença poderá justificar sua
ausência na sala do exame. Vai ao médico. E, a partir deste momento, a situação
deixa de ser divertida para passar a ser hilariante.
Chega-se ao médico com o ar mais saudável deste mundo. Enfim, com o sorriso de
Jorge Gabriel misturado com o ar rosado do Gabriel Alves e a felicidade do padre
Melícias. A partir deste momento mágico, gera-se um fenómeno que só pode ser
explicado através de noções básicas da psicopatologia da vida quotidiana. Os mesmos
que explicam uma hipnose colectiva em Felgueiras, o holocausto nazi ou o sucesso da
TVI.
O professor sabe que não está doente. O médico sabe que ele não está doente. O
presidente do executivo sabe que ele não está doente. O director regional sabe que
ele não está doente. O Ministério da Educação sabe que ele não está doente.
O próprio legislador, que manda a um professor que fica preso no elevador
apresentar um atestado médico, também sabe que o professor não está doente.
Ora, num país em que isto acontece, para além do despertador que não toca, do
elevador parado e da camisa vomitada, é o próprio país que está doente.
Um país assim, onde a mentira é legislada, só pode mesmo ser um país doente.
Vamos lá ver, a mentira em si não é patológica. Até pode ser racional, útil e eficaz em
certas ocasiões. O que já será patológico é o desejo que temos de sermos enganados
ou a capacidade para fingirmos que a mentira é verdade.
Lá nesse aspecto somos um bom exemplo do que dizia Goebbels: uma mentira várias
vezes repetida transforma-se numa verdade. Já Aristóteles percebia uma coisa muito
engraçada: quando vamos ao teatro, vamos com o desejo e uma predisposição para
sermos enganados.
Mas isso é normal. Sabemos bem, depois de termos chorado baba e ranho a ver o
'ET', que este é um boneco e que temos de poupar a baba e o ranho para outras
ocasiões. O problema é que em Portugal a ficção se confunde com a realidade.
Portugal é ele próprio uma produção fictícia, provavelmente mesmo desde D.Afonso
Henriques, que Deus me perdoe.
A começar pela política. Os nossos políticos são descaradamente mentirosos. Só que
ninguém leva a mal porque já estamos habituados.
Aliás, em Portugal é-se penalizado por falar verdade, mesmo que seja por boas
razões, o que significa que em Portugal não há boas razões para falar verdade. Se eu,
num ambiente formal, disser a uma pessoa que tem uma nódoa na camisa, ela irá
levar a mal.
Fica ofendida se eu digo isso é para a ajudar, para que possa disfarçar a nódoa e não
fazer má figura. Mas ela fica zangada comigo só porque eu vi a nódoa, sabe que eu
sei que tem a nódoa e porque assumi perante ela que sei que tem a nódoa e que sei
que ela sabe que eu sei.
Nós, portugueses, adoramos viver enganados, iludidos e achamos normal que assim
seja. Por exemplo, lemos revistas sociais e ficamos derretidos (não falo do cérebro,
mas de um plano emocional) ao vermos casais felicíssimos e com vidas de sonho.
Pronto, sabemos que aquilo é tudo mentira, que muitos deles divorciam-se ao fim de
três meses e que outros vivem um alcoolismo disfarçado. Mas adoramos fingir que
aquilo é tudo verdade.
Somos pobres, mas vivemos como os alemães e os franceses. Somos ignorantes e
culturalmente miseráveis, mas somos doutores e engenheiros. Fazemos
malabarismos e contorcionismos financeiros, mas vamos passar férias a Fortaleza.
Fazemos estádios caríssimos para dois ou três jogos em 15 dias, temos auto-estradas
modernas e europeias, mas para ver passar, a seu lado, entulho, lixo, mato por
limpar, eucaliptos, floresta queimada, barracões com chapas de zinco, casas
horríveis e fábricas desactivadas.
Portugal mente compulsivamente. Mente perante si próprio e mente perante o
mundo.
Claro que não é um professor que falta à vigilância de um exame por ficar preso no
elevador que precisa de um atestado médico. É Portugal que precisa, antes que
comece a vomitar sobre si próprio.
-----------------------------------------
URGE MUDAR ESTE ESTADO DE COISAS.
ESTÁ NA SUA MÃO, NA MINHA E DAQUELES A QUEM A MENSAGEM CHEGAR!