segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Mutação decisiva

Agência FAPESP – Embora tenham grande proximidade genética com os humanos, outros primatas como os chimpanzés não desenvolveram a capacidade inata da linguagem e da fala. De acordo com um novo estudo, modificações em aminoácidos de uma proteína associada com o surgimento da linguagem podem explicar por que a fala é única para os seres humanos.
O estudo, realizado por pesquisadores da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) e da Universidade Emory, em Atlanta, ambas nos Estados Unidos, foi publicado na edição da revista Nature.
Os cientistas acreditam que o gene FOXP2 está ligado à fala e à linguagem, pois, quando ele sofre uma mutação, essas capacidades são afetadas. O estudo indica que pequenas mudanças na proteína do gene podem levar a um efeito cascata que potencialmente influencia o desenvolvimento da fala humana.
A estrutura de aminoácidos do FOXP2 foi evolutivamente conservada, mas a versão do chimpanzé não contém dois aminoácidos específicos que são encontrados na variante humana.
A pesquisa indicou que a diferença de aminoácidos entre as variantes do homem e do chimpanzé altera a função da proteína FOXP2, levando-a a ativar uma rede de genes diferente. Essa mudança na sequência de eventos pode ser suficiente para levar ao desenvolvimento de um sistema de linguagem única nos humanos, sendo responsável pela capacidade de falar.
De acordo com os autores, os resultados do estudo fornecem novos caminhos de investigação sobre a evolução do cérebro humano e podem apontar para possíveis alvos para o desenvolvimento de drogas para doenças humanas caracterizada por perturbações da fala, tais como o autismo e a esquizofrenia.
“Pesquisas preliminares sugeriram que a composição de aminoácidos do FOXP2 humano evoluiu rapidamente mais ou menos ao mesmo tempo em que a linguagem surgiu nos seres humanos modernos”, disse Daniel Geschwind, da Escola de Medicina David Geffen, da UCLA.
“Mostramos que as versões do gene FOXP2 do ser humano e do chimpanzé não apenas parecem diferentes, mas funcionam de maneira diferente também”, disse Geschwind, que atualmente é professor visitante do Instituto de Psiquiatria do King's College de Londres (Reino Unido). “Nossos resultados podem lançar luzes sobre uma questão importante: por que os cérebros humanos nascem com o circuito de fala e linguagem e o cérebro do chimpanzé não.”
O FOXP2 “liga” e “desliga” outros genes. A equipe do laboratório de Geschwind esquadrinhou o genoma para determinar quais genes são alvo do FOXP2 humano. A equipe usou uma combinação de células humanas, tecido humano e tecido cerebral de chimpanzés mortos por causas naturais.
As dissecções de cérebros de chimpanzés foram realizadas no laboratório de Todd Preuss, coautor do estudo e professor associado de neurociências no Centro Nacional de Pesquisas em Primatas da Universidade Emory. O foco do estudo foi a expressão genética – processo pelo qual uma sequência de DNA de um gene é convertida em proteínas celulares. Os cientistas se surpreenderam ao descobrir que as formas do FOXP2 em humanos e em chimpanzés produziam efeitos diferentes sobre os alvos de genes nas linhas celulares humanas.
“Descobrimos que um número significativo dos alvos que foram identificados são expressos de forma diferente em cérebros humanos e chimpanzés. Isso sugere que o FOXP2 leva esses genes a se comportar de maneira diferente nas duas espécies”, disse Geschwind.
A pesquisa demonstra que as mutações, importantes para a evolução do FOXP2 em humanos, alteram as funções do gene. O resultado é que um conjunto diferente genes-alvo é “ligado” ou “desligado” nos cérebros de humanos e de chimpanzés.
“As mudanças genéticas entre a espécie humana e os chimpanzés dão pistas sobre como nossos cérebros desenvolveram as suas capacidades de linguagem”, disse a primeira autora do estudo, Genevieve Konopka, pós-doutoranda em neurologia da Escola de Medicina David Geffen. “Ao identificar os genes influenciados pelo FOXP2, determinamos um novo conjunto de ferramentas para estudar como a fala humana pode ser regulada em nível molecular.”
O artigo Human-specific transcriptional regulation of CNS development genes by FOXP2, de Daniel Geschwind e outros, pode ser lido na Nature em www.nature.com.

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