Do mar eu trouxe o vento que dança em torno de meus cabelos. Trouxe este meu cheiro de sal, mariscos e maresia. Vaqueiro fui e fazendeiro de estrelas-do-mar que subiram ao céu para formar constelações e galáxias. Nas pontas agudas de meus dedos cintilam fogos-de-santelmo. Meus olhos têm o brilho que roubei das ardentias. Os relâmpagos das procelas pousaram nas minhas mãos e nelas se aninharam. Do ritmo do mar eu trouxe os meus gestos e o meu jeito de falar. Num lance de búzios joguei minha cartada final em que fui anjo terminal. Do mar eu trouxe a cantiga do vento na voz dos búzios. Sobre o dorso de alados cavalos-marinhos pesquei sereias malévolas que me encantaram e depois fugiram. No vai-e-vem das ondas busquei o meu gesto de posse e devolução. Trouxe o meu beijo temperado no salamargo de suas águas. Trouxe tesouros sepultos nas covas do coração. Com o mar aprendi meu modo de caravelo: meus dedos são filamentos que machucam sem querer, que ferem sem ter por quê. Trouxe caracóis que se (con)fundiram com os caminhos labirínticos que trilhei. Louros, nunca os tive, exceto algas em meus cabelos. Arrebatado por navios fantasmas conheci várias e inefáveis dimensões. Nadei contra as correntes marinhas, mas a elas cansado me entreguei, despojado da púrpura e do cetro com que havia lutado. Trouxe do mar as conchas ilusórias - multiformes e multicores - com que minha vida enfeitei. Mas sobretudo trouxe a vida na alegria das chegadas e na tristeza das despedidas.
Elmar Carvalho
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