segunda-feira, 24 de março de 2008

A IRONIA DO DESTINO - II

Seja como for, o que é que ele está defendendo de armas na mão, com impávida firmeza, sozinho, sem autorização de ninguém, dentro da savana do mundo negro? A integridade da bacia atlântica, ameaçada pelo avanço do imperialismo soviético. A resistência dos portugueses coincide com a pregação do presidente americano, em favor da unidade cristã e dos povos de outras confissões amantes da liberdade do seu país.
Veja-se porém a calamidade que desaba sobre Portugal, quando ele aceita o desafio que lhe manda a União Soviética, através de incursões terroristas, na orla de uma colônia que até ontem vivia em paz com a sua metrópole.
Publicam telegramas da Suíça os jornais americanos informado que o diário “Noticias de Brasileiras” traz uma reportagem completa a propósito da crise angolesa. Ela, ao ver do importante e situado jornal da Suíça alemã, tem como origem única o governo da União Soviética. Agentes seus e de outro país da Cortina de Ferro organizaram sete sociedades com o fim especial de elaborar a lista de todas as sociedades russas que estão atuando em África, a fim de invadir e subverter as duas possessões portuguesas. Devemos dar fé ao relato suíço, porque os helveticos estão bem informados das coisas soviéticas.
Na revolução de 35, no Rio de Janeiro e no Nordeste, Getulio Vargas convocou um grupo de burgueses paulistas e cariocas a fim de antecipar a noticia da revolução que Moscou preparava contra o seu governo. Ele deu até detalhes na exposição que fez na casa de Guilherme Guinle.
Daí a dois meses estourou a revolta militar . tudo se passou como o presidente havia descrito em sua palestra sessenta dias antes.
Perguntei-lhe depois onde obtivera aqueles dados preciosos. Ele disse apenas isto: “Na Suíça”.
Com nenhum aliado se encontra Portugal. Os poucos tímidos, das primeiras horas abandonaram-no e hoje é uma serena homogeneidade com a União Soviética, para que Lisboa faça em Angola aquilo que a Rússia planejou e está exibindo pela violência armada.
Esta é uma das amargas ilusões do nosso tempo. Encontra Portugal, no caminho da sua evolução política, reunidos para tomar-lhe a pérola das suas colônias, os tártaros do Oriente e dos democratas do asfalto de Londres e Nova Iorque.
Isso faz lembrar o episodio da batalha, que travou o condestável de Bourbon na Itália, na qual seu filho, para abrir-lhe caminho no meio da tropa inimiga, gritava de espada na mão: “Guarde-se à direita, senhor meu pai; guarde-se à esquerda”.
Portugal encontra-se em um momento em que os seus amigos se acham confundidos com os soviéticos no mesmo manto de púrpura, que anuncia o inimigo comum.

Assis Chateaubriand – artigo publicado em 28 de Junho de 1961

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