terça-feira, 22 de janeiro de 2008

O glamour das cartas

O neurologista austríaco Sigmund Freud foi outro adepto das cartas, enviando muitas delas à mulher, desde os tempos de namoro, e mais tarde, à filha, Anna Freud, como também aos amigos e discípulos. Quando estive na Áustria, ano passado, ao visitar a Casa-Museu da Rua Berggasse, número 19, em Viena, onde residiu o Pai da Psicanálise até 1938, até o exílio na Inglaterra, passei horas lendo cartas riquíssimas em História e Psicologia, que se encontram à disposição dos visitantes e pesquisadores.
Ao pastor Oskar Pfister, em 1910, Sigmund Freud escreveu: “Não consigo imaginar que uma vida sem trabalho traga verdadeiro conforto”. Nas famosas cartas ao amigo Fliess, fala do prazer que o animava ao resolver o que chamava de “enigmas da vida”. E foi tão científico e ao mesmo tempo tão humano quando consolou uma mãe aflita que lhe confessara a homossexualidade do filho: “Posso perguntar por que a senhora evita pronunciar essa palavra? Sem dúvida, a homossexualidade não é nenhuma vantagem, mas não é nada de que se envergonhar; não é um vício, não é uma degradação, não pode ser classificada como doença. Nós a consideramos como uma variação da função sexual, uma certa parada do desenvolvimento sexual” E acrescenta, tão coerente quanto humano com a mãe angustiada:“ Homens da História altamente respeitáveis, dos tempos antigos e modernos, foram homossexuais, como Platão, Michelângelo, Leonardo da Vinci, entre outros. É uma grande injustiça perseguir a homossexualidade como crime e é também uma crueldade”, concluiu o pensador.
Outro apaixonado do gênero epistolar foi Mário de Andrade. Durante toda a sua trajetória como escritor enviou cartas ao poeta Carlos Drummond, ao editor José Olympio, aos escritores Pedro Nava e Álvaro Lins, como às figuras femininas de importância em sua vida, a exemplo da jornalista Oneyda Alvarenga e à poetisa mineira Henriqueta Lisboa. O autor de Macunaíma cultivava a angústia , como o remorso, a sensação de inadequação, como no momento em que desabafa com a namorada mineira: “Como posso ser feliz diante da fragilidade do corpo, da antevisão do fim, da sensação de que minha vida não acrescenta nada à evolução do mundo? Por mim, por ti, por nós dois enfim, me ajuda a sair dessa amargura!”.
Pois é, caros leitores, ainda hoje muitos de nós ensaiamos o gênero epistolar, cultivando o glamour das cartas através da Internet, com os e-mails e as mensagens que enviamos aos nossos amigos e correspondentes. O que é muito bom para o enriquecimento da Comunicação nos dias atuais.
- “Fátima Araújo” -

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